- O Estado de S. Paulo
A atual crise é cheia de meandros, particularidades e ramificações políticas, econômicas e empresariais, mas, numa coisa, ela não conseguiu inovar: o script do governo é exatamente o mesmo de todas as crises, em qualquer tempo, em qualquer regime. Essa falta de criatividade e de resultados vai consumindo munição e esgotando alternativas.
Vamos lá. Todo presidente da República em apuros começa com a reforma política e essa, como se previa e se confirmou, foi um fiasco. Depois, avança por uma reunião com todos os governadores do país, mas essa também, como se previa e se confirmou, até agora não serviu para muita coisa. Enfim, saca a reforma ministerial, geralmente exibindo um nome bem reluzente para ofuscar o ambiente e nutrir as manchetes. É nessa fase que Dilma Rousseff se encontra.
A reforma ministerial vem sendo idealizada para fortalecer os a favor, enfraquecer os do contra, acabar com algumas pastas de ficção e dar o título de ministro para o ex-presidente Lula, que, assim, passaria a ter foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal na eventualidade de o juiz Sérgio Moro e a Lava Jato se aproximarem perigosamente dele. Nunca se sabe o dia de amanhã...
Parece engenhoso, mas o tiro pode sair pela culatra. Dilma já entregou o comando da economia para Joaquim Levy, que professa crenças opostas às dela, e já delegou a coordenação política para o vice-presidente Michel Temer, justamente o “alguém” que começa a surgir no fim do túnel. Ela agora jogaria o governo no colo de Lula? Na prática, seria um autoimpeachment.
Dilma, porém, não dá sinais de estar desistindo. Dia sim, dia não, recorre a seu passado de guerreira contra a ditadura militar para avisar a quem interessar possa – inclusive ao PT, à sua base aliada e aos 71% da sociedade que a rejeitam – que ela não é mulher de entregar os pontos facilmente. Na reunião de governadores, no programa de TV do PT e em entregas de unidades do Minha Casa Minha Vida, o grito de guerra é o mesmo. Em tradução livre: daqui, eu não arredo pé!
Também faz parte do script de governos nas cordas falar em “pacto de governabilidade” e criar monstros. É isso que Dilma faz quando sugere que há ameaças à democracia, que estão tentando desestabilizar o País, que querem atropelar a legitimidade do voto da maioria. Quem quer? Os 71% da sociedade que rejeitam o governo? Ou os 63% que defendem o impeachment?
Se há ameaças e desestabilização, que Dilma atribua ao PT, que vive tirando o tapete de Joaquim Levy, à sua base aliada, que vota os maiores disparates no Congresso, aos saqueadores da Petrobrás, que estão atrás das grades e nas manchetes, e, “last but not least”, ao primeiro governo dela, que empurrou a economia para o buraco. Quem, afinal, produziu uma inflação de quase 10%, a maior retirada da poupança desde 1995, os juros de 14,25% e uma queda de 89% no lucro da Petrobrás no segundo trimestre?
Apesar disso, Dilma transforma o Alvorada em bunker, preparando a guerra com os ministros hoje e com os líderes amanhã, enquanto o vermelho pró-PT reaparece nas ruas, com Lula jogando flores da janela, as “Margaridas” do MST anunciando marcha em Brasília nesta semana, os movimentos sociais alinhados se armando, a Firjan e a Fiesp pagando anúncio de página inteira nos jornais e os “intelectuais e artistas” pró-PT pisando no acelerador do fusquinha.
Do outro lado, vêm aí as manifestações do próximo domingo, preparando terreno para o TCU e o TSE e de olho em dois bólidos desgovernados: Eduardo Cunha na Câmara e a delação de Renato Duque na Lava Jato.
Para completar o script, tempos de crise são tempos de boatos, principalmente nas sextas-feiras esvaziadas de Brasília, quando as bruxas já andam naturalmente soltas e ficam ainda mais assanhadas em agosto. Como diz a sabedoria popular, todo boato tem um fundo de verdade...
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