O Globo
Acusar um governo, qualquer governo, de querer fazer alguma coisa, por mais estapafúrdia que seja, não é ato criminoso que mobilize a máquina do estado contra o adversário
A ameaça de uso da máquina pública para
perseguir os que espalharam boatos sobre taxação do Pix, especialmente o
deputado Nikolas Ferreira, é mais um erro do governo na guerra de comunicação
que vem perdendo para a oposição. Espalhar boatos contra os adversários sempre
foi uma arma política usada nas campanhas eleitorais, e acusar o governo de
querer taxar alguma coisa não pode ser considerado crime.
Pode ser golpe baixo, que reverterá contra o
boateiro se respondido de maneira convincente. É diferente de atacar a honra de
alguém, ou espalhar calúnias pelas redes sociais. Acusar um governo, qualquer
governo, de querer fazer alguma coisa, por mais estapafúrdia que seja, não é
ato criminoso que mobilize a máquina do estado contra o adversário. Já houve
campanhas em que se espalhou o boato de que o adversário, caso vencesse,
acabaria com a Bolsa Família, e ninguém foi preso.
Golpes sujos em campanhas políticas são deploráveis, mas fazem parte da história de qualquer democracia. O governo petista exagera na tentativa de mostrar-se o único obstáculo antes da barbárie, tendo por isso que ser apoiado necessariamente pelos democratas. É a mesma tática dos adversários, que também se anunciam como os únicos a terem condições de barrar a investida petista contra a democracia.
Se temos os exemplos recentes de tentativa de
golpe levada a efeito pelo ex-presidente Bolsonaro e seus adeptos, temos a
lembrança de fatos não tão longínquos que levaram o presidente Lula à
condenação justamente por distorcer o processo democrático com a corrupção de
partidos políticos nos episódios do petrolão, antecedido pelo mensalão.
Os caminhos tortuosos que procuradores de
Curitiba e o ex-juiz Sérgio Moro percorreram até a condenação do ex-presidente
no petrolão não deram um atestado de inocência aos condenados, já que em nenhum
dos casos houve a devida revisão para anulá-los. As mesmas denúncias de abusos
estão sendo feitos em relação à atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) nos
processos sobre fake news e ataques à democracia que atingem o ex-presidente
Bolsonaro e seus aliados e permanecem sob sigilo como um fantasma sobre o país
há vários anos.
Provavelmente por isso já percorre as
plataformas digitais uma campanha contra Lula e Bolsonaro, destacando a
necessidade de nos livrarmos dessa polarização, que leva a equívocos, a
escolher o menos pior, dependendo das circunstâncias. Na eleição de 2018,
Bolsonaro surgiu como o antídoto à volta do petismo, vencendo com facilidade,
até porque Lula estava preso e o país vinha de uma tragédia econômica e
financeira que foi o governo Dilma.
Em 2022, Lula já solto pelo STF, venceu com
pequena margem para impedir que Bolsonaro tivesse um segundo mandato que se
prenunciava à maioria um desastre continuado. O que se confirmou depois com os
episódios de 8 de janeiro de 2023 e a revelação de tentativa de golpe. Em 2026,
teremos, ao que tudo indica, uma disputa que se dará com o ex-presidente
Bolsonaro preso. Impossível imaginar o que acontecerá desta vez, inclusive
porque não se sabe se Lula poderá disputar, ou se Bolsonaro continuará
inelegível.
Pelo menos o ex-presidente tem esperanças de
que a volta de Trump ao poder leve a justiça brasileira a rever sua condenação.
Na minha opinião, é uma vã esperança de imediato, mas tem base se um candidato
da direita ligado a Bolsonaro se eleger em 2026. Existe ainda a possibilidade
de que o presidente de direita não aceite anistiar Bolsonaro, nunca se sabe. O
que reforça a ideia de que o país ganharia se um candidato, de qualquer
espectro político, aparecesse para superar essa dicotomia personalista que tem levado
o país à paralisia.
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