Censo 2022 reflete mutação religiosa do Brasil
O Globo
Católicos seguem maioria, e evangélicos
avançam, embora seu crescimento tenha ficado aquém do projetado
Os dados sobre religião do Censo 2022,
divulgados ontem pelo IBGE,
revelam uma transformação na sociedade brasileira. O Brasil continua sendo um
país majoritariamente católico, mas a proporção de evangélicos na população
continua a crescer — em 2022, correspondiam a 26,9% da população, ante 21,6% em
2010. É verdade que os católicos são mais que o dobro disso, ou 56,7% dos
brasileiros, mas essa proporção era de 65,1% em 2010 e, até 1980, ficava acima
de 90%. E, embora o Brasil continue a ser um país predominantemente cristão, os
brasileiros que declaram não ter religião aumentaram de 7,9% a 9,3% em 12 anos.
Tais mudanças espelham as mutações sociais por que o país vem passando nas
últimas décadas.
As denominações evangélicas têm sido o segmento religioso que mais ganha adeptos. Entre 1991 e 2022, sua participação praticamente triplicou, de 9% para 26,9%. Tais números confirmam uma realidade observada em muitas cidades brasileiras, onde a quantidade de templos se multiplica. Mas também é preciso pontuar que, embora em 2022 a proporção de evangélicos tenha atingido o maior patamar já registrado, ela ficou aquém do esperado pelos pesquisadores, algo em torno de 30%. No últimos dois Censos, o crescimento havia sido de 6,5 e 6,1 pontos percentuais — desta vez ficou em 5,3 pontos.
A expansão também não levou o segmento à
liderança. Apenas 244 municípios registram predomínio de evangélicos na
população, ou pouco mais de 4% das cidades. Na distribuição por regiões, os
números do Censo mostram que a participação evangélica é mais consistente no
Norte (28,5%), no Centro-Oeste (26,8%) e no Sudeste (24,6%), com menos força no
Sul (20,2%) e no Nordeste (16,4%).
Em contraste com os evangélicos, os católicos
vêm perdendo espaço na diversidade de um país de herança católica. Embora sejam
de longe a maioria, a proporção tem caído a cada Censo. O recuo de 8,4 pontos
percentuais em relação a 2010 os coloca no menor patamar da série histórica
iniciada em 1872, quando quase toda a população brasileira (99,7%) se declarava
adepta do catolicismo. Hoje, o maior percentual de católicos se encontra no
Nordeste (72,2%) e no Sul (70,1%). Não apenas o avanço dos evangélicos, mas também
o aumento na proporção dos que se declaram sem religião contribui para essa
tendência. Os sem religião formam, paradoxalmente, o terceiro maior grupo
religioso do país.
O mais novo retrato da religiosidade no
Brasil tem todo tipo de implicação para a sociedade. Em geral, os evangélicos
têm uma atitude mais centrada na comunidade e no indivíduo que no Estado e
costumam ser conservadores nas questões comportamentais. Na política, têm
demonstrado ser um segmento mais afeito a determinados grupos e mais resistente
a outros, que veem como incapazes de traduzir seus anseios e suas demandas.
Todos os que pretendem conhecer o Brasil a fundo precisam entender quem são, o
que pensam, em que creem e o que desejam esses brasileiros.
País faz bem em negociar com EUA redução em
tarifas de aço e alumínio
O Globo
Ideal é retomar acordo firmado em 2018,
estabelecendo cotas de produtos isentos da nova sobretaxa de 50%
É positiva a disposição do governo brasileiro
em buscar acordo com os Estados Unidos para
isentar os exportadores de aço e alumínio da sobretaxa de 50% decretada nesta
semana por Donald Trump.
Em fevereiro, Trump já elevara as tarifas em 25%. Não satisfeito, voltou à
carga, dobrando o percentual. Os três principais países fornecedores dos dois
produtos para os Estados Unidos são Canadá, Brasil e México.
