- Folha de S. Paulo
Reduzir impostos sobre cigarros não é a melhor forma de enfrentar o descaminho
Nem todos os avanços técnicos se traduzem em maior bem-estar para a população. Isso fica especialmente claro no que diz respeito às drogas psicoativas.
Desde que o homem dominou o processo da destilação, que acabou dando uma nova dimensão ao problema do alcoolismo, a ciência não parou de desenvolver formas mais eficientes de explorar a queda que nossos cérebros têm por certas substâncias. Hoje, lidamos com uma plêiade de drogas sintéticas, muito mais potentes do que as moléculas naturais que as inspiraram, que são desenvolvidas por químicos num ritmo mais acelerado até do que aquele em que as autoridades conseguem se mobilizar para bani-las.
Aqui, apesar de um ramo da ciência estar trabalhando contra a saúde pública, nem tudo são más notícias. Ao contrário, ao longo das últimas décadas vários países conseguiram reduzir drasticamente a prevalência do uso de tabaco, uma das drogas mais viciantes e mais prejudiciais à saúde que se conhece. No Brasil, em 1989, 35% das pessoas com mais de 15 anos fumavam; em 2017, o número ficava em torno dos 10% —e tudo isso sem recorrer a medidas autoritárias como a proibição.
Os dois principais eixos das políticas públicas que contribuíram para esse sucesso são a regulação ambiental do tabaco (lugares onde não se pode fumar) e a elevação da carga tributária sobre os fumígenos. É o segundo pilar que se vê agora ameaçado. O governo Bolsonaro estuda reduzir impostos sobre cigarros como forma de combate ao contrabando.
Sim, o contrabando é um problema, e a curva de Lafer, uma realidade, mas a diminuição dos tributos não é a única nem a principal forma de enfrentar o descaminho, especialmente quando se sabe que a taxação diferenciada vem produzindo excelentes resultados sanitários.
Já que a atual administração insiste em pautar suas ações pelo senso comum, e não pela ciência, deveria seguir a máxima segundo a qual em time que está ganhando não se mexe.
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