O Globo
Cenário de desinflação estava posto, mas só
agora BC trabalha até com a possibilidade de a meta ser cumprida
A declaração de ontem do presidente do
Banco Central, Roberto Campos Neto, é uma correção de rumo. Está ficando
difícil para o Banco Central encontrar argumentos para manter a taxa de juros
no ponto em que está. As projeções do Boletim Focus para a inflação de 2024 e
2025 estão em 4% e 3,9%. Como o BC diz que leva em conta o Focus e olha para o
“horizonte relevante”, está observando esses dois números, entre outros. Em
evento em São Paulo, o presidente do BC falou da inflação presente, admitindo
que junho provavelmente terá inflação negativa, e que o índice de preços vai
terminar o ano entre 4,5% e 5%.
O número 4,5% para o final do ano ainda não tinha aparecido na mesa. A previsão de ontem do Focus para 2023 foi de 5,42%. A diferença entre um e outro é que o número aventado por Roberto Campos significa ficar no intervalo de flutuação da meta para este ano, ou seja, o presidente do BC trabalha até com a possibilidade de a meta ser cumprida este ano.
Desta forma, o BC começa a sair de uma
armadilha dogmática. As expectativas refletidas no Boletim Focus para a
inflação de 2023 ainda não reduziram o suficiente. Tem caído semanalmente,
depois de ter subido até abril para 6,05%. Estava em 5,69% na semana passada e
caiu para 5,42%. O indicador importante é a taxa de juros futuros, e ontem o
presidente do BC alertou que há uma redução acontecendo. “A curva de juros
futuros teve queda de quase 3%, dependendo do prazo que você olha”, disse
Roberto Campos.
Esse cenário de desinflação, do qual o
presidente do BC falou ontem, estava posto há mais tempo, mas a autoridade
monetária prefere seguir a cartilha. Na reunião do Copom prevista para a semana
que vem os juros permanecerão em 13,75%. O quadro em relação à última reunião
já melhorou fortemente, mas o BC nada fará em junho porque o ritual é avisar em
uma reunião que pode haver mudança, e só na reunião seguinte reduzir. Então
fica para quando agosto chegar.
A situação se torna mais esdrúxula diante
de determinados números. O IGP-M derreteu e agora está congelando. A primeira
prévia do índice da Fundação Getúlio Vargas registrou queda de 1,95% em junho,
o que significa deflação em 12 meses de 6,88%. O dólar está caindo. Fechou em 2
de janeiro em R$ 5,35 e ontem terminou o dia em R$ 4,86, uma queda de 9%. Foi a
mínima do ano. O dólar impacta vários outros preços, como combustíveis por
exemplo. Isso indica que novos preços podem cair por causa da queda do câmbio.
A valorização do real ajuda a desinflação que está ocorrendo.
A previsão do PIB em janeiro era de 0,78%,
bateu ontem em 1,84% e vai continuar subindo. Os principais bancos e
consultorias que refizeram as contas depois da alta do primeiro trimestre têm
2% como piso.
O país vai crescer mais e com inflação
menor e está havendo uma redução do risco fiscal desde o começo do ano. Nos
anos Bolsonaro houve a promessa de zerar o déficit no primeiro ano, o que não
foi cumprida e o governo ainda deixou muita confusão nas contas públicas. Como
o teto foi furado várias vezes, ele foi perdendo a eficácia como formador de
expectativas. O novo regime fiscal sustentável está avançando no Senado, depois
de ser aprovado na Câmara. Ele é criticado e algumas dúvidas são consistentes.
O arcabouço exige o crescimento da receita para atingir metas como a de zerar o
déficit no ano que vem, como mostrou neste jornal o repórter Manoel Ventura na
edição de ontem.
O ministro Fernando Haddad assumiu uma meta
difícil de ser atingida, e pegou um caminho pedregoso que é fechar os furos
pelos quais escoam recursos da arrecadação. Tem tido dificuldades esperadas, e
avanços importantes. Mas o fato é que antes se tinha um teto furado, e agora há
um novo parâmetro para as contas públicas. Antes muitos analistas diziam que o
governo Lula iria ter uma política de expansão ilimitada de gastos, agora os
mesmos analistas estão dizendo que o arcabouço não é tão bom quanto o governo
diz.
A equipe econômica tem feito avanços apesar
da base parlamentar estar conflagrada, mas a economia não resolve crise
política, pode apenas amenizá-la. Agora mesmo, o presidente Lula está numa
enrascada. Ameaçado de perder base por fazer e por não fazer. Se troca a
ministra do Turismo, Daniela Carneiro, uma parte do União Brasil deixa de
apoiar o governo. Se mantém, perde outra parte. A propósito, por que se chama
União, um partido tão fraturado?
