Crescimento
sustentável com redução do desemprego e da desigualdade é o maior desafio
Marcelo
Costa Batista, meu leitor assíduo e crítico feroz, escreveu: “Desafio o
colunista a apresentar aqui alguma solução para tirar milhares de brasileiros
da miséria, gerar desenvolvimento e emprego para os milhares de desempregados e
principalmente rever a carga
tributária de regressiva para progressiva, inclusive tributando lucros
e dividendos em percentuais franceses e noruegueses”.
O
desafio do leitor tem uma parte fácil e outra difícil. A fácil é defender a
elevação da tributação sobre os mais ricos. Tratei desse tema em algumas
colunas no passado. Veja, por exemplo: "Imposto
para os ricos", "O
Buraco é Fundo", "Erro
Simples" e "Chegou a hora de os ricos contribuírem para o
ajuste" (bit.ly/3eILGIK).
A
questão aqui é ter um correto diagnóstico do problema. Por exemplo, um
trabalhador no contrato CLT que ganha muito já enfrenta carga
tributária na casa de 40%, bem superior à alíquota máxima do IRPF, pois
a contribuição previdenciária, no que exceder o teto da Previdência, também é
imposto.
As empresas que operam no lucro real já pagam IRPJ somada à CSLL de 34%, e as do setor financeiro, 40%. É sempre possível aumentar a alíquota, bem como é preciso medidas que aproximem o lucro tributado do lucro contábil, mas certamente as maiores distorções estão nas empresas que operam no regime tributário especial do lucro presumido e do Simples.
Além
de um correto diagnóstico, é saudável não ter leitura conspiratória do
problema. Não há um agente maligno responsável pelos nossos males.
Como
escrevi na coluna
de 30 de maio de 2020, “se a alíquota [de imposto sobre o lucro dos bancos]
fosse de 57%, em vez da alíquota média real de 28%, observada no quadriênio
2016-2019, a receita adicional anual para o Tesouro seria de R$ 34 bilhões, menos
que as desonerações do IRPF”. (Na coluna original estava 75%, em vez de 57%.
Erro meu.)
Há
espaço para elevar a receita com tributação sobre os ricos, mas está longe de
ser a panaceia que se imagina.
A
parte difícil do desafio do leitor é como produzir crescimento persistente e
sustentável com redução da taxa de desemprego e da desigualdade.
Desde
os anos 1980 a economia brasileira se encontra estagnada. A produtividade do
trabalho cresceu ao ritmo de 0,5% ao ano.
O
melhor período que tivemos foram os oito anos da Presidência de Lula.
Crescemos com queda do desemprego e redução da desigualdade. Adicionalmente, a
produtividade do trabalho, segundo o Observatório da Produtividade do FGV Ibre,
cresceu 2,2% ao ano.
Várias
circunstâncias tornam difícil replicar as condições daquele período tão
positivo.
A
primeira foi que FHC passou
o bastão para Lula com a economia estabilizada, crescendo 2,5% ao ano, com
superávit primário estrutural das contas públicas de 2% do PIB e exportações
líquidas de 0,8% do PIB.
No
primeiro mandato de Lula, a política macroeconômica foi conservadora. Como
consequência, em 2005 o superávit primário estrutural era de 4% do PIB (dois
pontos percentuais acima do legado por FHC), as exportações líquidas, de 3,4%
do PIB, e, no fim de 2006, a inflação era de 3%. Na
coluna de 19 de setembro passado, tratei da evolução e do conceito de
déficit primário estrutural no período.
Quando
houve a troca do ministro Palocci por Mantega, a política econômica passou a
ser não sustentável.
Os
seguintes sinais indicam a não sustentabilidade da política econômica praticada
entre 2006 e 2010: a inflação subiu de 3% para 4,5%, sendo que o núcleo da
inflação de serviços subiu de 4% para 7%; o déficit primário estrutural caiu de
4% do PIB para zero; e as exportações líquidas caíram de 3,4% do PIB para -1%.
O
nível dessas estatísticas não era muito preocupante. A dinâmica era.
Como
mencionei semana passada, o grande acerto do petismo foi a política de
acumulação de reservas, que contribuiu muito para a queda do risco-país e,
portanto, para a queda do juro real de equilíbrio.
Assim,
em que pese um belo ponto de partida, legado por FHC e pelos primeiros três
anos do primeiro mandato, o que eu chamei do período Malocci; o acerto na
política de acumulação de reservas; e a forte ajuda das condições
internacionais com o aumento dos preços das commodities, que se manteve em
níveis elevados até meados de 2011, a política econômica de 2006 a 2010 já era
não sustentável.
Quem
assumir a Presidência em 2023 terá um ponto de partida fiscal bem pior. Também
não se imagina que teremos uma situação internacional tão favorável quanto a
que experimentamos na primeira década do século.
A
nota positiva é que em 2023 provavelmente estaremos em uma posição cambial tão
desvalorizada —ou até um pouco mais— quanto em 2003.
Não é fácil responder ao desafio do leitor.
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