Correio Braziliense
Parlamentares terão muito trabalho para
atender aos pedidos do STF em campos do mundo do trabalho que implicam em
decisões difíceis e onerosas
O Supremo Tribunal Federal (STF) deu prazos para o Congresso Nacional aprovar três leis que são exigidas pela Constituição de 1988 na área trabalhista. A primeira é a lei sobre a licença paternidade, porque a regra atual de cinco dias foi aprovada pelos constituintes como provisória. A segunda é a lei sobre a proteção dos trabalhadores contra os problemas causados pela automação, também prevista na Constituição e, até hoje, não aprovada. A terceira é a lei de proteção dos trabalhadores contra os trabalhos penosos. As três são requeridas pela Carta Magna. São três imensos desafios:
Sobre licença-paternidade, há vários projetos
de lei tramitando que propõe uma ampliação dos atuais cinco dias para 10, 15,
20 ou mais dias. Mas há projetos que desejam igualar a licença-paternidade à da
maternidade (120 dias). Há também os que propõem mesclar os dois afastamentos,
criando a "licença parental", que é muito comum na Europa.
Onde está o desafio? Na forma de custear
esses afastamentos. Hoje, os cinco dias de licença dos pais são totalmente
custeados pelas empresas. Mas, quando se fala em ampliar essa licença, a conta
terá de passar para a Previdência Social.
Será que o INSS tem recursos para custear
licenças mais longas para os pais? Como o Congresso Nacional não pode criar
despesas para o erário sem indicar a fonte de custeio, caberá aos parlamentares
negociar com o ministro da Fazenda o adicional de recursos, o que, certamente,
enfrentará resistência numa hora em que o governo federal se esforça para
conter gastos, sendo a Previdência Social o maior foco de preocupação, pois tem
um deficit anual de mais de R$ 300 bilhões!
Ou seja, a Constituição exige, as crianças
precisam, os pediatras recomendam, mas não há dinheiro. Derrubar toda a conta
no colo das empresas seria um desastre ainda maior.
Sobre a proteção contra os efeitos deletérios
da automação, há também vários projetos de lei que tramitam há anos no
Congresso Nacional, sem nenhuma perspectiva de aprovação em face da grave
complexidade do assunto. Essa legislação envolve questões conceituais e
limitações práticas. A nova lei vai proibir ou penalizar a adoção de
tecnologias quando estas destroem empregos? Vai criar regras de substituição e
demissão dos empregados afetados? Ou vai expandir os programas de qualificação
e requalificação para "repaginar" os profissionais no novo mundo
tecnológico?
No primeiro caso, teríamos uma ação frontal
contra a modernização tecnológica e a perda de competitividade das empresas e
da economia brasileira. No segundo, regras de substituição e demissão podem
gerar um clima conflitivo. No terceiro, criar-se-ia a necessidade de imensos
recursos para a qualificação e requalificação, além de boas estratégias.
Mas, nesse campo, há outro desafio. Enquanto
o trabalhador estiver desempregado e sendo qualificado ou requalificado, de
onde virá a sua renda? Haverá uma extensão do seguro-desemprego? Mas esse
benefício (mais do que necessário) está criando despesas gigantescas numa hora
em que o Brasil, ironicamente, está com pleno emprego. Vamos agravar ainda mais
o desequilíbrio fiscal?
Sobre a proteção contra trabalhos penosos,
tem-se um desafio conceitual de enorme proporção porque até hoje nunca se
conseguiu uma definição clara do que seja "penosidade" nas atividades
laborais. Muitos consideram "penoso" levantar pesos excessivos, o que
é indiscutível. Outros se referem ao trabalho sob sol escaldante. Há ainda os
que chamam a atenção para o excesso de poluição sonora ou ambiental. Mas tudo
isso já está protegido por leis e regras no campo da periculosidade e insalubridade.
O que será específico da penosidade? Não se sabe.
Em suma. Os parlamentares que acabam de
voltar das férias terão muito trabalho para atender aos pedidos do STF nesses
três campos do mundo do trabalho. Os três implicam em decisões difíceis e
onerosas, além dos desafios conceituais indicados.
Poder-se-ia questionar se tais questões
deveriam ser parte da Carta Magna. Mas, passados 37 anos da sua aprovação, acho
que ficou tarde demais...
*José Pastore, professor da Universidade de
São Paulo, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da
Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras
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