- Folha de S. Paulo
Corrente federalista que, como a gestão Bolsonaro, prega mais autonomia para estados e municípios remonta à Independência
Descentralizar é um mote do novo governo. O ânimo no discurso geral é aumentar a autonomia e os recursos das administrações locais em detrimento da central.
A corrente federalista, associada ao liberalismo, tem tradição no Brasil. Desabrochou na Independência e viveu um breve apogeu a partir de 1831, quando Pedro 1º abdicou.
Parte dos juízes passara a ser eleita e a exercer poder de fato nas localidades. A reforma constitucional de 1834 criou assembleias provinciais, também eleitas, às quais repassou atribuições e capacidade de tributar.
Para criticar a reação centralista, avassaladora após a manobra da maioridade de Pedro 2º em 1840, Aureliano Cândido Tavares Bastos publicou em 1870 "A Província - Estudo sobre a Descentralização no Brasil".
Elevar as prerrogativas regionais, disse o político alagoano, é mitigar a tutela do poder central sobre a liberdade dos indivíduos. Que as províncias —equivalentes no Império aos estados na República— assumam ampla responsabilidade na regulação da vida coletiva, na infraestrutura, no policiamento e na educação.
Tavares Bastos se mostra um visionário no último ponto. Arrola dados comparados de matrícula bruta de estudantes para escancarar o atraso do Brasil diante de nações como os Estados Unidos e a Argentina.
Defende o ensino básico obrigatório, gratuito e não discriminatório para todos, negros e brancos, meninos e meninas. Cobra das províncias sacrifícios tributários para diminuir depressa o prejuízo na educação.
Antevê o desafio da inclusão com o fim da escravidão e, um século antes de capital humano virar lugar-comum, identifica a relação entre instrução e produtividade. "O que reservareis para suster as forças produtoras esmorecidas pela emancipação [dos escravos]? O ensino, esse agente invisível que, centuplicando a energia do braço humano, é a mais poderosa máquina de trabalho."
O livro de Tavares Bastos merece uma edição atualizada e comentada. Os tempos favorecem. Quem topa?
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