Sem dúvida, quem mais perde com a medida são
os consumidores americanos. Mantida a barreira, o preço do automóvel deverá
subir até US$ 1 mil. A construção de uma casa terá acréscimo médio de US$
10.900. A expansão da rede de gasodutos e oleodutos ficará mais cara, e até as
latas de alimentos serão afetadas. Tudo isso porque a indústria siderúrgica
americana opera com custos maiores e não tem condição de atender à demanda
interna. Não é realista isolar os Estados Unidos da competição externa até
surgir um novo parque siderúrgico.
Aparentemente ciente do risco, Trump diz
estar aberto a negociações. O único país que continua pagando 25% nas
exportações de aço e alumínio é o Reino Unido. No início de maio, Trump e o
primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, anunciaram um acordo de livre-comércio.
No detalhe, ele é limitado, com poucos efeitos imediatos. Mas foi o bastante
para Trump tentar faturar politicamente. O governo brasileiro faria bem em
explorar o mesmo caminho.
Enquanto todos os fornecedores, com a exceção
dos britânicos, pagarem a mesma tarifa, os exportadores brasileiros não serão
muito afetados. Ainda assim, a indústria local já sentiu efeitos negativos. No
primeiro mês de vigência da tarifa de 25%, as exportações de produtos
semiacabados de ferro e aço caíram 30,7% em relação ao mesmo período de 2024.
No primeiro quadrimestre, a venda aos Estados Unidos de semiacabados caiu
14,2%, a de aços longos 10,4% e a de aços especiais 19,1%. O problema se
agravará à medida que países firmem acordos e passem a ser isentos de tarifas.
Para o setor siderúrgico brasileiro, a melhor
saída seria restabelecer o acordo firmado durante o primeiro mandato de Trump.
Em 2018, as tarifas subiram para 25%, mas os governos americano e brasileiro
criaram cotas de isenção até 3,5 milhões de toneladas de semiacabados e placas
e até 687 mil toneladas de laminados. Somente vendas acima desses limites
pagavam o percentual. Até agora, a tentativa de reavivar esse acordo não deu em
nada.
A preocupação não se resume a perdas nas
vendas aos Estados Unidos. Existe também temor de que os produtores impedidos
de exportar ao mercado americano despejem mercadorias a preços irrisórios no
Brasil. Quando a maior economia do mundo espalha incerteza, as consequências
negativas se multiplicam. Ao mesmo tempo que negocia com o governo Trump, o
Brasil deveria se preparar para os efeitos do protecionismo americano.
Mendonça está certo sobre regulação das redes
Folha de S. Paulo
Ministro do STF adere aos princípios
constitucionais da liberdade de expressão no julgamento do Marco Civil da
Internet
O regime constitucional brasileiro assegura a
ampla liberdade de expressão e proíbe categoricamente a censura. Qualquer
regulamentação das atividades de comunicação precisa respeitar esses
mandamentos sob pena de ser banida do ordenamento legal.
O Marco
Civil da Internet, promulgado em 2014 após amplo debate na sociedade e no
Congresso Nacional, atende satisfatoriamente aos requisitos constitucionais.
Em seu artigo 19, o código determina que as
plataformas que provêm o serviço podem ser responsabilizadas legalmente apenas
no caso de se recusarem a cumprir ordem judicial determinando a
remoção de conteúdo produzido por usuários.
Nada mais coerente com a ampla garantia à
expressão do que delegar decisões de banir manifestações, que ainda assim
deveriam ser excepcionais e criteriosas, à autoridade do Poder neutro do
Judiciário, cujas ordens devem estar embasadas em sólida argumentação legal e
estão em regra sujeitas a recurso e revisão.
O intérprete canônico dos códigos não terá,
portanto, estranhado a argumentação do ministro André
Mendonça no julgamento que discute a responsabilização de provedores.
