quarta-feira, 4 de maio de 2011

Mirando a meta :: Míriam Leitão

A inflação vai superar o teto da meta nos próximos meses. Quem diz é o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini. Ele garante que o BC está enfrentando o problema e que vai levar a taxa para o centro da meta no final de 2012. Perguntei: E se alguém disser que os juros não podem subir, por razões políticas? Ele respondeu: "Não fará diferença. O BC tem autonomia."

Na primeira entrevista exclusiva concedida pelo presidente do Banco Central, ele me disse ontem - num programa da Globonews - que o país vai continuar acumulando reservas cambiais, apesar de já ter mais de US$320 bilhões, e analisou a questão internacional. O problema que dominou a conversa foi, claro, a inflação. Ele disse seis vezes que o BC levará a inflação para o centro da meta em 2012. E explicou por que prorrogou o prazo dessa convergência:

- Em nenhum momento o Banco Central desistiu. Por causa de uma série de choques externos, como o de preços de commodities e de energia, e mais o crescimento da demanda interna, a inflação acumulou 2,44% nos primeiros três meses do ano. Para levar para o centro da meta este ano, teria que haver 2% de inflação em nove meses. Mas estamos tomando medidas que atuarão com a defasagem conhecida. Hoje, o Banco Central do Brasil é o mais ativo no combate à inflação em comparação com os seus pares.

Tombini nega que tenha oscilado entre os instrumentos de controle de crédito (macroprudenciais) e as políticas convencionais de política monetária:

- O Banco Central não mudou. Essa administração elevou em 125 pontos bases (os juros). As medidas convencionais estão sendo utilizadas de forma clara e convincente. Políticas financeiras não são decididas pelo Copom, mas pelo Banco Central, mas são levadas em consideração. O instrumento que vai nos levar à meta de 4,5% é o instrumento convencional. Foi usado e continuará sendo usado no tempo necessário.

Entre os vários desafios que existem no cenário da inflação nos próximos meses está o fato de que as negociações salariais das categorias mais fortes ocorrerão exatamente quando a taxa em 12 meses tiver ultrapassado o teto da meta no terceiro trimestre:

- É importante o BC e o governo demonstrarem no momento da negociação salarial que a inflação está convergindo para a meta de 4,5% e que as categorias precisam olhar para o cenário internacional de inflação elevada. É preciso demonstrar que a taxa está na trajetória para que os agentes econômicos nas suas definições de preços e salários olhem para a frente, do contrário, teremos problemas de competitividade internacional.

Mas mesmo que este teste das negociações salariais de metalúrgicos, bancários e petroleiros seja superado, virá outro desafio no começo do ano que vem que será um aumento de pelo menos 14% para o salário mínimo, que terá um impacto nas contas públicas e preços:

- Todas as políticas que estão sendo tomadas agora estarão tendo impacto mais forte no último trimestre deste ano e começo do ano que vem. Nas nossas decisões, temos que levar em consideração tudo o que já sabemos de antemão, como a regra de aumento do salário mínimo.

Tombini disse que a partir de maio a inflação mensal vai cair e estará em termos anualizados dentro da meta, mas admite que a inflação em 12 meses estará subindo e deve ultrapassar o teto. Ele acha que o choque das commodities deve ceder agora, pelo menos na área agrícola. Neste contexto é que ele disse esperar a queda do etanol para breve.

Ele explicou sua ideia de que o fluxo de capitais é inflacionário, quando se sabe que o primeiro efeito é derrubar o dólar, o que tem puxado a inflação para baixo:

- O Brasil recebeu US$35 bi em três meses, um volume inédito. Isso dá uma velocidade à expansão do crédito além do adequado, e produz uma demanda por ativos como terra, imóveis. Estamos trabalhando com os ministérios (da Fazenda e do Desenvolvimento) para minimizar esses riscos. Tenho duas preocupações com esse excesso de fluxo de capitais. Nós apertamos o requerimento de capital, colocamos tributação em cima de crédito e essa entrada excessiva de dólar desfaz esse trabalho, porque as empresas vão lá fora tomar empréstimos, achando que não há risco cambial. Essa é a segunda preocupação, o de evitar que as empresas assumam esse risco. Outros países estão com políticas monetárias muito expansionistas.

Sua avaliação é a de que os mercados financeiros continuam bem, apesar "dessa coleção extraordinária de eventos" na conjuntura internacional, porque há esse excesso de liquidez, mas por outro lado o país tem que estar preparado para uma reversão do quadro, evitando riscos.

Quando perguntei a Tombini o que aconteceria se alguém dissesse que ele não pode subir juros por razões políticas, ele respondeu:

- O Banco Central tem autonomia. Não só eu, como os diretores. Eles definem os seus votos. Se alguém disser isso, não fará diferença porque a nossa decisão será com base nas nossas avaliações, com os subsídios do corpo técnico. Funciona como sempre funcionou nestes 12 anos de metas de inflação.

FONTE: O GLOBO

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