• Anotações apreendidas na Engevix mostram que construtoras estavam dispostas a pagar r$ 1 bi para escapar de punição
Francisco Leali, Eduardo Bresciani e Vinicius Sassine – O Globo
BRASÍLIA - Oito dias antes da deflagração da sétima fase da Operação Lava-Jato, que levou à prisão executivos das principais empreiteiras do país, os dirigentes das construtoras tentavam articular uma linha de defesa conjunta, mas ainda se achavam imunes a uma ação policial de grandes proporções. Documentos com anotações a lápis apreendidos pela Polícia Federal na sede da construtora Engevix em 14 de novembro mostram que a direção da empresa estava convencida de que nem o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nem o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), teriam coragem de partir para cima das empreiteiras. "Janot e Teori sabem que não podem tomar a decisão. Pode parar o país", diz a anotação, de 6 de novembro.
A mesma anotação esboça o que as empreiteiras estavam dispostas a entregar: um pagamento de R$ 1 bilhão (de multa) e acordo para reconhecer a prática de cartel. E também o que elas não poderiam fazer. Abaixo da palavra "proibido" está anotado: "Delação, depoimento, mérito". No pé da página está escrito Cade, numa referência ao órgão do governo que apura a prática de cartel. As anotações ainda contém iniciais que podem ser de empreiteiras envolvidas: C (Camargo Corrêa), O (Odebrecht), U (UTC), Q (Queiroz Galvão), O (OAS). Ao lado, há a referência ao R$ 1 bilhão.
Os papéis contém comentários feitos em reuniões numa espécie de ata informal das conversas entre os donos da Engevix. Boa parte dos documentos começa com os nomes de GMA (Gerson de Mello Almada, vice-presidente da Engevix, que permanece preso em Curitiba), JAS (José Antunes Sobrinho) e CK (Cristiano Kok), os donos da Engevix, envolvida no esquema de corrupção em contratos da Petrobras. As reuniões começaram em abril, depois da deflagração da Operação Lava-Jato.
As primeiras anotações são de abril deste ano e ainda mostram um cenário de "certa tranquilidade". "Talvez na Laja-Jato saiamos fora provavelmente, mas teremos um outro inquérito específico. Tomar uma ação pró-atividade, se apresentar ou aguardar a chamada no inquérito", diz o documento. Já há referência ao "risco alto" envolvendo o lobista Fernando Baiano, ligado ao PMDB. No mesmo documento, há registro de que oficialmente a Engevix deveria atestar que os serviços foram prestados, numa referência aos recursos que a empreiteira repassou a empresas de fachada do doleiro Alberto Youssef. Sete dias depois, em 30 de abril, uma anotação sugere que a empresa tinha informação sobre grampos feitos pela PF. O autor da anotação recomenda cuidado. "Escuta telefônica continua, e conversas mínimas".
Engevix fora das "prioridades"
Em outubro, o registro de uma nova reunião indica que advogados da empresa foram a Curitiba e que um dos delegados da PF teria comentado que a Engevix não estava entre as "prioridades" dos investigadores. O documento encerra com a falta de notícias sobre reuniões com Rodrigo Janot: "Nenhuma noticia sobre as conversas com a PGR". Em 22 de outrubro, os manuscritos da Engevix registram que o procurador-geral deveria cuidar dos "grandes" e que o acordo de leniência, na verdade, "não existe". Seria só para fazer "uma confusão". Procurada, a Engevix informou por meio de nota que "prestará os esclarecimentos necessários à Justiça".
As investigações da Lava-Jato reuniram diferentes provas sobre o suposto cartel montado pelas empreiteiras para fatiar contratos da Petrobras. Diante desse cenário, as empresas montaram uma estratégia para tentar escapar dos efeitos dos indiciamentos da PF e das denúncias do Ministério Público Federal, previstas para esta semana. No último sábado, em nota oficial, Janot afirmou que "não permitirá que prosperem tentativas de desacreditar as investigações e os membros desta instituição". Na rede interna dos procuradores da República, no mesmo dia, Janot adotou um tom ainda mais crítico e reativo: "Para profunda tristeza dos brasileiros honestos e cumpridores de seus deveres, o País convulsiona com o maior escândalo de corrupção da nossa história."
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