Cartilha do partido exagera e omite dados para exaltar mudanças no país
Gustavo Patu
BRASÍLIA - Cartilha comemorativa dos dez anos do PT no poder federal manipula números, datas e conceitos para forçar o contraste entre as políticas do partido e as dos "governos neoliberais" -o alvo óbvio, não citado pelo nome, é o ex-presidente tucano FHC.
Em meio a exageros, omissões e dados de procedência duvidosa, o documento de 15 páginas procura, mais do que enaltecer os resultados obtidos desde 2003, sustentar a tese de que o país passou por uma inédita reviravolta econômica e social.
Para isso, é preciso minimizar ou deixar de lado iniciativas anteriores que não se encaixam na descrição de um período de defesa do Estado mínimo e combate à distribuição de renda.
Também não se menciona que a política econômica combatida nos anos de oposição foi mantida, praticamente intacta, nos seis primeiros anos de governo.
Um exemplo do contorcionismo estatístico é a exaltação dos programas de "proteção e promoção social", que, segundo o texto, somam hoje 23% do Produto Interno Bruto -não se explica como o número foi calculado.
Nesse trecho, abandona-se a comparação com governos neoliberais (1990-2002) e cita-se apenas a cifra de 13,5% do PIB atribuída ao final da ditadura militar. Desapareceu, assim, a expansão do gasto social durante as administrações dos adversários.
Estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, ligado ao Planalto) estimou o gasto social federal em 16% do PIB em 2011. Sob FHC, essa despesa subiu de 11% para 13% do produto.
Um dos principais trunfos políticos petistas, a redução da pobreza também foi tratada na cartilha com números vagos, saltos temporais e retórica dramática.
"Mesmo com o avanço do regime democrático pós-1985, o país permaneceu prisioneiro do estado crônico de semi-estagnação econômica, capaz de acorrentar inacreditavelmente 45 brasileiros a cada 100 na condição de pobreza absoluta."
Nas estatísticas do Ipea, listadas entre as fontes do documento, a taxa de pobreza mais parecida com a mencionada são os 43% de 1993, no período hiperinflacionário.
Depois do Plano Real, o percentual caiu e se manteve em torno de 34%; no governo Lula, a queda foi acelerada e a taxa foi a 21% em 2009. Esses números, porém, não aparecem no folheto.
Em vez disso, o texto opta pelas previsões de que, até o final desta década, a miséria será erradicada e a desigualdade de renda atingirá "níveis civilizados".
Enquanto a primeira se baseia em estatísticas controversas, a segunda é pouco realista porque o Brasil ainda está entre os 12 países mais desiguais do mundo.
Fonte: Folha de S. Paulo
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