“As democracias também se valem de certa concepção da ação política. Também nesse aspecto, tentam evitar dois extremos. Por um lado, a diferença das teocracias e dos regimes totalitários, elas não prometem à sua população a salvação, nem lhe impõem o caminho a seguir para alcançá-la A construção do paraíso na Terra não faz parte do seu programa; a imperfeição de toda ordem social é considerada como um dado prévio. Mas, por outro lado, as democracias tampouco se confundem com os regimes tradicionalistas e conservadores nos quais se pensa que nenhuma regra imposta pela tradição deve jamais ser questionada. Elas recusam as atitudes fatalistas de resignação. Essa posição intermediária autoriza interpretações divergentes, mas pode-se dizer que toda democracia implica a ideia de um melhoramento possível da ordem social, de um aperfeiçoamento graças aos esforços da vontade coletiva. Hoje em dia o termo “progresso” é mantido sob suspeita, mas a ideia que ele recobre é inerente ao projeto democrático. E o resultado aí está: os habitantes dos países democráticos, embora freqüentemente se mostrem insatisfeitos com sua condição, vivem num mundo mais justo do que aquele dos habitantes dos outros países. Eles são protegidos pelas leis; gozam da solidariedade entre membros da sociedade que beneficia os idosos, os doentes, os desempregados, os miseráveis, podem invocar os princípios de igualdade e de liberdade, e até um espírito de fraternidade.”
In. Tzvetan Todorov. Os inimigos íntimos da democracia, p. 17. Companhia da Letras, 2012
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