Valor Econômico
Dúvida sobre a reeleição tem permeado algumas
manifestações do presidente
Não bastasse a queda de popularidade e a
pressão de líderes do Centrão por mais cargos, o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva passou a dar sinais trocados aos aliados, para aflição de quem deseja
estar no palanque do petista em 2026. Ora decide substituir um ministro ora
recua. Ora empenha-se na reeleição, depois fala em voltar para casa ao fim do
mandato.
Foi nesse contexto que Lula deixou em sobressalto alguns aliados ao discursar em evento com o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) no município de Campo do Meio, em Minas Gerais, na sexta-feira (7). “Todo mundo sabe que quando eu terminar o meu mandato eu vou voltar para a minha casa”, disse o petista, surpreendendo parte dos presentes. “Não vou para Paris, não vou para Londres, não vou para os Estados Unidos”, completou, em crítica velada ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que voou para Miami sem transmitir a faixa para o sucessor.
Essa não foi uma declaração isolada. A dúvida
sobre a reeleição tem permeado algumas manifestações do presidente. No dia 20
de janeiro, na primeira reunião ministerial do ano, ele alertou os auxiliares,
em trecho não transmitido pelas redes sociais, que 2026 já começou. Mas
acrescentou que sua candidatura à reeleição dependerá de estar bem de saúde e
de o governo estar forte.
Menos de um mês depois, em entrevista para
uma rádio de Belém, voltou ao tema. “Se vou ser candidato ou não, tem uma
discussão com muitos partidos políticos, com a sociedade brasileira”, disse, em
14 de fevereiro. Elogiou o ex-presidente americano Joe Biden, que foi “ético”
ao desistir da reeleição. “Tenho 79 anos, tenho que ter consciência comigo
mesmo, não posso mentir para ninguém e muito menos para mim”, completou.
Ressalvou que concorrerá se tiver “100% de saúde”.
É nesse contexto que alguns auxiliares têm
observado, com redobrada atenção, gestos sutis do presidente, num momento em
que a fila no PT para sucedê-lo, caso ele não seja candidato, já exibe quatro
nomes, todos à frente de ministérios: Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa
(Casa Civil), Camilo Santana (Educação) e Gleisi Hoffmann (Relações
Institucionais).
Um aliado atento relatou à coluna um episódio
que lhe chamou a atenção. No voo para Santos (SP), no dia 27 de fevereiro, no
deslocamento para o evento onde lançaria o edital para construção do túnel que
ligará o município ao Guarujá, Lula provocou Rui Costa, reclamando que o
auxiliar “falava pouco”, cobrando que intensificasse as manifestações em
público. Horas depois, Costa discursou sobre a obra, fazendo uso do microfone
por mais tempo que o usual, segundo este aliado.
Na quarta-feira (12), saltou aos olhos a
manifestação de Lula sobre o ministro Fernando Haddad, que enfrenta uma
temporada de reveses no governo, agravada com a nomeação de Gleisi, com quem
trava embates sobre a política econômica, para um ministério no Palácio do
Planalto.
“Tenho a felicidade de ter o companheiro
Haddad como ministro da Fazenda”, exaltou o presidente, no lançamento do
programa de crédito consignado para trabalhadores. Na sequência, entretanto,
cutucou o auxiliar, cobrando uma melhor comunicação dele com o povo. “Um
companheiro, que nem sempre, é o mais feliz quando pega o microfone. Eu falo
pro Haddad: ‘Você tem que passar um pouco de charme’; eu falava pra Dilma: ‘Ô,
Dilma, deixa cair uma lágrima’”, prosseguiu.
Lula já confidenciou a aliados que um dos
problemas de Haddad, como seu possível sucessor, é que ele não teria “pele de
povo”. Um atributo que Lula enxergaria em Camilo Santana, por exemplo. Ao mesmo
tempo, a nomeação de Gleisi para uma pasta de mais visibilidade também foi
interpretada por alguns petistas como mais um quadro nacional a ser testado
para a sucessão.
Em meio às idas e voltas do mandatário, o
relato de aliados é de que ele estava com expressão de poucos amigos nos
últimos dias. Uma explicação seria a tensão com decisões que devem ser tomadas
na próxima semana porque ele embarca no sábado (22) para viagem internacional
que o afastará de Brasília uma semana inteira, a visita ao Japão e ao Vietnã.
Ele retornará à capital com o mês de abril
batendo à porta, perspectiva que lhe rouba o sono: ficou tarde para mais
mudanças no ministério? Por que nomear um ministro que ficará apenas um ano no
cargo, em virtude do prazo de desincompatibilização para quem disputará mandato
eletivo? De acordo com um auxiliar, Lula não quer fazer novas substituições
porque está convicto de que um ano é insuficiente para apresentar entregas, e o
novo ministro acabaria limitado às ações do antecessor.
Ainda circulam rumores de que Lula gostaria
de substituir os ministros Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário) e Márcio
Macêdo (Secretaria-Geral), ao mesmo tempo em que a bancada do PSD na Câmara dos
Deputados intensificou a cobrança pelo Ministério do Turismo, que está com o
União Brasil. O presidente estaria irritado com o zum-zum-zum, e inclinado a
encerrar a reforma do tamanho que ficou: com Sidônio Palmeira na Secretaria de
Comunicação Social (Secom), Alexandre Padilha na Saúde e Gleisi na articulação
política. Se não for essa a solução, terá de decidir antes de embarcar para
Tóquio. Mesmo assim, poderá ser tarde demais.
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