Terra das contradições, incoerências e paradoxos, o Brasil não poderia ter uma imprensa preocupada com este tipo de desarranjo. Razão por que nenhuma das grandes vozes da nossa mídia prestou atenção à tremenda confusão conceitual provocada por três decisões recentes.
Enquanto nossa suprema corte aprovou por unanimidade a realização de manifestações em favor da liberação da maconha, o governo e o Congresso vão na direção contrária favorecendo o sigilo, o segredo e, em última análise, a censura.
Nosso Judiciário acredita na intangibilidade da liberdade de expressão, o Executivo e o Legislativo favorecem o silêncio e a mordaça. A Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira uma Medida Provisória que permitirá ao governo manter secretos os orçamentos das obras para a Copa e as Olimpíadas. A ocultação tornará impossível o controle dos gastos e favorecerá a FIFA, a CBF, as fraudes, superfaturamentos e corrupção. Até mesmo o procurador-geral da República repudiou a trapaça, mas o governo alega que sem este sigilo as obras fatalmente atrasarão.
O caso da Lei de Acesso às Informações contém discrepâncias mais graves. O projeto foi apresentado com pompa e circunstância no fim do governo Lula, a sucessora recomendou a tramitação em regime de urgência, mas não contava com o ataque de dois caciques da base aliada, os ex-presidentes Sarney e Collor de Melo, que obviamente defenderam o sigilo eterno dos documentos na esfera da Defesa e Relações Exteriores.
A presidente então mandou retirar o chancela de urgência, o PT estrilou e em seguida Dilma Rousseff foi obrigada a ouvir o ex-presidente Lula pronunciar-se abertamente pelo fim do sigilo dos arquivos. “O povo tem mais é que saber”, afirmou Lula. Se Lula tem razão, Sarney e Collor não têm razão. Mas se a presidente Dilma está com Lula, está desautorando seu vice, Michel Temer, que ontem se declarou favorável à manutenção dos segredos do passado. Com tantos sinais conflitantes, a sociedade perde o rumo e a noção do que é certo ou errado.
A imprensa, através da ANJ, soube optar pelo fim dos segredos. Mas não está sabendo apontar os perigos de viver sem nexo, na beira de rupturas.
FONTE: OBSERVATÓRIA DA IMPRENSA
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