Folha de S. Paulo
Deputados salvam acusados de corrupção e
assassinos enquanto perseguem quem não entra no jogo
O Congresso que
se arvora em criticar a dosimetria do STF sobre golpistas é
o mesmo que não sabe diferenciar as condutas de seus próprios pares.
O quão indecoroso é um congressista chutar
alguém no meio de uma discussão? Com certeza é grave, mas certamente não mais
deplorável do que ordenar
assassinato, formar quadrilha para desviar dinheiro público, espancar
a esposa ou perseguir alguém com
um revólver na rua.
O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) agrediu, dentro da Câmara, um militante de direita que o ofendia. Errou e deve ser punido, com censura pública ou até suspensão. A cassação, porém, é abusiva e avança apenas por ele não abaixar a cabeça para os poderosos do Congresso.
O Conselho
de Ética da Câmara é engenhoso ao criar brechas ou desculpas para
safar os colegas. Já livrou até condenado
à prisão, por entender que o STF "superdimensionou a pena", e
deputados pegos
com malas de dinheiro "para aguardar o devido processo
legal".
O plenário da Casa, então, fez pior quando o
voto ainda era secreto: preservou
o mandato de Natan Donadon, que chegou à sessão algemado, diretamente da
cadeia onde passaria os próximos seis anos pelo crime de desvio de dinheiro
público.
Agora, a intenção é punir Glauber Braga de
forma desmedida, ironicamente pela mesma razão que levou à cassação de outro
militante do grupo com o qual ele antagoniza.
O ex-deputado estadual Arthur
"Mamãe Falei" perdeu o mandato pela divulgação de áudios
abomináveis sobre ucranianas vítimas da guerra. Um ato desprezível,
mas não mais grave do que o parlamentar que apalpou o seio de uma deputada no
plenário e foi apenas
suspenso.
A diferença, tal como agora, é que ambos
batiam de frente com o centrão, que dá as cartas no Legislativo.
Enquanto todos bajulavam Eduardo Cunha,
que liderava a deposição da presidente da República, Glauber o mirou nos olhos
ao discursar. "Você é um gângster. E o que dá sustentação à sua cadeira
cheira a enxofre. Eu voto por aqueles que nunca escolheram o lado fácil da
história".
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