Ele foi o primeiro dos quatro do Supremo Tribunal Federal que se manifestaram
até agora —também votaram Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís
Roberto Barroso—
a reconhecer a adequação do artigo 19 à Carta.
Mendonça foi além ao afirmar que, à luz
da Constituição, a
Justiça não deveria agir para derrubar perfis inteiros das redes sociais,
como se tornou frequente em ordens de seu colega Alexandre
de Moraes. Que se remova a publicação específica que fere a lei, mas é
abusivo proibir seu autor de continuar a se expressar.
O ministro lembrou da importância de
resguardar direitos fundamentais que têm sido ignorados no país —como o de as
partes atingidas por ordem de remoção terem acesso ao teor da acusação, para
que possam se defender.
Ordens secretas, emitidas sem que o acusado
tenha o direito de conhecer a acusação, remetem às piores práticas do
absolutismo monárquico que predominou na Europa entre os séculos 16 e 17 —e
constituem abominação.
É lamentável constatar que o juízo de bom
senso e de rigorosa aderência aos princípios constitucionais expressado pelo
ministro tende a ser francamente minoritário na cúpula da Justiça.
A maioria do tribunal, outrora guardiã zelosa
da ampla liberdade de expressão, converteu-se à heterodoxia e ao relativismo.
Considerações subjetivas e meândricas sobre a mudança dos tempos e das
tecnologias ganham precedência sobre a extração direta do significado dos
textos legais e julgados fundamentais.
A prevalecer a tendência dos primeiros votos,
o STF também
caminha para mais invasão de atribuições do Legislativo. A
tarefa de regular a internet, aliás já realizada em 2014, é do Congresso.
Os ministros deveriam reconhecer sua limitação nesse caso.
Pioneiros na preservação do patrimônio
nacional
Folha de S. Paulo
Niède Guidon e Dalton Valeriano mobilizaram a
ciência em defesa da pré-história brasileira, da caatinga e da amazônia
O Brasil perdeu nesta semana dois
pesquisadores que empregaram com eficácia seu conhecimento para proteger
parcelas significativas da natureza e da cultura do país.
Com ferramentas da arqueologia e do
sensoriamento remoto, Niède Guidon (nascida em 1933) e Dalton Valeriano (1956)
construíram sistemas para preservação da caatinga e
da amazônia.
Em 1963, Niède ouviu falar de abrigos
pródigos em pinturas rupestres no sudoeste do Piauí, mas só conseguiu organizar
uma expedição à região de São Raimundo Nonato (a 530 km de Teresina) dez
anos depois. Deparou-se com milhares de desenhos de diferentes tradições
pictóricas, indícios de um antigo e rico passado de ocupação humana.
Teve início ali um empreendimento de pesquisa
e conservação que prossegue até hoje. O
empenho incondicional da pesquisadora em preservar os sítios
arqueológicos naquelas formações geológicas singulares, como o Boqueirão da
Pedra Furada, levaria já em 1979 à criação do Parque Nacional Serra da Capivara
—uma façanha.
Feito ainda maior foi implantar e manter a
infraestrutura invejável dessa unidade de conservação, que protege a um só
tempo as riquezas arqueológica, geológica e ecológica da caatinga. O parque tem
1.300 km², área comparável à da cidade de São Paulo, e conta com segurança,
boas estradas e guias treinados para visitação de dezenas de trilhas.
Essa raridade entre parques nacionais resulta
da liderança de Niède na Fundação Museu do Homem Americano. As exposições
apresentam suas teses sobre a presença humana no continente há mais de 50 mil
anos, que até hoje alimentam controvérsias em círculos arqueológicos.
Só 9% da caatinga está protegida em unidades
de conservação, o que aumenta a importância da Serra da Capivara. O bioma
semiárido ímpar, que não é compartilhado com outras nações sul-americanas, já
teve 42,6% da vegetação natural devastada.