3 comentários:
■Os juros no Brasil foram aumentados por Roberto Campos Neto, de março/2021 até agosto/2022, para mitigar as consequências de gastanças feitas por Bolsonaro com objetivos eleitorais. ▪Bolsonaro gastou tanto nesse período pré-eleitoral que sua irresponsável gastança ficou igualada à gastança de Lula e Dilma no período 2007a2016.
●Achei bem admiravel, o Roberto Campos Neto como economista::▪Roberto Neto foi indicado pelo governo Bolsonaro para presidente do Banco Central. Durante a campanha ele vestia uma camisa verde e amarela e ia para comícios de Bolsonaro, mas quando pela manhã ele sentava a bunda na cadeira de presidente do BC ele agia estritamente como economista profissional e toda vez que Bolsonaro fazia ampliação de gastos fora do Orçamento com objetivos eleitorais ele aumentava a taxa SELIC para esterilizar o dinheiro que Bolsonaro entornava irresponsavelmente na economia para ganhar votos.
●Bem admirável isso, para mim::▪como eleitor o Roberto Campos até ia aos comícios de campanha de Bolsonaro, deveras por lealdade em estar participando do governo. Mas como economista e presidente do Banco Central, mesmo ele tendo sido indicado por Bolsonaro, Roberto Campos não transigiu profissionalmente e tomou as medidas que a boa técnica econômica indica diante de execução fiscal e orçamentária que provoca inflação, como a de aumentar juros para conter a inflação sempre quando o poder executivo fizer gastos para os quais não há previsão de receitas tributárias correspondentes.
▪Todas as vezes que Bolsonaro ampliou gastos extra-orçamentários, Roberto Campos subiu os juros. Com sua atitude profissionalmente responsável como economista, Roberto Campos impediu que Bolsonaro conseguisse vantagem eleitoral de suas gastanças.
■~36% de brasileiros ganham menos de um salário mínimo ; ▪~outros 35% de trabalhadores ganham de um até dois salários mínimos. Quem tem renda de R$1.000,00 por mês gasta tudo o que ganha quase só comprando comida.
▪1% de inflação derrete R$10,00 dessa renda de R$1.000,00 :: dois quilos de comida a menos na mesa de uma família.
●Foi esse compromisso que todo economista deve ter, de proteger o poder aquisitivo do salário contra a corrosão que a inflação provoca, que Roberto Campos Neto teve quando foi aumentando os juros paulatinamente, dos 2% em que estavam em março/2021, até que chegaram aos 13,75% atuais.
É a política fiscal, que é de responsabilidade do poder executivo, o que impacta na inflação, e não a política monetária feita pelo Banco Central, de subir os juros. Os juros não são a causa, mas a consequência de uma política fiscal e orçamentária irresponsável feita pelos presidentes da república. Ocorre que nós temos sempre o hábito de nos referir à altura dos juros e nos esquecermos que isso não é culpa do Banco Central e, sim, culpa do presidente da república quando ele tem uma política fiscal errada, como Lula e Dilma tiveram entre 2007e2016 e Bolsonaro teve entre março/2021e agosto/2022, o que obriga a que a taxa básica de juros seja alta.
Os juros estão parados em 13,75% desde agosto do ano passado. De lá para cá temos alguns fatores externos e internos que podem ajudar para que a inflação no Brasil diminua, como um alívio na escalada da política monetária nos EEUU e, aqui no Brasil, estamos vendo os primeiros sinais sobre a inflação por os juros terem sido acertadamente mantidos altos de agosto /2022 até agora e também estão começando a aparecer os amadurecimentos de reformas ocorridas entre 2016e2018, como a reforma trabalhista e a reforma previdenciária. De negativo para que a inflação caia e os juros possam ser trazidos para baixo temos os gritos irresponsáveis de Lula, Gleisi e Lindberg contra o brilhante e sério presidente do Banco Central, temos a falta até aqui de uma política fiscal pelo novo governo, que até agora não tem sequer uma âncora implantada (sequer aprovada no Congresso) e temos Lula sempre sinalizando com políticas populistas, como sempre, de fazer controle artificial de preços e de conceder benefícios tributários para tubarões industriais.
Elogie-se o empenho de Fernando Haddad para avançar soluções de política fiscal, embora tenha também dado algumas declarações que não ajudaram.
Mas ao menos um pouquinho e de forma muito cautelosa os sinais agora são de que a taxa de juros básicos da economia poderão começar a cair em agosto ou setembro.
É mesmo.
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