Folha de S. Paulo
Mesmo com inflação, presidente mantém votos
com agrados e despiora no emprego
A
correção da tabela do Imposto de Renda pode sair por medida provisória neste
mês. Também em abril, começa a liberação do FGTS para uns 40 milhões de
trabalhadores. Tem a antecipação do 13º do INSS. Acaba a cobrança de tarifa
extra na conta de luz.
São medidas que não ganham eleição —nem
perdem. É tudo "a vida como ela é", pequenos gestos, lembretes de que
"Bolsonaro vem
aí".
Em janeiro, começara a ser pago o vale-gás
para cerca de 5,5 milhões de famílias do Auxílio
Brasil. Em março começou o perdão de dívidas do Fies (financiamento de
faculdade), que pode beneficiar um milhão de jovens ou seus pais. A antecipação
do benefício do INSS não é dinheiro extra, mas alivia já a situação de
uns 30 milhões de pessoas.
No mês passado, houve o baita aumento dos combustíveis. A inflação chegou ao nível mais alto em quase 20 anos, também o surto mais duradouro de carestia desde 2002-2003. O prestígio de Bolsonaro não caiu mais por causa disso. A inflação pode ter sido contrabalançada também pela despiora do mercado de trabalho.
No que diz respeito a número de pessoas
ocupadas, formalização do emprego, desalento e insatisfação com horas
trabalhadas, voltou-se ao nível imediatamente anterior ao do início da
epidemia, em fevereiro de 2020. O poder de compra do salário médio caiu muito,
mas a oportunidade de ter algum trabalho e perspectiva parece em parte
compensar perdas.
Nas pesquisas de abril, Bolsonaro ficou na
mesma ou cresceu um tico em relação ao início do ano, mesmo no cenário em
que Sérgio
Moro (União Brasil) permanece na disputa. O problema de Bolsonaro é
que, sem Moro na parada, corre o risco de perder no primeiro turno.
Há muita campanha pela frente. Mas o
primeiro objetivo de Bolsonaro é garantir o segundo turno. Quaisquer dois ou
três pontos nas pesquisas são cruciais. O reajuste do piso dos professores de
educação básica foi vendido como ato do governo federal. Não é, mas talvez nem
importe: mais gente vai estar um pouco menos infeliz com a vida.
Finda a temporada de agrados, em maio,
junho, começa a trituração de Lula da Silva (PT).
Não vai vir apenas do bolsonarismo, ainda que STF e TSE tenham prometido cortar
asinhas de milícias digitais. Lula vai apanhar mais quanto menos acordos
políticos, econômicos e sociais fizer.
Não se trata dessa bobajada de
"jantares com a Faria Lima" (bloco que, aliás, inexiste), mas de
convencer não apenas os donos do dinheiro grosso (mas também eles) de que terá
um governo viável, o que Lula não vai conseguir em conversa mole com duas
dúzias de ricos. Precisa ainda agregar quadros e apoios de gente que está até
esperando um sinal, inclusive na elite atucanada. De resto, se "Faria
Lima" ganhasse eleições, o PSDB não teria perdido cinco delas de enfiada.
Em vez disso, Lula diz tolices política e
economicamente daninhas sobre gasto público ou demagogias sobre Petrobras
(idênticas às de Bolsonaro, afora na ameaça de fancaria de privatizar a
empresa). Com essas bobagens, um eventual governo seu naufraga ainda em 2023.
Lula parou de negociar mais e maiores
acordos depois da aliança com Geraldo
Alckmin —mantê-lo como vice decorativo não vai adiantar grande coisa.
Mais recentemente, tem soltado disparates eleitorais como chamar a militância
para dar prensa em deputado, discutir aborto de modo politicamente impensado ou
dizer que a classe média é "escravista".
No Brasil, essa acusação pode cair mal nos ouvidos de 40% da população, dos pobres remediados aos ricos que se chamam assim porque não são muito milionários. É justamente nesse eleitorado que Bolsonaro já empata com Lula.
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