• Governo barra despesas extras, quer desmontar desonerações e planeja um superávit gradual. Veto à lei que dava mais flexibilidade para conceder novas desonerações tributárias, foi o primeiro passo
Sonia Filgueiras – Brasil Econômico
Antes mesmo de anunciar formalmente sua nova equipe econômica, o governo já iniciou o ajuste fiscal. Uma das medidas veio ontem, com o veto da presidenta Dilma Rousseff ao texto de uma lei complementar que dava mais flexibilidade ao governo para conceder novas desonerações tributárias. De acordo com uma fonte do Palácio, uma das tarefas do futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy, será desmontar o sistema de desonerações fiscais a produtos concedidos ao longo dos últimos anos, como forma de atenuar os efeitos da crise internacional sobre a economia brasileira. Além disso, o governo pretende alterar o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2015, que prevê um superávit fiscal de 2% no próximo ano. "É impossível alcançá-lo em um ano. Terá que ser gradual, até 2016", disse a fonte.
"A partir de agora, nada que reduza receitas, afete despesas ou sinalize em direção contrária ao ajuste vai prevalecer", completou a mesma fonte. O reforço para o ajuste fiscal à frente vem junto com o anúncio de mais uma má notícia nas contas públicas. O Tesouro Nacional anunciou ontem que, no mês passado, o superávit do governo central (que reúne os resultados do Tesouro, da Previdência e do Banco Central) foi de R$ 4,1 bilhões, o mais baixo em 12 anos para os meses de outubro. O secretário do Tesouro, Arno Augustin, reafirmou que o governo está trabalhando com a meta de superávit de R$ 10,1 bilhões em 2014, que ainda depende da aprovação da mudança, pelo Congresso Nacional, da LDO deste ano, que prevê uma meta bem maior, superior a R$ 80 bilhões. Arno evitou considerar a possibilidade de a mudança não ser aprovada.
"Trabalhamos com a aprovação", disse. À pergunta sobre a existência de um "plano B", caso a aprovação não ocorra, o secretário respondeu: "Essa expressão, plano B... eu nunca ouvi alguém dizer que tem plano B". Augustin afirmou também que tem "total segurança" da legalidade de trabalhar com a nova meta sem sua aprovação formal — questão levantada pela oposição do Congresso. A aprovação da mudança tem mostrado ser uma tarefa dura para o governo no Congresso, com sucessivos adiamentos. A meta deste ano não será cumprida por causa da queda das receitas — decorrente do baixo crescimento e da política de desonerações — e da elevação de gastos com investimentos (em especial as obras do PAC), sociais, como saúde e educação, e, segundo analistas, também com custeio.
As despesas vêm subindo em velocidade maior que as receitas ao longo do ano. "A continuidade desse movimento levará certamente a um déficit fiscal", diz Marcel Caparoz, da RC Consultores, reiterando a necessidade de um ajuste. Para alcançar a meta, o governo terá que fazer uma economia de aproximadamente R$ 25 bilhões. "Esse resultado fica compatível com o que vamos ter nos próximos períodos" declarou Arno Augustin, referindo-se aos meses de novembro e dezembro. Caparoz acredita que o governo conseguirá chegar à economia para a meta reduzida, "um número bastante baixo". A intenção de alcançar a meta de 2%de superávit fiscal fixada para o próximo ano de forma mais gradual até 2016 é parte de uma tentativa do governo de restaurar sua credibilidade, fazendo promessas mais factíveis que seja capaz de entregar.
O pesquisador da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro Gabriel Leal de Barros, especialista em contas públicas , concorda. "Na minha visão, não é possível atingir um primário de 2% em 2015 e a LDO deve ser revista e trabalhar com um cenário realmente possível, crível, de gradual consolidação fiscal" afirma ele. Segundo o economista, hoje a economia está deprimida, longe de seu potencial máximo de crescimento. "A melhor decisão à frente é pelo gradualismo consistente e crível, onde o governo aponte como e em que intensidade fará a recomposição do equilíbrio fiscal e retorno do primário ao patamar de 2% a 2,5% do PIB", diz ele.
Este patamar é considerado o necessário para fazer com que a dívida do governo em relação ao PIB volte a cair. O veto de Dilma que restringiu o espaço de novas desonerações veio na lei complementar que permitiu a redução dos encargos da dívida de estados e municípios com a União. A flexibilização foi mantida, conforme acordo com o Congresso no mês passado. Na justificativa do veto, Dilma disse que o artigo foi elaborado "em momento de expansão da arrecadação", mas, segundo ela, houve "alteração da conjuntura econômica". Augustin defendeu o veto: "É para que não haja duvida que o processo de desoneração vai continuar com uma restrição importante" disse.
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