sexta-feira, 18 de agosto de 2023

Claudia Safatle - - Uma viagem no tempo da política brasileira

Valor Econômico

A leitura do livro “O Que Vi Dos Presidentes - Fatos e Versões”, de Cristiana Lôbo e Diana Fernandes, é uma viagem no tempo, em busca da história política contemporânea do país. Vai de José Sarney, o afável, a Jair Bolsonaro, o conflituoso. São oito presidentes em 37 anos de democracia no Brasil, em que as autoras contam como o temperamento e a personalidade de cada um moldaram os seus governos.

A cada um dos ex-presidentes, elas atribuem um adjetivo. Fernando Collor de Mello é o impetuoso; Itamar Franco, o mercurial; Fernando Henrique Cardoso, o sedutor; Luiz Inácio Lula da Silva, o agregador; Dilma Rousseff, a autossuficiente; Michel Temer, o articulador.

Sarney chegou à Presidência porque era vice de Tancredo Neves, o escolhido pelas oposições para encerrar a ditadura militar. Um conterrâneo de afiado espírito crítico assim definiu o político maranhense: “Sarney tem um pé no mundo e outro no cangaço”.

Recém-filiado ao PMDB, vindo da antiga Arena, depois PDS, partido que deu sustentação à ditadura, Sarney teve que usar de toda a sua cordialidade para transitar em meio às lideranças do partido de Ulysses Guimarães. “O clima era claramente de animosidade. Sarney estava ansioso e inseguro e temia hostilidades”, contam as autoras.

Fernando Collor foi eleito pelo voto direto em 1989 e assumiu a Presidência no dia 15 de março de 1990. No dia seguinte, foi anunciado o Plano Collor - que confiscou a poupança pessoas físicas e empresas -, que pretendia acabar com a superinflação com um ippon, um só golpe com o qual se vence a luta no caratê. Mais uma vez o plano fracassou. “Sou a modernidade. Em um ano a inflação estará em apenas 3% ao mês”, dizia ele. A inflação encerrou 1990 em 1.476,56%.

Nessa altura, Pedro Collor tornara pública a sua denúncia de que Collor bancava as suas despesas milionárias com recursos que PC Farias achacava das empresas, e o processo de impeachment foi aprovado, no dia 29 de setembro, na Câmara por 441 votos a 38.

Com o impeachment de Collor, Itamar Franco assumiu a Presidência e, depois da troca de três ministros da Fazenda em sete meses, nomeou Fernando Henrique Cardoso, que era chanceler, para o posto. Com a inflação de 2.477%, “o caos na economia foi a marca do primeiro ano do mandato de Itamar. Fernando Henrique montou o ministério e começou a trabalhar em um novo plano de estabilização, o finalmente bem-sucedido Plano Real.

Com o sucesso do Plano Real, era claro que FHC seria o candidato à sucessão de Itamar.

Entre as características marcantes do temperamento de Fernando Henrique na Presidência destacavam-se a elegância, sobriedade, sedução e vaidade. Imodéstia e senso de humor também eram parte de suas características.

No dia 28 de janeiro de 1997, o plenário da Câmara aprovou a PEC da reeleição. “Os jornais estamparam nas primeiras páginas que o uso da máquina fora farto e abusivo”. Em 13 de maio a “Folha de S.Paulo” publicou reportagem que atesta a compra de votos para aprovação da emenda da reeleição. Passados exatos 20 dias dessa revelação, o Senado aprovou a reeleição.

Luiz Inácio Lula da Silva venceu as eleições de 2002 e tornou-se “uma espécie de pop star”. Por onde passava tinha simpatizantes esperando para abraça-lo ou beijá-lo. “Um líder de massa conciliador, agregador, que fez a ponte entre o povo e o empresariado”, dizem as autoras.

Nos 580 dias de prisão devido ao “petrolão” investigado pela Operação Lava-Jato, a vigília dos militantes, os amigos, a família e uma nova paixão - Rosângela da Silva - pareciam alimentar a persistente autoconfiança de Lula que repetia para quem quisesse ouvir que só sairia da prisão inocentado”. A alforria veio em novembro de 2019, quando o Supremo Tribunal Federal anulou suas condenações. Três anos depois, voltaria à Presidência.

Dilma Rousseff foi escolhida por Lula para sucedê-lo e a primeira crise não demorou. Antônio Palocci, homem forte do governo, estava apenas há cinco meses na Casa Civil quando uma série de reportagens da “Folha de S.Paulo” o derrubaria do cargo em menos de um mês, acusado de tráfico de influência e enriquecimento ilícito.

Lula se reuniu com a bancada do PT e com líderes aliados durante essa primeira crise e ouviu de líderes queixas sobre o comportamento de Dilma: “Ela não conversa com ninguém, não se sabe o que ela pensa. Faz tudo sozinha”. Lula levou essa queixa para um jantar com Dilma.

A política econômica do governo Dilma, batizada de Nova Matriz Econômica, que vigorou entre 2011 e 2014 “é apontada como a principal responsável pela crise aguda na economia em 2014”, mais que as “pedaladas”, que acabaram levando ao impeachment.

Michel Temer assumiu a Presidência em meados de 2016, tendo “Uma Ponte para o Futuro” como programa de governo do PMDB. Ele conseguiu aprovação do teto do gasto no Congresso e deixou a reforma da Previdência madura para ser aprovada durante o governo de Bolsonaro.

Poucos dias antes da eleição de 2018, FHC tentou decifrar o fenômeno Bolsonaro. “Ele é a picareta da história.” Para FHC, Bolsonaro iria quebrar o sistema político vigente. O que ficou dos quatro anos, contudo, foi o “assombro de parcela significativa da sociedade brasileira com a exposição, quase que diária, do explosivo temperamento do presidente, com a democracia sendo alvo de ataques frequentes”.

Cristiana faleceu em novembro de 2021, antes de terminar o livro, que foi concluído por Diana, também jornalista especializada em política e muito amiga de Cristiana.

2 comentários:

hisayo nanami disse...

Em tempos desse lixo podre chamado pedrobial, que roubou o programa e matou o Jô de tristeza, que saudade da verve, brilhantismo, elegância e agudeza jornalística da Cristiana Lôbo, meu Deus...
(Ainda bem que nos resta a Renata Lo Prete, por enquanto)

ADEMAR AMANCIO disse...

Uma panorâmica do que foi o Brasil.