Diante das sobejas evidências que se acumulam em torno do escândalo da Petrobrás, é - mais que compreensível - perfeitamente adequado que em ato público relativo ao Dia Internacional de Combate à Corrupção, realizado na manhã de terça-feira em Brasília, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tenha feito um duro pronunciamento. Lamentou ele que "o Brasil ainda seja um país extremamente corrupto", que "envergonha-nos estar onde estamos" e, em consequência disso, "esperam-se as reformulações cabíveis, inclusive, sem expiar ou imputar previamente culpa, a eventual substituição" da diretoria da estatal.
É também compreensível - mas, para dizer o mínimo, definitivamente inadequado - que a presidente Dilma Rousseff tenha subido nas tamancas, classificado a manifestação do procurador-geral de "escândalo", instruído assessores a anunciar sua "irritação" com o episódio e ordenado ao ministro da Justiça que voltasse a fazer, dessa vez com maior competência do que já havia tentado na presença de Janot, um categórico repúdio à ideia de afastamento de Graça Foster do comando da Petrobrás.
É compreensível, como foi dito, que incomode a Dilma a evidência de que os fatos conspiram contra sua intenção de se exibir como campeã da moralidade pública e inimiga implacável da corrupção. "Tenho uma vida inteira que demonstra o meu repúdio à corrupção", proclama texto inserido com destaque na página oficial da presidente no Facebook. Mas, para um chefe de governo, "repudiar" a corrupção não é suficiente.
A nação brasileira, ela sim muito "irritada" com o "escândalo" verdadeiro, que é o assalto à maior estatal brasileira, exige a identificação e responsabilização dos culpados, desde o mais modesto operador do esquema até a mais alta autoridade envolvida na esbórnia, seja por cumplicidade, seja por incompetência para evitá-la.
E é certamente por aí que a coisa pega: a apuração das responsabilidades em todos os níveis da hierarquia do poder público. É fácil mandar para a cadeia um empresário corrupto. Mas quando se trata do poder público, quanto mais alto se posiciona o hierarca, mais bem blindado ele estará contra a suspeita de desvios de conduta. Recorde-se a facilidade inicial com que Dilma Rousseff, já presidente da República, afastou de Dilma Rousseff, presidente do Conselho de Administração da Petrobrás, a responsabilidade pela controvertida compra da Refinaria de Pasadena, atribuindo-a a informações "incompletas" de um relatório técnico.
Até algumas semanas atrás Dilma era candidata à reeleição e, conforme sua própria escala de valores, sentia-se no direito de fazer "o diabo" para se manter no poder. Por exemplo, fingir que a Operação Lava Jato era coisa pouca, manipulada pela oposição. Mas a eleição já acabou e agora são as investigações da Polícia Federal que estão no centro da cena política nacional.
Assim, se na opinião de Rodrigo Janot, que tanto abalou os nervos de Dilma Rousseff, o Brasil está "convulsionado" com o episódio que "como um incêndio de largas proporções" corrói "as riquezas da nação", está mais do que na hora de a própria presidente da República passar das palavras aos atos e demonstrar que está de fato disposta a manter "tolerância zero" com os malfeitos, "doa a quem doer". E o afastamento preventivo da diretoria da Petrobrás, como sugere o procurador-geral da República, pode cumprir uma dupla função: remover eventuais dificuldades na apuração dos fatos e demonstrar que Dilma faz o que precisa ser feito, doa a quem doer. Afinal, se a amiga Graça Foster não está envolvida nos malfeitos - além da responsabilidade administrativa e política que tem qualquer administrador de recursos públicos -, a justiça será feita e ela poderá ser reinvestida na presidência da estatal.
Se a presidente Dilma Rousseff permanecer irredutível na tentativa de blindar a diretoria da estatal, estará estimulando as suspeitas sobre as suas próprias responsabilidades no escândalo da Petrobrás, em cuja gestão interferiu decisivamente nos últimos 10 anos.
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