Folha de S. Paulo
Nossos instintos recomendam responder na
mesma moeda, mas essa pode não ser a melhor estratégia
Sociedades humanas só se viabilizaram porque
desenvolvemos meios de evitar que indivíduos pudessem tirar vantagem do grupo
sem dar sua cota de contribuição. Um dos mecanismos com que a evolução nos
dotou para lidar com isso é o sentimento de indignação com injustiças e a
correspondente vontade de punir aproveitadores, mesmo que tenhamos de incorrer
em custos pessoais.
É interessante notar que isso já existe em algum grau entre outros mamíferos sociais e mesmo aves. Viralizou na internet anos atrás o vídeo de um macaco capuchinho revoltado por ter recebido uma recompensa pior do que a dada a seu colega símio que havia desempenhado a mesma tarefa que ele.
Nosso primeiro impulso, portanto, é responder
às tarifas de Donald Trump na
mesma moeda ("tit-for-tat").
Alguns países já anunciaram o troco. O
Congresso brasileiro aprovou,
a toque de caixa, legislação que autoriza o governo a fazer isso.
A questão é que vivemos hoje em sociedades
muito mais complexas do que as dos grupos de caçadores-coletores nos quais a
estratégia do "tit-for-tat" se mostrou vencedora.
Para início de conversa, as tarifas
americanas não afetam igualmente todos os setores produtivos. Alguns podem até
ser beneficiados, já que outros países pagarão taxas ainda mais altas. Tarifas
retaliatórias generalizadas também aumentariam o preço de maquinário e
matérias-primas que usamos aqui, o que não parece muito inteligente.
Não estou obviamente dizendo que o Brasil ou
qualquer outro país não devam responder. Só sugiro que o façam não com o fígado
(sistema 1), mas refletidamente, após fazer as contas relevantes e sopesar
todas as alternativas possíveis (sistema 2).
Descartada a hipótese de um boicote global
aos EUA, a forma mais realista de o mundo se livrar de Trump e suas sandices
talvez seja deixar que a inflação que ele está contratando faça com que o
eleitor americano se revolte e puna o Partido Republicano. Nesse caso, o melhor
a fazer é esperar, tentando manter as dores tarifárias no menor nível possível.
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