O dado preocupante apurado por satélite
provém do sistema Prodes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), criado em
1988, que passou a monitorar a caatinga em 2016.
Outro programa de sensoriamento do instituto,
o Deter, crucial para fiscalização, nasceu com Dalton Valeriano para acompanhar o
desmatamento da amazônia, que acumula cerca de 800 mil km² de destruição
(quase 20%).
Tais informações assustam o mundo e envergonham o Brasil. Sem Niède e Dalton, decerto haveria mais razão para inconformismo dentro e fora do país.
O crepúsculo do demiurgo
O Estado de S. Paulo
Pesquisa mostra que Lula é desaprovado por
57% e que, na eleição, terá dificuldades até contra adversários mais fracos, o
que sugere que os eleitores não se encantam mais com sua parolagem
O presidente Lula da Silva bem que tentou
aplacar o tremendo mal-estar nas hostes petistas com a mais recente pesquisa de
popularidade de seu governo, convocando às pressas, de véspera, uma entrevista
coletiva para exercitar a vanglória e malhar adversários. Debalde.
Por mais competente que Lula seja como
encantador de serpentes e de eleitores, não foi possível minimizar o impacto da
sondagem da Genial/Quaest divulgada nos últimos dias. Não só porque Lula
aparece como desaprovado por 57% dos entrevistados, o pior nível desde o início
de seu mandato, como começa a ter dificuldades para liderar a corrida eleitoral
na hipótese de concorrer à reeleição. Como mostrou o levantamento, o petista
hoje empata até mesmo com nomes de menor musculatura eleitoral, como os governadores
do Paraná, Ratinho Junior (PSD), e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSD), e
como a novata Michelle Bolsonaro (PL). Nas pesquisas anteriores, o único capaz
de lhe fazer frente era seu antípoda Jair Bolsonaro, que está inelegível.
Isso não significa, é claro, que o destino de
Lula esteja selado, especialmente considerando-se que ele desmoralizou até aqui
todos os atestados de óbito político que lhe foram expedidos. Mas parece claro
que o demiurgo petista, que protagoniza a vida nacional desde o final dos anos
1980, está em seu crepúsculo – não só pela idade, mas sobretudo porque parece
ter perdido sua capacidade de enfeitiçar os brasileiros com sua parolagem.
A pesquisa mostra isso com clareza. Quase 80%
dos entrevistados acham que a economia piorou ou ficou do mesmo jeito com o
atual governo, e 45% acreditam que o terceiro mandato lulista é pior do que se
esperava inicialmente. Também não se pode ignorar outro desconforto: apenas 32%
da população considera que o Brasil está indo na direção correta, contra os 61%
que acham que o País está no mau caminho.
O curioso é que entre a última pesquisa, há
dois meses, e esta, muita coisa aconteceu: obcecado com a impopularidade,
inconformado com a desaprovação e ansioso com as eleições do ano que vem, o
presidente Lula anunciou no período uma leva de benefícios, entre os quais
isenções para motoristas de aplicativos, linha de crédito para reforma de casas
do programa Minha Casa Minha Vida, o novo vale-gás, o projeto que isenta de IR
quem ganha até R$ 5 mil e outras medidas clássicas da cartilha populista do
lulopetismo.
Nesses dois meses, Lula também não parou de
falar, em geral com um triunfalismo totalmente dissociado da realidade,
apostando na mitologia que foi criada em torno de suas qualidades como animador
de comícios. Petistas sempre festejaram seus improvisos como um instrumento
político poderoso, capaz de impulsionar o governo e reverter conjunturas
políticas desfavoráveis. Os métodos do ex-líder sindical, no entanto, se
mostram cada vez menos eficazes. O resultado é que seu governo está produzindo
frustração nos brasileiros, em vez de incutir-lhes esperança de prosperar.
