- O Globo
Pela primeira vez desde o início da era do real, o Brasil pode ter alguns anos seguidos de inflação baixa e juros em níveis que quebram o recorde. Isso está na base do otimismo que cerca a conjuntura brasileira, apesar das ameaças econômicas e políticas. Na semana passada, alguns bancos e consultorias refizeram os cálculos das projeções de crescimento para este ano e o próximo.
O mercado oscila em fases de otimismo e pessimismo. Não por ciclotimia, mas por interesse. Os ganhos se realizam muito mais nas mudanças de humor do que nas fases de alta. Mas desta vez os economistas apontam os fatos que não são comuns na vida brasileira. Normalmente, a inflação caía para logo em seguida subir. Com os juros, acontecia o mesmo sobe e desce. Agora muitos calculam que há uma grande chance de se quebrar esse paradigma.
A inflação caiu de forma impressionante e puxada pelos alimentos. Houve uma reversão de mais de 16 pontos na inflação de alimentos quando se compara o ano passado, em agosto, com o agosto deste ano, em que o Brasil está com deflação em alimentos. A queda não foi causada pela recessão, mas sim por uma extraordinária oferta neste ano em que o país está tendo a vantagem de um crescimento de 13% no PIB agrícola e abundância de safra.
Em setembro, a prévia ficou abaixo do que se esperava, em 0,11%, e o IPCA cheio pode ser próximo de zero, apesar da alta da gasolina. Tudo isso empurra o Banco Central para a política estimulativa, ou seja, os juros terão que cair mais e buscar patamar abaixo de 7%, apesar de o Relatório de Inflação ter falado em “redução moderada da magnitude da flexibilização monetária”, o que quer dizer que, em vez de reduzir em um ponto percentual a taxa, o corte deve ser de 0,75% na próxima reunião. O BC falou também que o Copom “antevê encerramento gradual do ciclo”. Ele vai gradualmente parar de reduzir as taxas.
De qualquer maneira, já se aproxima da menor taxa da era do real. A última vez que se chegou em 7,25%, em 2012, foi da maneira errada e no momento impróprio. A ex-presidente Dilma exigiu a queda dos juros, o BC aceitou a intervenção, apesar de a inflação estar subindo. Ficou pouco tempo nesse patamar. Agora a avaliação dos economistas é que a inflação pode permanecer em torno de 4% nos próximos dois anos pelo menos, depois de um índice que corre o risco de ficar abaixo do piso da meta. Isso permitirá a taxa de juros mais baixa, o que ajuda no ponto mais nevrálgico dos indicadores fiscais: a dívida pública.
A agricultura começou esse círculo virtuoso, depois de o Brasil ter vivido ao fim do governo Dilma o maior surto inflacionário desde a eleição de Lula. Naquela época, em 2003, era o temor do desconhecido pela chegada do PT ao poder e foi enfrentado com sucesso pelo então ministro Antonio Palocci. O retorno da confiança derrubou o dólar, que permitiu a queda da inflação. O surto inflacionário de Dilma foi provocado pela manipulação dos preços que precisaram ser corrigidos. As decisões acertadas do Ministério da Fazenda e do Banco Central no governo Temer e a safra recorde viraram o jogo e derrubaram a taxa de inflação para níveis recordes. Isso permitiu o aumento do rendimento real e da renda disponível dos trabalhadores, mesmo numa conjuntura de alto desemprego. E o ciclo bom começou.
A agricultura não repetirá no ano que vem o desempenho deste ano, mas deve crescer 4% na previsão da MB Associados, que tem tradicionalmente excelente acompanhamento do setor agrícola. Não haverá o fenômeno de 2017, mas continuará numa onda boa.
Outra área que alimenta o otimismo é a externa. O país está com um déficit mínimo na conta-corrente e com uma balança comercial que na terceira semana de setembro havia acumulado no ano US$ 51 bilhões. O capital estrangeiro reduziu sua aposta na dívida brasileira. Era detentor de 23% dos títulos públicos e agora está com 13%. Mesmo assim, o real se valorizou.
Por tudo isso os economistas fazem previsões otimistas, mas sabem que a disputa eleitoral de 2018 é a mais imprevisível desde 1989. Não se tem a mais remota ideia de que projeto econômico vencer.
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