Em um aspecto os réus do mensalão estão certos: o parecer do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pedindo a condenação de todos à exceção de Luiz Gushiken, não é surpresa nem novidade.
Como promotor do caso, cabe a Gurgel sustentar a acusação em continuidade à denúncia feita, e aceita pelo Supremo Tribunal Federal, pelo antecessor Antonio Fernando de Souza.
Novidade e surpresa haveria se o procurador desmontasse a peça de acusação resolvendo dar o dito pelo não dito.
A força das alegações finais da PGR e, portanto, a causa da reação dos envolvidos, está no aprofundamento da conclusão que desqualifica qualquer tentativa de se atribuir aquele escândalo a urdiduras político-conspiratórias.
Em março de 2006, Antonio Fernando apresentou sua denúncia com base no "conjunto comprobatório" que demonstrava a "existência de sofisticada organização criminosa que se estruturou profissionalmente para a prática de crimes como peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, gestão fraudulenta, além das mais diversas formas de fraude".
Em julho de 2011, Roberto Gurgel concluiu pela comprovação da existência de "um plano criminoso voltado para a compra e venda de votos dentro do Congresso" e foi além: "Trata-se da mais grave agressão aos valores democráticos que se possa conceber."
A absolvição é uma possibilidade? Sempre é, ainda mais quando o assunto é corrupção, um pântano em que a prova cabal é especialmente difícil de ser estabelecida por meio de recibos, assinaturas, confissões.
O Supremo poderá concluir pela ausência ou insuficiência de documentação como ocorreu no caso de Fernando Collor de Mello, embora, diferentemente do que ocorreu à época, a procuradoria não esteja politicamente engajada e por isso mesmo muito mais atenta à substância do processo.
Fundamenta-se em cruzamentos de dados e depoimentos que mostram desvios de recursos de empresas públicas, empréstimos fraudulentos e repasses a políticos em troca de apoio político, a título de financiamento de campanhas eleitorais, pagamentos de dívidas ou despesas de variadas naturezas.
Passo a passo, desde a CPI dos Correios, em 2005, os fatos fazem picadinho da tentativa de dar ao mensalão status de armação política.
Primeiro, a conclusão da CPI, depois a denúncia do procurador Antonio Fernando, depois o acolhimento da denúncia pelo STF e agora a apresentação das alegações finais da procuradoria.
Até o momento, a única "obra de ficção" de que se tem notícia é a anunciada disposição de Luiz Inácio da Silva de se dedicar a "desmontar a farsa do mensalão" quando deixasse a Presidência da República.
Assim que saiu o parecer de Roberto Gurgel, o ex-presidente calou-se e mandou a assessoria declarar seu desinteresse em discutir a questão, dedicado que está ao exame de uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas sobre a "expansão da classe C".
Delegou a tarefa do contraditório aos petistas, que, desenxabidos e sem argumentos, aludiram à inexistência de "fatos novos". Como se os velhos não bastassem.
Mais delongas. A expectativa de que o processo do mensalão comece a ser julgado no início de 2012, já que o ministro relator, Joaquim Barbosa, terá concluído seu voto no fim deste ano, não é realista.
O ministro revisor, Ricardo Lewandowski, levará pelo menos seis meses para concluir o voto dele.
No vazio. O "recado" de Luiz Antonio Pagot, de que não fez nada no comando do Dnit sem autorização do Ministério do Planejamento, é muito parecido com a declaração de José Dirceu à época do mensalão, de que todas as suas ações eram do conhecimento de Lula.
Esse tipo de insinuação não necessariamente embute ameaça. Soa mais como uma maneira de legitimar os próprios atos. A julgar pelas declarações do padrinho de Pagot, Blairo Maggi, dizendo que o depoimento de hoje no Congresso será "técnico", o ex-diretor não ateará fogo às vestes. Próprias ou alheias.
FONTE O ESTADO DE S. PAULO
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