Mesmo ante uma avaliação popular mais favorável da economia, há uma clara
quebra de expectativa. A prometida sensação de bem-estar, simbolizada na
“picanha com cerveja” anunciada por Lula em 2022, foi substituída pela
convicção de que a vida não melhorou nem vai melhorar.
Ao mesmo tempo em que está claro que o
repertório de Lula não é mais suficiente para convencer os incautos sobre as
qualidades de uma gestão desde sempre prisioneira da demagogia de seu
presidente, escândalos como o da roubalheira no INSS contribuem para acentuar
a malaise popular em relação ao governo petista. Para quem se
considera enviado de Deus para levar água ao sertão, deve ser uma frustração e
tanto.
Daqui até as eleições, é claro, muita coisa
pode acontecer, mas já é possível afirmar que Lula é, cada vez mais, apenas uma
sombra melancólica do que já foi. “Eu sou grande. Os filmes é que ficaram
pequenos”, diz a atriz decadente Norma Desmond no filme Crepúsculo dos
Deuses. Como Norma, Lula pode dizer que é um gigante numa política liliputiana,
no que talvez tenha razão. Mas, em seu crepúsculo, só lhe resta a nostalgia.
Demagogia, diplomas e dívidas
O Estado de S. Paulo
Inadimplência recorde do Fies, com 61,5% dos
contratos registrando parcelas em atraso, é o retrato mais bem acabado da
exploração eleitoreira da educação superior pelos governos do PT
A inadimplência dos estudantes atendidos pelo
Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) bateu recorde histórico em abril, como
revelou o Estadão há poucos dias. De acordo com dados do Ministério
da Educação (MEC), 61,5% de um universo de 2 milhões de contratos tinham
parcelas em atraso naquele mês. O número é quase o dobro do registrado em 2014
(31%), ano em que o Fies teve um pico de 733 mil contratos firmados, fruto da
incúria da então presidente Dilma Rousseff. Em dinheiro, o calote atualizado do
Fies soma impressionantes R$ 116 bilhões.
O Fies, para relembrar, é um programa de
fomento ao ingresso no ensino superior implementado no governo Fernando
Henrique Cardoso, em 1999, como substituto do Programa de Crédito Educativo
(Creduc). Por meio do Fies, o Estado arca com a maior parte do valor das
mensalidades, cobrando dos alunos o total financiado, acrescido de juros bem
mais camaradas do que os praticados pelo mercado financeiro, somente após a
formatura. A exceção é o chamado Fies Social, criado pelo presidente Lula da
Silva em 2024 para atender os estudantes que vêm de famílias com renda de até
meio salário mínimo por pessoa. Nessa modalidade, o Estado financia 100% do
curso.
O programa nasceu com um propósito nobre.
Mas, ao longo desses 26 anos, foi pervertido pelo populismo irresponsável dos
governos lulopetistas. No afã eleitoreiro de se apresentarem como os
responsáveis por ampliar o número de brasileiros matriculados no ensino
superior, Lula e Dilma, cada um a seu tempo e a seu modo, enriqueceram ainda
mais os donos de instituições privadas de ensino superior e transformaram
muitos jovens estudantes ou recém-formados em uma massa de endividados.
Para as faculdades particulares, não poucas
delas indigentes do ponto de vista acadêmico, o Fies foi um negócio e tanto.
Afinal, as instituições de ensino superior privado passaram a contar com o
dinheiro líquido e certo do Tesouro, repassando a maior parte do risco da
inadimplência para o Estado. Já para grande parte dos estudantes, restaram as
dívidas. Mas até para esses, graças a sucessivos e generosos programas de
renegociação ou até mesmo perdão dos débitos, as perdas financeiras, de alguma
forma, foram mitigadas. A conta mais pesada da histórica ineficiência nos
gastos públicos em governos do PT, é claro, recaiu – e ainda recai – sobre os
contribuintes.
