Com dólar valorizado, balança comercial terá refresco, mas crescimento da economia deve ser menor que este ano
Lucianne Carneiro
RIO - Um ano de crescimento baixo e inflação perto do teto da meta. Não, não se trata de 2013. Mas sim de 2014. Depois de o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) avançar apenas 2,3% este ano, como preveem a maioria dos analistas, no ano que vem a taxa deve ser ainda menor, perto de 2%. A inflação, que este ano deve ficar pouco acima de 5,7%, em 2014 pode ir a 6%. A avaliação é de que 2014 será de ajustes na economia, com a manutenção da taxa de juros elevada para conter a inflação. Ao mesmo tempo, um dólar mais valorizado deve ajudar a balança comercial e, em consequência, reduzir o déficit nas trocas do país com o exterior, a chamada conta corrente.
No horizonte, ainda paira algum risco do cenário chamado pelo ex-ministro Delfim Netto de “tempestade perfeita", que combinaria um aperto na política monetária americana com deterioração da situação fiscal do Brasil e redução da nota de crédito brasileira.
— O Brasil tem restrições de crescimento de duas ordens: de maneira mais imediata, há a inflação e um ciclo de taxa de juros que ainda está por concluir, a elevação do risco país e as incertezas nas políticas econômica e fiscal. Mas há também a restrição colocada pela falta de competitividade da indústria e um crescimento potencial do PIB menor do que há alguns anos — afirma o pesquisador do Instituto de Economia da UFRJ Caio Prates.
O Banco Central (BC) começou a elevar a taxa básica de juros Selic em abril, para conter as pressões inflacionárias, e hoje a Selic está em 10% ao ano. Os analistas preveem que os juros chegarão ao fim de 2014 em 10,5% ou 11%.
‘Precisamos de um freio para arrumar a casa’
Para o economista-chefe do Santander, Maurício Molan, o cenário de 2014 será afetado pela piora na percepção sobre a saúde fiscal e a limitação da capacidade de produção do país.
— A consequência disso é que precisamos de um freio para arrumar a casa e voltar a crescer de forma mais acelerada. É preciso reforçar a estrutura dos pilares, recuperar a credibilidade fiscal e ajustar a política monetária para reduzir a inflação. E isso vai significar um crescimento menor — diz Molan, que estima expansão de 1,7% do PIB no próximo ano.
O horizonte de 2014 vai depender então, segundo Caio Prates, da UFRJ, da capacidade de o governo reverter a desconfiança, principalmente em relação à política fiscal, e de controlar a inflação, que deve sofrer a pressão de um dólar mais apreciado:
— Um bom controle da inflação e bons sinais da política fiscal, mesmo tratando-se de ano eleitoral, podem permitir que se mantenha em 2014 uma taxa de crescimento da economia em 2,4%, que é a mesma que esperamos para 2013. Esses são os pressupostos para essa expansão.
Nos 12 meses até novembro, o setor público consolidado acumulou superávit fiscal primário (economia para pagamento dos juros da dívida pública) de 2,17% do PIB. O resultado, no entanto, teve forte influência de receitas extras, como o programa de parcelamentos de dívidas tributárias (Refis) e o leilão de concessão de Libra. Para 2014, as estimativas são de um esforço fiscal menor. A projeção do Ibre/FGV é de 1% do PIB, considerando o superávit efetivo, ou seja, sem descontos ou ajustes.
‘Ventos internacionais’ mais favoráveis
O principal trunfo para a economia em 2014, segundo o pesquisador do Instituto de Economia da UFRJ, virá dos investimentos em infraestrutura, e isso não apenas por causa das novas privatizações.
No cenário projetado pela economista Silvia Matos, coordenadora técnica do Boletim Macro Ibre, da Fundação Getulio Vargas (FGV) todos os setores da economia devem mostrar desaceleração em 2014.
— Pela ótica da demanda, temos desaceleração de todos os componentes, com destaque para um consumo das famílias crescendo menos. E o investimento ainda terá expansão, mas aquém do valor de 2013.
O risco de uma “tempestade perfeita” existe, admite Caio Prates, mas depende da situação fiscal. Com uma melhoria nessa área, é possível evitar o pior cenário:
— Se o governo insistir com estímulos fiscais, vai colher alta do risco Brasil e menos crescimento. É uma situação paradoxal, em que estímulos fiscais vão significar menos crescimento.
Mas há quem veja um excesso de pessimismo nas projeções para 2014, como o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges. Para ele, a economia brasileira vai manter seu ritmo de crescimento em 2014, com uma expansão de 2,5%. A melhoria no cenário da economia internacional, que deve puxar as exportações, é a principal justificativa para tal previsão.
— Os ventos da economia internacional, que foram contrários nos últimos três anos, devem voltar a ser favoráveis. Os efeitos prejudiciais do fim dos estímulos dos EUA já estão ocorrendo e o Brasil já está sofrendo o impacto de uma possível mudança no rating — diz Borges.
Em 6 de junho, a agência de classificação de risco Standard &Poor’s (S&P) colocou a nota do crédito do Brasil em perspectiva negativa, o que é o primeiro passo para um corte.
O cenário traçado por analistas inclui um crescimento maior da economia mundial, embora em ritmo moderado — pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), a expansão global deve acelerar de 2,9% em 2013 para 3,6% em 2014 — e a continuidade da apreciação do dólar. O Boletim Focus estima que a taxa de câmbio deve encerrar 2014 em R$ 2,45. A combinação deve significar um saldo maior na balança comercial, de US$ 7,85 bilhões, embora ainda em patamar baixo, e um déficit ligeiramente menor em transações correntes, de US$ 71,30 bilhões.
— O câmbio mais valorizado deve ajudar a segurar um pouco o déficit em transações correntes e ajustar as importações. Ao mesmo tempo, o Brasil pode conseguir exportar um pouco mais, mas o cenário é desafiador, porque a competição está grande entre os produtos manufaturados — defende Silvia Matos.
Sua avaliação é de que haverá alguma melhora no déficit em transações correntes em 2014, mas um ajuste mais forte só é esperado para 2015. A projeção do Ibre é de déficit em transações correntes de US$ 74 bilhões em 2014, ou 3,4% do PIB.
Fonte: O Globo
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