O Estado de S. Paulo
Como a evolução da classificação do risco Brasil, a mudança da Selic deverá ser modesta, bem modesta
Foi muito pequena, quase nada, a melhora da
nota do Brasil pela agência de classificação de risco Fitch anunciada na semana
passada. Mas, além de surpreendente, foi também significativa, pois a
classificação anterior persistia desde 2018. Em junho, embora sem aumentar a
pontuação, outra agência, a S&P Global Ratings, elevara de estável para
positiva a perspectiva de classificação do País.
Falta muito para o Brasil ser considerado
um lugar seguro e financeiramente recomendável, o que seria atestado com a obtenção
do grau de investimento, de que o País já desfrutou há alguns anos. Projeções
otimistas apontam que isso não ocorrerá antes de 2027.
Mas, como em outras áreas da economia e da política, a melhora da avaliação resulta de avanços, depois dos quatro anos desastrosos do governo anterior. São mudanças pequenas e um tanto escassas para nossas expectativas, o que recomenda comedimento. Ainda assim, motivos há para esperarmos que amanhã será melhor.
O próprio relatório da Fitch cita algumas
dessas evoluções. A despeito de “tensões políticas persistentes desde o
rebaixamento de 2018”, houve progresso “em importantes reformas para enfrentar
os desafios econômicos e fiscais”, avaliou a agência. Problemas existem,
observou a Fitch, como na área fiscal. Os resultados das contas do governo
central (Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central), por exemplo,
com déficit primário de R$ 45,2 bilhões em junho, mostram dificuldades para o
cumprimento da meta fiscal para o ano. Mesmo assim, a agência reviu sua projeção
de crescimento da economia brasileira neste ano, de 0,7% para 2,3%. Nisso, ela
acompanha analistas do setor privado.
O crescimento econômico é um dos muitos
itens em que a evolução é menos intensa do que a necessária para melhorar a
renda e a qualidade de vida dos brasileiros mais pobres.
O agronegócio vem puxando a expansão da
economia há anos e deve manter seu papel também em 2023, com a projeção de uma
safra recorde de 317,6 milhões de toneladas de grãos pela Companhia Nacional de
Abastecimento (Conab). Mas a indústria, que por décadas estimulou o crescimento
e a modernização da economia brasileira, continua a debater-se em problemas
como burocracia, tributos, falta de investimentos, atraso tecnológico e
obsolescência gradual das fábricas.
Num resumo expressivo da situação do parque
manufatureiro, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostrou amplo
predomínio de máquinas velhas. Das empresas que responderam a uma pesquisa da
entidade, apenas 2% disseram possuir equipamentos com menos de 2,5 anos de uso.
Como transformar esse parque para torná-lo capaz de alcançar outros países é o
desafio que o governo e dirigentes industriais conscientes se dizem dispostos a
enfrentar. Mas ainda não conseguiram encontrar um caminho para isso.
No campo do trabalho, há melhora constante
desde a normalização das atividades econômicas depois da pandemia. A taxa de
desemprego no trimestre móvel abril-junho ficou em 8,0%, a segunda mais baixa
desde o pico de 14,9% registrado no primeiro semestre de 2021. A menor taxa de
desemprego dos últimos dez anos, de 6,3%, foi registrada no fim de 2013.
Não se pode esquecer, porém, que ainda há
8,6 milhões de brasileiros que procuram mas não encontram ocupação. E o
contingente de desalentados – ou seja, pessoas com mais de 14 anos que, por não
encontrarem ocupação, deixaram de procurá-la – soma 3,7 milhões de brasileiros.
A taxa de informalidade, de 39,2% no segundo trimestre de 2023, mostra que esse
segmento continua grande e responde por boa parte da queda da taxa de
desocupação. Milhões de trabalhadores carecem de garantias trabalhistas e
previdenciárias. São números de um mercado de trabalho em evolução, mas ainda
perverso para milhões de concidadãos.
Dados mais animadores surgem na área dos
preços. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15), prévia da
inflação do mês, teve deflação em julho, o que confirma a tendência de
desaceleração de preços de bens e serviços. Em 12 meses até julho, a variação
acumulada do IPCA15 ficou em 3,19%. No acumulado até junho, estava em 3,40%.
Há tempos a alta dos preços vem perdendo
força. Em setembro do ano passado, a inflação acumulada em 12 meses estava em
7,17%, mais que o dobro da observada agora. Mas a taxa Selic não mudou desde
então. Naquele mês, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central a
elevou para 13,75%. E a mantém nesse nível desde então. É muito provável que ao
fim da reunião de dois dias que começa hoje o Copom decida pelo primeiro corte
da Selic em dez meses.
Também neste caso, porém, convém manter certa moderação. A redução não será proporcional à queda da inflação. Será pequena – moderada, como são as decisões do Banco Central. Como a evolução da classificação do risco Brasil, a mudança da Selic deverá ser modesta, bem modesta.
*JORNALISTA, É AUTOR, ENTRE OUTROS, DO LIVRO
‘O SÚDITO (BANZAI, MASSATERU!)’ (EDITORA TERCEIRO NOME) E PRESIDENTE DO CENTRO
DE ESTUDOS NIPO-BRASILEIROS (JINMONKEN
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