Ao fim e ao cabo, salvo honrosas exceções, o
maior legado do Fies, em particular na sua concepção petista, de viés
claramente eleitoreiro, é uma perniciosa associação entre o dano ao erário e a
formação educacional precária de milhões de jovens universitários. Some-se a
isso a incompetência do atual governo para lidar com as transformações sociais
na atual quadra do século 21 – na qual o ensino superior deixou de ser uma
grande aspiração para muitos jovens – e está dado o caminho para a
insustentabilidade do Fies, como mostrou uma reportagem deste jornal.
Em um governo sério, o Fies não deveria
acabar, mas recomeçar do zero. No Brasil, por razões óbvias, há lugar para uma
política pública que incentive aqueles que têm o desejo de ampliar seus
horizontes por meio da educação formal. Mas o programa precisa, em primeiro
lugar, ser mais bem focalizado. Ademais, precisa estar vinculado ao desempenho
acadêmico. Podem ingressar no Fies os estudantes de famílias com renda de até
três salários mínimos por pessoa que obtiverem no Enem uma média igual ou maior
do que 450 pontos, além de nota maior ou igual a 400 na redação. Porém, não há
critérios de incentivo ao bom desempenho acadêmico do estudante beneficiado
durante o curso universitário.
Agora cabe ao contribuinte, mais uma vez,
arcar com os custos de um programa deformado pela demagogia. O rombo de R$ 116
bilhões no Fies não é apenas o retrato da má gestão; é o legado concreto de
escolhas políticas irresponsáveis, feitas à custa do erário e em nome do
projeto de poder do PT.
A ser mantido, o Fies tem de ser reformulado
sob nova premissa: a da responsabilidade, da eficiência e do respeito ao
dinheiro público.
Choque de realidade no PAC
O Estado de S. Paulo
Na falta de megaprojetos, Lula usa como palanque inauguração de escolas e postos de saúde
Com R$ 7,6 bilhões congelados neste ano, o
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi o mais afetado pela contenção
de R$ 31,3 bilhões nos gastos não obrigatórios anunciada pelo governo há alguns
dias – correção cujo objetivo é tentar amenizar um Orçamento irreal, que prevê
despesas totais de R$ 2,2 trilhões. Com isso, a vitrine que Lula da Silva
pretendia expor até as eleições de 2026, já desprovida dos megaprojetos – mais
ao gosto do petista, que embalaram eleições passadas enquanto esvaziavam os cofres
públicos –, fica ainda mais desabastecida.
Depois da série de denúncias em gestões
lulopetistas envolvendo superfaturamento de projetos, irregularidades em
licitações e manobras fiscais, ficou mais complicado concretizar as obras
monumentais que Lula gostaria de usar como palco de comícios. Desde o início do
terceiro mandato, algumas intenções nesse sentido têm sido frequentemente
citadas pelo petista, como a reativação de estaleiros com a construção de
navios para a Petrobras, em nome da retomada da indústria naval, uma das
principais taras do lulopetismo.
Em agosto de 2023, quando foi anunciado o
“Novo PAC”, terceira versão do velho programa, obras antigas de infraestrutura
que não saíram do papel, ou que ficaram inacabadas, como ferrovias, rodovias e
hidrovias, estavam lá mais uma vez. Todas para serem tocadas ao mesmo tempo,
com promessa de milhões de postos de trabalho e orçamento trilionário. Só de
recursos públicos, a previsão inicial de R$ 240 bilhões aumentou para R$ 371
bilhões em quatro anos. Juntando recursos privados, o total chegaria a R$ 1,3
trilhão, e havia um “pós-2026” de mais meio bilhão, num total de R$ 1,8 trilhão
– cifra que ainda consta do site do Novo PAC, da Casa Civil.
Com as grandes obras cada vez mais distantes
do alcance e a fiscalização redobrada de órgãos de controle, como o Tribunal de
Contas da União (TCU), a gestão Lula da Silva abraça agora a estratégia do
“Novo PAC Seleções”, uma espécie de versão pulverizada do programa, com obras
menos complexas e de menor custo, em parceria com prefeituras e administrações
estaduais.
