sexta-feira, 6 de julho de 2018

Cristian Klein: Da corrente pra frente ao anarriê político

- Valor Econômico

Olham a cobra e a chuva. E não é mentira

Em meio à Copa do Mundo e a menos de 20 dias para o início das convenções partidárias, o cenário das alianças na corrida presidencial e nas disputas estaduais nunca esteve tão pouco definido. A impressão é que os parceiros se darão os braços em cima da hora, como casais numa improvisada festa junina - ou julina, com prorrogação até 5 de agosto. Depois de tanto tempo, não há improviso, claro, mas receio e cálculo.

Os políticos olham a cobra e a chuva. E não é mentira. Tem o Bolsonaro que se cria e serpenteia. Tem o PT que ainda pode colher votos no solo fértil do Nordeste - com ou, mais provável, sem a candidatura Lula. Tem duas noivas: Alckmin, desenxabida, mal nas pesquisas, que pretende se casar com os partidos sem muita opção do Centrão. E o PSB, legenda cortejada por petistas e por um Ciro que tenta se despir da fantasia de coronel do arraial.

Sempre animado na quadrilha, o MDB de Temer está cabisbaixo e deixa Meirelles pular na fogueira de uma candidatura de 1%. Com maquiagem de bolinhas e cabelo 'Marina Chiquinha', a líder do Rede espera pacientemente que o anzol fisgue o prêmio máximo na terceira vez que participa da pescaria.

A plateia assiste a tudo com desinteresse e cansaço. No alheamento da população, todos tentam crescer nas pesquisas com a dificuldade de quem sobe no pau de sebo. O eleitor está escorregadio. Há muitas bandeirinhas penduradas. Mas nenhuma grande bandeira ou santo a celebrar. O país esfarrapado ainda precisa se remendar. Balões soltos já murcharam, caíram ou voaram sem provocar incêndio: Luciano Huck, Joaquim Barbosa, João Doria.

Com Bolsonaro é diferente. Ainda no ar, o ex-militar promete queimar florestas e a institucionalidade. Na mais nova proposta, lança a ideia de diluir um suposto Supremo de esquerda com a indicação de uma tropa de mais dez ministros, para se chegar a uma Corte de 21 magistrados. "É uma maneira de botar dez isentos lá dentro", disse. Isentos para quem?

Bolsonaro não grita 'Anauê!', a saudação do movimento integralista de inspiração fascista, autoritária. Mas chega à festa da democracia aos brados de um 'Anarriê!', corruptela do francês "en arrière": "Para trás!".

Quem não vê retrocesso entra no túnel e bate palma para defensor da ditadura militar. Para os empresários reunidos na Confederação Nacional da Indústria (CNI) nesta semana, Bolsonaro vai liderar o "Alavantú" ("en avant tous"): "Todos para frente". Revisão da reforma trabalhista merece vaia a Ciro. A campanha do deputado agradece o apoio, tirando o chapéu de palha.

A aliança com o empresariado, porém, ainda não está firmada. Nem com o PR, de Valdemar Costa Neto, embora a conversa esteja avançada, sem a confirmação do senador Magno Malta como vice. Confiante com seu crescimento, Bolsonaro vivia dizendo que não precisaria de coligações. Faria uma campanha sem muito dinheiro, estrutura, baseada nas redes sociais que o trouxeram até aqui, na liderança da corrida presidencial nos cenários sem Lula. Mudou o discurso: "Vocês querem que eu fique sem televisão, é isso?".

Com o PR, o pré-candidato do PSL aumentaria em 45 segundos seu tempo de propaganda em rádio e TV. Atualmente, tem apenas oito segundos. Para não ser visto como nanico, um novo Enéas, Bolsonaro está disposto a trocar supostas convicções que defendeu até agora pelo pragmatismo da política como ela é. Reclama que "qualquer postagem" no Facebook chegava, poucos meses atrás, a 1 milhão de interações e que para conseguir 100 mil "é um sacrifício". Vitimização ou bateu o desespero? Bolsonaro se vê encurralado pelo centro, pela esquerda e pela centro-direita, para justificar a coligação com o PR, que lhe custará explicações sobre um partido cujo chefe foi condenado no mensalão.

'Olha o PR de Valdemar!', apontarão. Bolsonaro, pelo jeito, não desmentirá. Em troca do apoio do partido, disse que poderia até nomear todo o primeiro escalão de 15 ministros com indicados do PR. Para quem dizia que só escolheria técnicos, não ligados a partidos, é uma mudança rápida e radical.

Segue a ciranda e outra guinada seria a aliança do Centrão com Ciro. Um casamento de conveniências que poderia transformar de vez os votos da locomotiva de São Paulo num trenzinho do Geraldo Alckmin. A ver se o mais provável ainda é a dependência de trajetória que engata tucanos ao DEM e aos demais vagões como PP, PSD, PRB, PTB e SD.

Ciro tende a ficar com o PSB. De acordo com mapeamento feito pela coluna junto ao partido, dos 27 diretórios estaduais apenas Pernambuco e Bahia "são petistas". As duas seções defendem a aliança nacional seja para apoiar Lula ou o nome a ser indicado pelo ex-presidente, preso em Curitiba e que deve ser declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral, com base na Lei da Ficha-Limpa. No Acre, o PSB apoiará o pré-candidato a governador e ex-prefeito de Rio Branco, Marcus Alexandre, do PT, mas numa coligação que também deverá incluir o PDT de Ciro.

Apesar do favoritismo do ex-governador do Ceará, os petistas correm atrás e contam com a adesão do PSB ao projeto nacional. No início da semana, uma das comissões do Grupo de Trabalho Eleitoral do partido, que negocia alianças com PSB e Pros (outra trava conversas com PCdoB e PR), formada pela presidente da legenda, a senadora Gleisi Hoffmann, o vice, Márcio Macêdo, e o deputado federal Paulo Teixeira, terá reuniões em Pernambuco e na Paraíba. O grupo encontrará os governadores Paulo Câmara e Ricardo Coutinho, o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, e Renata Campos, viúva de Eduardo Campos, líder do partido morto em acidente aéreo quando fazia campanha à Presidência em 2014.

Para Teixeira, a aliança nacional não favorece o PSB só em Pernambuco, onde o PT retiraria a pré-candidatura de Marília Arraes, que põe em risco a reeleição de Câmara. "Temos possibilidade de estarmos juntos em 14 Estados", diz o deputado. No balanço, o PT receberia o apoio pessebista em seis Estados: Acre, Ceará, Rio Grande do Norte, Rio, Minas Gerais e Bahia. E apoiaria o PSB em sete unidades da Federação: Amazonas, Amapá, Paraíba, Pernambuco, Espírito Santo, Tocantins e Distrito Federal. No Maranhão, ambos marchariam com o governador Flávio Dino, do PCdoB. Changê.

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