Candidata derrotada na disputa presidencial de 2010, Marina Silva (PV), ícone do ambientalismo nacional e internacional, obteve uma votação que surpreendeu - quase 20 milhões de eleitores marcaram seu número na urna - apenas os que não acompanharam a construção de sua candidatura. Levantamentos preliminares encomendados pelo PV mostravam que tal candidata poderia mesmo atingir os patamares de aceitação que acabou conquistando de verdade. Por três ou quatro razões principais.
Uma, seus méritos, seu nome e a carreira que construiu no rastro do tema de preservação do Meio Ambiente e salvação do Planeta, com uma ligação estreita a ONGs internacionais que acabaram consolidando sua imagem no exterior. Um fenômeno de fora para dentro que, apesar de tudo, e curiosamente, não chegou a atingir seu Estado natal, o Acre, onde ficou em último lugar entre os principais candidatos a presidente em 2010.
Esses votos de Marina, definidos como os votos verdes, contudo, renderam-lhe uma base de apoio cativa, financiamento de campanha, temática sólida, mas não a levariam, sozinhos, ao pedestal de fenômeno que acabou galgando. Igualmente importante, ou até mais, foi a exposição nos meios de comunicação de massa, os principais telejornais da TV aberta do Brasil.
Há uma terceira razão muito forte que pode até ser a preponderante: Marina Silva representou a terceira via. Entre PT e PSDB, uma parte consistente do eleitorado, notadamente das camadas de nível mais elevado de instrução e renda, preferiu Marina, como em outras disputas preferira Ciro Gomes e outros tertius, por exemplo, evitando os polos das últimas disputas eleitorais no país.
A ex-senadora, ex-ministra e ex-candidata a presidente, que saiu da campanha eleitoral em excelsa glória, perdeu o prumo, o rumo e o ritmo nos últimos seis meses pós disputa presidencial. Não está sabendo o que fazer com tão extraordinário desempenho e queima sem parar seu capital.
A empreitada mais relevante que contratou, única na qual se destacou nesse período, foi uma querela interna no Partido Verde, onde embarcou numa divisão entre os grupos do Rio e de São Paulo, engalfinhando-se desnecessariamente com o secular dirigente partidário do PV, José Luiz Penna. Marina chegou a inclinar-se por uma facção do partido, a Transição Democrática, a ponto de seu público atribuir a ela o desejo de, tal qual os políticos velhos de guerra, sair para criar seu próprio partido se não conseguisse o poder de mando entre os verdes. Mais mofado em matéria de política partidária, impossível.
Sua ficha de filiação é nova em folha, mas o exercício dos piores e tradicionais hábitos políticos é irresistível. Marina Silva ficou longe dos temas importantes, inclusive aqueles de seu domínio histórico, e não foi capaz sequer de aceitar críticas que lhe apontavam o seu desvio do caminho principal.
Reagiu com arrogância aos comentários de que, enquanto travava uma luta com Penna em torno do domínio do PV, o Código Florestal, ouro puro do ambientalismo mundial em discussão, seguia seu curso congressual sem a contribuição de tão ilustre especialista.
A resposta de Marina Silva foi dizer que, como não tem mandato, trava o diálogo com a sociedade e não com o Congresso. E criticou parlamentares do seu partido por terem permitido o avanço da negociação do Código. Recebeu, de volta, o desdém, por seu alheamento e desinformação.
Ora, é no Congresso que o Código está tramitando e sendo votado, deve entrar em pauta esta semana, depois de anos de negociação com a sociedade.
Em 2008 um esboço do Código ficou pronto, em 2009 chegou à Comissão especial e começou a ser trabalhado pelo relator, deputado Aldo Rebelo (PCdoB), que executou um detalhado e estratégico projeto de discussão e negociação das mudanças em todo o país, com os mais diferentes auditórios e grupos de interessados, os cidadãos aos quais as normas atingem diretamente. Foram 70 reuniões em 22 Estados, algumas com 5 mil, 6 mil pessoas.
Essa mega negociação, inclusive mais recentemente envolvendo as conflitantes autoridades do governo que conseguiram chegar a um consenso mínimo, e com as bancadas de ruralistas e ambientalistas - PV incluído - resultou em duas ou três versões do Código com alterações acatadas pelo relator.
Pronto o trabalho para ir a voto, a ex-candidata a presidente, instigada pelas críticas, resolveu, ontem, insurgir-se. Participou de reunião da bancada do Partido Verde e liderou uma marcha ao chefe da Casa Civil, ministro Antonio Palocci, para propor adiamento da votação do projeto, prevista para hoje. E o fez, novamente, com falta de senso de realidade: "Espero que o bom senso sinalize no sentido do adiamento, é impossível elucidar esse texto de hoje para amanhã, é uma irresponsabilidade de quem disser isso".
A ordem de zerar tudo é uma tardia estridência da ex-senadora contra um espetáculo que está há quatro anos em cartaz com encerramento já agendado. Dificilmente os atores concordarão em voltar tanto no tempo. A conferir se as ONGs internacionais que apoiam a ex-senadora terão força para sustar, neste momento, a tramitação do projeto.
Está claro que Marina Silva precisa e merece um bom aconselhamento, daqueles que lhe apontem caminhos que possam manter acesa a sua chama política até a próxima disputa eleitoral. É preciso ver, porém, se ela quer, ou se a falta de eixo desses meses pós-campanha tem um significado mais radical, porém oculto.
Ecumênica também na sua insatisfação, a presidente Dilma Rousseff tem avaliação negativa do desempenho dos mais importantes ministros do PT e do PMDB, os dois pilares de sustentação do seu governo.
Do PT, sobram críticas, especialmente, ao ministro da Educação, Fernando Haddad, embora o da Saúde, Alexandre Padilha, ainda não tenha dado motivos de regozijo à nova gestão. Os dois petistas de altíssima cotação partidária ainda não aconteceram no governo.
Do PMDB, o desânimo é com o representante principal, o ministro Edison Lobão, das Minas e Energia.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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