Inaugurações de centros esportivos, postos de
saúde, projetos de mobilidade, e entrega de ambulâncias são os eventos a que
Lula da Silva vem comparecendo nos últimos meses, na readequação de sua agenda
política. O choque de realidade orçamentária do governo, necessário para conter
o déficit fiscal de 2025 a 0,25% do PIB, atingiu com maior rigor os Ministérios
das Cidades (redução de R$ 4,29 bilhões), Defesa (R$ 2,59 bilhões), Saúde (R$
2,36 bilhões) e Desenvolvimento Social (R$ 2,12 bilhões), que estão avaliando
onde cortar.
Além do PAC, coube às emendas parlamentares o congelamento robusto e R$ 7,1 bilhões, o que significa que o governo terá também uma margem menor de recursos para buscar o apoio do Congresso, já que a negociação política em Brasília tem se baseado nesse expediente. Ou seja, Lula terá de se contentar em inaugurar escolas, mas talvez nem para isso sobre dinheiro.
Caso Carla Zambelli tensiona relação entre os
Poderes
Correio Braziliense
Aliados de Carla Zambelli se mobilizam para
que a prisão da parlamentar seja revogada em plenário e pressionam o presidente
da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para que a Mesa não declare a perda de
mandato, o que ofende a Constituição Federal
A situação jurídica da deputada federal Carla
Zambelli (PL-SP) tornou-se mais crítica após sua fuga do Brasil. Nessa
sexta-feira, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou, por
unanimidade, os recursos apresentados pela defesa da parlamentar, mantendo sua
condenação a 10 anos de prisão por invasão ao sistema eletrônico do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) e falsidade ideológica. A parlamentar foi considerada
a mandante do crime, que envolveu a inserção de um mandado de prisão falso contra
o ministro Alexandre de Moraes no sistema do CNJ.
Com o trânsito em julgado da condenação, a
pena tornou-se definitiva, e a execução imediata foi determinada. Além disso,
Zambelli é ré em outro processo no STF, relacionado ao episódio em que sacou
uma arma e perseguiu um jornalista em 2022. Nesse caso, há maioria formada para
sua condenação a cinco anos e três meses de prisão em regime semiaberto, embora
o julgamento esteja suspenso devido a um pedido de vista .
Após a condenação, Zambelli deixou o Brasil,
inicialmente rumo aos Estados Unidos e, posteriormente, à Itália, onde tem
cidadania. Vale lembrar que Itália e Brasil mantêm tratados de extradição. Há
precedentes de extradição de cidadãos italianos para o Brasil, como no caso de
Henrique Pizzolato. Portanto, sua cidadania não garante imunidade automática
contra a extradição. Entretanto, a prisão e a extradição dependem das
autoridades italianas, e Zambelli está "politizando" a condenação
penal com a falsa narrativa de que sofre perseguição por defender a liberdade
de expressão.
Com a condenação definitiva, Zambelli
tornou-se inelegível por oito anos, conforme a Lei da Ficha Limpa. A
parlamentar, após a fuga, solicitou uma licença de 120 dias à Câmara dos
Deputados, que a oficializou. O primeiro suplente Coronel Tadeu (PL-SP) assumirá
o mandato. Entretanto, a perda definitiva do mandato depende de deliberação da
própria Câmara. É uma situação jurídica complexa. Sua condenação implica perda
de mandato. Sua fuga para o exterior e a inclusão na lista da Interpol
complicam ainda mais sua posição.
O recurso apreciado ontem pela Primeira Turma
do STF foi considerado "meramente protelatório" pelo relator do caso,
ministro Alexandre de Moraes, na fase de recursos. A posição foi acompanhada
pelos outros quatro ministros da Primeira Turma: Cristiano Zanin, Luiz Fux,
Flávio Dino e Cármen Lúcia. O caso Zambelli, portanto, transitou em julgado.
