O Globo
Eixo ideológico mudou. Social-democracia das últimas três décadas deu lugar ao conservadorismo pragmático
A 14 meses do início do processo eleitoral de
2026, as placas tectônicas da política brasileira se movimentam de forma
silenciosa. O governo Lula,
sem tração no Parlamento e abatido por gargalos econômicos e perda de
credibilidade, corre contra o tempo para reverter a queda de popularidade. A
oposição encontra-se fragmentada, dispersa e ancorada à inelegibilidade
de Jair
Bolsonaro.
O sistema político brasileiro, após uma fase de grande inconstância e polarização sistemática, passa por um período de reajuste, marcado por novas bases de governabilidade, com poder menos assentado no Executivo e mais alicerçado no Parlamento.
O eixo ideológico também mudou. A
social-democracia das últimas três décadas deu lugar ao conservadorismo
pragmático, sob o domínio do consórcio de partidos de centro, que hoje comanda
o Congresso Nacional, as emendas parlamentares, grande parte dos fundos
partidário/eleitoral e sete em cada dez prefeituras do país.
As eleições municipais do ano passado
revelaram um país cansado do discurso radical. Nas capitais brasileiras, 85%
dos nomes vitoriosos orbitam no campo centrista. Não houve, de modo geral, a
reedição da polarização entre bolsonarismo e lulismo, expondo um eleitor de
perfil conservador, moderado e adepto da estabilidade, ante a alta taxa de
recondução dos prefeitos.
O centro conservador, no âmbito da política
local, se impôs como ponto de equilíbrio ante os extremos. Em vez do populismo,
a sociedade optou por nomes que unissem segurança, eficiência de gestão e
respeito aos valores. Essa volta à normalidade sugere uma nova configuração de
poder, com menor nível de radicalidade ideológica.
Bolsonaro e Lula continuam como fortes cabos
eleitorais para 2026, mas terão de lidar com o desgaste crescente de imagem e a
inexorável fadiga de material. Com a ascendência do centro conservador, o jogo
político brasileiro abre-se como poucas vezes na História recente.
Para isso, é imprescindível arejar o debate
de ideias. Até porque, para 2026, não é a anistia que pautará a agenda pública.
Não é a pauta identitária. Não são as ações tresloucadas de Maduro, Putin e
Trump. O que está em jogo são os problemas reais que afligem a população
brasileira.
É o dinheiro tungado dos aposentados; é o
alimento mais caro na mesa das famílias; é o celular roubado na esquina; é a
falta de vagas em creches; é a insegurança jurídica; é o peso do Estado sobre
os ombros do trabalhador; são as obras de infraestrutura que não saem do papel.
O eleitor não quer titubeio, não quer
aventuras. Quer soluções críveis para os problemas públicos: combate firme à
criminalidade, fomento ao empreendedorismo, educação de excelência, gestão
pública eficiente, emancipação social dos cidadãos, sem dependência eterna de
políticas assistencialistas, e crescimento sustentável, conciliando preservação
ambiental e reformas econômicas que incentivem a produtividade.
Trata-se de programa reformista, equidistante
de radicalismos, com visão humanista e inspirado em doutrinas partidárias
internacionais bem-sucedidas, como o PP da Espanha, o PSD
de Portugal,
o Partido Conservador britânico e a CDU da Alemanha.
Há um farol de oportunidade no horizonte da
política brasileira. Quem souber ocupar o centro conservador com sabedoria e
coragem — em busca do eleitor mediano para, com ele, construir compromissos
firmes em cima de uma agenda de mudanças unida a valores, e não mais de
polarização — poderá emergir como uma alternativa para o país.
*Murilo Medeiros, cientista político (UnB), é consultor político-eleitoral e especialista em Poder Legislativo
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