• Parceiro do doleiro Youssef, deputado morto e ex-diretores da estatal são alguns elos entre os dois escândalos
• Apesar dos pontos de contato, corrupção na estatal mostrou-se mais vultosa que a apurada durante o mensalão
Graciliano Rocha – Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - No dia 5 de outubro de 2012, uma sexta-feira antevéspera da eleição municipal, o ex-deputado federal Pedro Corrêa (PP-PE) entrou discretamente em um prédio de escritórios de São Paulo para se encontrar com Rafael Ângulo Lopez, homem do doleiro Alberto Youssef encarregado de distribuir dinheiro vivo para políticos em todo o país.
Em depoimento, Lopez disse que guardava dinheiro em maços dentro de sacolas de shopping e que abasteceu uma mala levada por Corrêa com R$ 2 milhões. A origem era propina paga por empreiteiras com contratos com a Petrobras. O petrolão.
Conforme a descrição, o episódio ocorreu apenas um mês antes de Corrêa ser condenado a 9 anos e 5 meses de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Mas em outro caso rumoroso. O mensalão.
Pedro Corrêa nega ter recebido propina no petrolão, mas registros da portaria mostram que ele esteve no escritório de Youssef 19 vezes entre 2011 e 2012. Período em que era réu da ação penal 470, o mensalão.
A justaposição do personagem nos dois escândalos ilustra como, enquanto os holofotes se dirigiam ao mensalão, o petrolão fincou raízes na maior companhia do país.
A origem
O mensalão e o petrolão têm muitos pontos de contato, mas grandezas diferentes.
O maior escândalo do governo Lula movimentou R$ 141 milhões e levou a 25 condenações --12 de políticos e ex-dirigentes partidários.
A sangria na Petrobras foi estimada em R$ 6,2 bilhões e já resultou em 49 políticos investigados. Entre eles, os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, ambos do PMDB. Quase 20 executivos das maiores empreiteiras do país já foram presos.
No primeiro semestre de 2004, o deputado José Janene (PP-PR) era um dos sacadores de dinheiro das contas das empresas do publicitário Marcos Valério, principal operador do mensalão.
Pela versão de Youssef, Janene também chantageava o Planalto ameaçando obstruir votações de interesse do governo se não obtivesse uma diretoria da Petrobras.
Conseguiu. Em 14 de maio do mesmo 2004, Paulo Roberto Costa assumiu a diretoria de Abastecimento indicado pelo PP. Janene morreu em 2010, antes do julgamento do mensalão.
Segundo Costa, o cartel das empreiteiras já existia na estatal pelo menos desde 2000, mas sua diretoria começou a ter caixa para grandes obras em 2006. Ainda segundo ele, até 3% do valor de cada contrato eram sobrepreço, que retornavam como propina a diretores e a partidos.
No caso de Costa, o butim era rateado com o PP. Segundo a Procuradoria, o esquema se reproduziu na área Internacional, feudo do PMDB (principal parceiro do PT no Congresso no pós-mensalão), e na diretoria de Serviços, chefiada por Renato Duque.
Indicado pelo ex-ministro José Dirceu --principal condenado no mensalão--, Duque foi apontado por delatores como o homem que definia com o tesoureiro João Vaccari a propina paga pelas empreiteiras ao PT. Vaccari e Duque estão presos. Dirceu é investigado pela Lava Jato. Sua consultoria recebeu R$ 10 milhões de empreiteiras implicadas no petrolão --R$ 1,4 milhão da Jamp Engenheiros, apontada como fachada para lavar dinheiro da propina dos fornecedores da diretoria de Duque.
O Planalto
O mensalão foi parar no gabinete do então presidente Lula em 11 de agosto de 2005, quando o publicitário Duda Mendonça, em depoimento à CPI dos Correios, associou a campanha de 2002 a crimes eleitorais e financeiros.
No depoimento de quase dez horas, Duda admitiu ter recebido US$ 5 milhões do PT em contas no exterior.
A oposição passou a ter uma prova robusta para pressionar o governo. Em dezembro daquele ano, a popularidade de Lula despencou para 29%, ponto mais baixo nos seus dois mandatos.
Após o depoimento de Duda, a possibilidade de impeachment passou a rondar o Planalto, mas tucanos e pefelistas apostaram em sangrar Lula para batê-lo nas urnas. Deu errado: o petista se reelegeu e fez a sucessora.
Ao lado da retração na economia, o petrolão também cobra um preço alto de Dilma Rousseff. Segundo o Datafolha, só 13% dos eleitores consideravam seu governo bom ou ótimo (índice mais baixo desde a redemocratização) em março deste ano.
A compra da refinaria de Pasadena (EUA), que causou prejuízos de US$ 792 milhões à Petrobras, associa Dilma ao caso. Ela era presidente do conselho de administração em 2006 e avalizou o negócio.
Mas uma auditoria interna da estatal isentou-a de culpa ao mostrar que o ex-diretor Nestor Cerveró, preso na Operação Lava Jato, omitiu do conselho cláusulas nocivas.
Mesmo assim, em abril, o Datafolha mostrou que quase dois terços dos brasileiros (63%) afirmavam que, considerando tudo o que se sabe a respeito da Lava Jato, deveria ser aberto processo de impeachment contra a petista.
O Planalto agora se preocupa com a profusão de delatores premiados que põem sob suspeição o financiamento das campanhas do partido.
Segundo o delator Augusto Mendonça, da Toyo Setal, o dinheiro da propina chegava ao PT por meio de pagamentos em dinheiro, remessas para o exterior e, após combinação com Vaccari, por doações oficiais das empreiteiras às campanhas e ao partido.
Apontado como líder do cartel das empreiteiras, o presidente da UTC, Ricardo Pessoa, fechou acordo com a Procuradoria Geral da República em troca de benefícios.
Ele usava o WhatsApp para acertar doações eleitorais --inclusive, para a campanha de Dilma em 2014-- com outros executivos da UTC. Os procuradores confrontam mensagens dele à versão sobre o pagamento de propina na forma de doações legais.
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