Diante disso, a bola agora está com a Câmara
dos Deputados, que deve declarar a perda de mandato da parlamentar. Reza a
Constituição que o parlamentar "que sofrer condenação criminal em sentença
transitada em julgado" perderá o mandato. Nesse caso, cabe à Mesa Diretora
apenas declarar a perda do mandato, sem maior análise. Em termos práticos, isso
significa a perda de foro privilegiado e do direito de ter a prisão revogada
pela Câmara.
É aí que está a tensão entre os Poderes. Os aliados de Carla Zambelli se mobilizam para que a prisão da parlamentar seja revogada em plenário e pressionam o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para que a Mesa não declare a perda de mandato. Apostam no espírito de corpo dos colegas e na derrubada da prisão e da execução da cassação, o que ofende a Constituição. A criação dessa espécie de "imunidade penal" sensibiliza os parlamentares enrolados nas investigações de desvio de verbas de emendas parlamentares do chamado "orçamento secreto". É mais um fato de estresse na relação entre os Poderes.
A Transnordestina mais perto
O Povo (CE)
É necessário que o investimento comece logo a
se traduzir em benefícios reais, diretamente para a população nordestina, que
está a par com os interesses de todo o País
Recursos de R$ 800 milhões para a conclusão
dos dois últimos trechos sem atividade da Transnordestina já estão
assegurados. A informação foi transmitida pelo ministro dos Transportes, Renan
Filho, conforme noticiou O POVO na edição de ontem. Ele disse que até setembro
será emitida a ordem de serviço para iniciar as obras dos 97 quilômetros que
compõem essa etapa.
O ministro esteve em Baturité, na
quinta-feira, para a assinatura do trecho oito do empreendimento. Ele
também reforçou o compromisso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de
concluir a fase um da ferrovia até o ano de 2027.
O avanço das obras tem motivado municípios e
empresas a iniciarem projetos para a construção de portos secos ao
longo de 1.206 quilômetros de trilhos entre Eliseu Martins (PI) e o Complexo
Industrial e Portuário do Pecém (CE).
A informação foi revelada à reportagem por
Tufi Daher, presidente da Transnordestina Logística S.A. (TLSA), empresa
responsável pela ferrovia. Segundo ele, seis dessas propostas são de
municípios cearenses e outras quatro em cidades piauienses e pernambucanas.
O executivo diz que cada cidade quer
construir um terminal intermodal, e que ele conversa com todos os
interessados. No entanto, disse que a decisão será técnica, de acordo com o
volume de carga que cada uma das cidades produz ou recebe.
As obras da Transnordestina foram iniciadas
em 2006, no segundo governo Lula, inseridas no Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC). A ferrovia tem como objetivo integrar o nordeste e dinamizar
a economia da região. Em funcionamento, a linha férrea vai promover a
integração regional, facilitar o escoamento da produção e aumentar a
competitividade, atraindo novos investimentos.
No entanto, a construção passou por vários
percalços, que impediram a sua conclusão no prazo inicialmente previsto para a
finalização da obra, que deveria ser concluída em aproximadamente de 10 anos.
Também atravessaram vários governos de diferentes partidos — Dilma Rousseff
(PT), Michel Temer (MDB), Jair Bolsonaro (PL) e, agora, com Lula, sem que as
promessas de avanço significativo das obras ou sua conclusão fossem realizadas.
Novamente sob a presidência de Lula, a
previsão é que a Transnordestina seja concluída até o fim de seu mandato. Para
além de questões políticas, pois 2026 será um ano de eleições, é
importante que o calendário seja cumprido. Já se esperou muito pelos resultados
desse investimento bilionário.
Portanto, é necessário que a ferrovia comece,
de fato, a se traduzir em benefícios reais diretamente para a
população nordestina, que está a par com os interesses de todo o País.
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