Folha de S. Paulo
Há outros fatores explicativos para o colapso
da aprovação do governo para além do preço do café
A forte queda
na popularidade presidencial e na avaliação do governo Lula tem gerado
controvérsias. Além do próprio presidente, muitos analistas
culpam a inflação de alimentos como a principal causa. Tema que domina
a agenda pública no momento. Quando a culpa é atribuída pelo primeiro
mandatário da nação a "atravessadores", significa que já atravessou o
rubicão e arrisca radicalizar sua agenda.
Felipe Nunes e Thomas Traumann identificaram fatores conjunturais e estruturais da queda da aprovação presidencial. Dentre os primeiros, a inflação de alimentos devido a questões climáticas, valorização do dólar, entre outros. Entre os fatores estruturais, um governo cuja única agenda é "refazer o que deu certo nos mandatos Lula 1 e 2, e que só entrega o que já é conhecido", e "não gera a gratidão consequente do voto econômico".
Mas o paradoxo principal permanece sem
explicação por que, a despeito dos índices favoráveis —no emprego, rendimentos,
IPCA—, a popularidade despenca? Sim, aqui a inflação de alimentos é variável
central, mas o céu não é de brigadeiro. O que está ausente das análises é a
taxa de juros.
Ao encarecer brutalmente o crédito, ela é fonte de insatisfação de consumidores
de baixa e média renda, além de impactar um contingente
inédito de famílias endividadas. Não é à toa que o ataque político por
parte do presidente contra o Bacen começou antes mesmo da posse. A
terceirização da culpa era a antecipação dos efeitos da expansão de gastos da
ordem de R$ 150 bi ainda na transição de governo.
A estratégia perseguida malogrou junto à
população que se buscava atingir: os segmentos de baixa renda. O encarecimento
do crédito não é percebido como ação do Bacen (ente desconhecido da população).
E tiveram efeito em sentido contrário ao perseguido, por gerar ampla incerteza
econômica e minar a credibilidade do governo. A expansão fiscal criou emprego e
renda no curto prazo mas acelerou o recrudescimento da inflação.
Outro fator ausente das análises são as eleições municipais
de outubro. O péssimo desempenho do PT —que elegeu
apenas 252 prefeituras ante 517 do PL— aponta, na realidade, para uma
"descalcificação" política. A distribuição de investimentos locais
pelo centrão garantiu sua hegemonia. Entretanto o mais importante é que o
pleito teve efeito multiplicativo sobre a percepção da vulnerabilidade política
de Lula —o grande ausente das eleições— e do PT.
A ausência do presidente na política
doméstica foi uma escolha estratégica pela qual o presidente buscava ser
protagonista na agenda internacional, na agenda do clima e do combate a
pobreza, ao mesmo tempo que delegava a política doméstica a um grupo de ex-governadores.
A estratégia naufragou. O contexto eleitoral potencializou a percepção de
malogro. Questões de saúde e idade se somam
aqui.
Na faixa etária do eleitorado entre 25 e 34
ocorreu a maior queda percentual (39%!) na aprovação do governo, que caiu 9
pontos percentuais (de 23 para 14) (Datafolha). O
governo é aprovado apenas por 1 em cada 7 respondentes. Percentuais um pouco
menores (36%) estão nas faixas de 35 a 44, e 16 a 24. Estas faixas concentram
58% da população.
A última cartada de Lula para contrarrestar
este quadro pode ser a radicalização da agenda.
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