O Globo
Por ordem do STF, ex-presidente prestará
primeiro depoimento sobre ataques de 8 de janeiro
Jair Bolsonaro tem novo encontro marcado
com a Polícia Federal. Vai depor na quarta-feira sobre os atos golpistas de 8
de janeiro.
O ex-presidente já deu versões bem
distintas para a intentona. Na noite após os ataques, disse condenar
“depredações e invasões de prédios públicos”. “A gente lamenta o que aconteceu
no dia 8, uma coisa inacreditável”, reforçou, na semana seguinte.
Depois da comoção inicial, ele mudou o tom e saiu em defesa dos extremistas. Acusou a PF de prender “chefes de família, senhoras, mães e avós”, que estariam sendo “tratadas como terroristas”. “No Brasil, tudo passou a ser fake news, atentado contra o Estado democrático de direito”, reclamou.
No mês passado, o capitão adotou mais um
discurso diferente. Em entrevista à rede americana NBC, esqueceu os aliados na
cadeia e descreveu os atos como uma “armadilha feita pela esquerda”. “Jamais o
nosso pessoal faria o que foi feito”, disse.
A conversa não tem base factual, mas foi
disseminada nas redes da extrema direita. Agora será amplificada por deputados
e senadores bolsonaristas numa CPI inventada para confundir, trocando os papéis
de vítimas e algozes.
Em tempos de pós-verdade, há quem julgue
ser possível culpar as árvores pelo incêndio na floresta. Mas as teorias
conspiratórias dificilmente convencerão os investigadores e o Supremo Tribunal
Federal. Nos últimos dias, a Corte formou maioria para mandar os primeiros cem
golpistas ao banco dos réus. Todos têm histórico longo e documentado de
militância a favor do ex-presidente.
O 8 de janeiro não surgiu como um raio em
céu azul. Foi o ápice de um longo processo de ataque à democracia. O movimento
era organizado e controlado a partir do Planalto. Tinha conexões nas polícias,
nos quartéis e em setores do empresariado.
Bolsonaro dedicou sete mandatos
parlamentares à defesa da ditadura. Ao se eleger presidente, tentou impor um
novo regime autoritário, que permitiria sua perpetuação no poder. Com cinco
meses de governo, o capitão e seus filhos já estimulavam manifestações
antidemocráticas. Os primeiros atos foram promovidos em maio de 2019. Pediam a
prisão do presidente da Câmara e a cassação de ministros do Supremo.
A marcha golpista se acelerou em 2020,
quando Bolsonaro discursou numa manifestação que defendia a volta do AI-5 em
frente ao QG do Exército. Depois viriam a guerra contra as vacinas e as ameaças
cada vez mais agressivas ao Judiciário, à oposição e à imprensa.
Ao pressentir que não seria reeleito, o
capitão voltou sua artilharia contra a urna eletrônica. Liderou uma campanha de
desinformação para vender a tese de que só perderia se houvesse fraude.
Derrotado no voto, trancou-se no palácio e passou a conspirar contra a posse do
sucessor. A articulação deixou rastros, como a minuta de golpe encontrada na
casa do ex-ministro Anderson Torres.
Enquanto Bolsonaro se fingia de morto, sua
tropa começou a agir. O badernaço após a diplomação de Lula e o plano de
explodir um caminhão-tanque no aeroporto de Brasília foram atos preparatórios
para o 8 de janeiro. Ao mandar a PF ouvir o ex-presidente, o ministro Alexandre
de Moraes anotou que é preciso responsabilizar os “autores intelectuais” do
ataque à democracia. E os investigadores já sabem que o golpe tinha chefe.
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