O Globo
Mudanças de votos de ministros do STF
causam insegurança jurídica, financeira e econômica
As permanentes mudanças de posição de
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), tomando decisões que muitas vezes
alteram o resultado final do julgamento de um caso em que, anteriormente,
votaram ao contrário, traz à discussão os critérios para a escolha do futuro
ministro. Mais que insegurança jurídica, essa volubilidade dos ministros
provoca insegurança econômica e financeira.
O sistema de escolha pelo presidente da República pode ser contestado quando na decisão prevalecem critérios pessoais. A escolha de um ministro “terrivelmente evangélico” deveria ser o bastante para impugnar o ato, mesmo que o indicado tenha “notório saber jurídico”. Também a escolha de um ministro que atua como advogado pessoal do presidente da República, como é o caso de Cristiano Zanin, deveria invalidar a decisão, assim como, nos Estados Unidos, o então presidente George Bush tentou indicar sua advogada pessoal, Harriet Miers, e teve que recuar diante da reação negativa.
Escolher um candidato do mesmo espectro
político do presidente em exercício é normal nas democracias. Por isso,
decisões sobre questões que envolvem valores sociais só acontecem quando ocorre
de um presidente conseguir montar uma maioria consistente na Suprema Corte. Foi
o caso recente sobre o aborto nos Estados Unidos. Os republicanos estão com uma
maioria de três votos no plenário, e conseguiram, depois de 49 anos, mudar o
entendimento de que o aborto seja um direito constitucional da mulher.
No Brasil, no entanto, nos deparamos com
uma questão distinta. O comportamento do plenário do STF depende da
individualidade de seus ministros. O fenômeno faz com que decisões pessoais
mudem ao longo dos anos, de acordo com as circunstâncias. Agora, por exemplo, o
Supremo utilizou-se de um instrumento chamado “embargos de declaração”, que
normalmente não deve entrar no mérito das questões já decididas pelo plenário,
para fazer uma alteração significativa na legislação trabalhista. Três
ministros já votaram para considerar inconstitucional a proibição da
contribuição sindical obrigatória, permitindo a volta desse imposto.
O relator, ministro Luis Roberto Barroso,
foi além e argumentou que os trabalhadores não sindicalizados se beneficiariam
do trabalho dos sindicatos sem pagar, como se os sindicatos fossem o único
instrumento dos trabalhadores nas suas reivindicações. Torna ilegais aqueles
que não querem se sindicalizar. O ministro Gilmar Mendes chegou a pedir
desculpas aos que seguiram seu voto na primeira vez em que o tema foi abordado
no STF, e mudou de posição, passando a considerar constitucional a cobrança.
Na Reforma Trabalhista, o imposto sindical
foi abolido, e esse voto de agora abre caminho para reintroduzir uma
contribuição obrigatória, mesmo para os trabalhadores que não querem se filiar
aos sindicatos. Com a reforma, quem quer se filia ao sindicato e paga a
contribuição. Agora, seria preciso o trabalhador enfrentar a pressão
sindicalista e a burocracia para não pagar o imposto.
Essa mesma incoerência vem sendo verificada
em outros julgamentos. Os julgamentos no caso do ex-juíz Sérgio Moro são
exemplares desses movimentos individuais, que podem mudar com o tempo. A
ministra Cármen Lúcia, que já tinha defendido a atuação de Moro, mudou de voto
e foi decisiva para invalidar o processo do tríplex de Lula e na condenação de
Moro pela 2ª Turma como parcial.
Em 2016, no início da Lava Jato, o ministro
Gilmar era um crítico do governo e apoiou a tese da execução da prisão depois
da condenação em segunda instância. Mais tarde, mudou de posição, defendendo a
prisão só após o trânsito em julgado. Já o ministro Edson Fachin, principal
defensor da Operação Lava Jato na 2ª Turma, surpreendeu até os colegas de corte
ao anular as ações contra o ex-presidente Lula na 13ª Vara Federal de Curitiba,
considerando incompetente a jurisdição. Isso depois de mais de três anos em que
o defensor de Lula, Cristiano Zanin, insistia nessa tese, e foi derrotado
diversas vezes pelos mesmos ministros do Supremo.
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