A candidatura do senador do PSDB mineiro agora é irreversível. Economistas preveem que, se ela se mostrar competitiva, a euforia com o Brasil voltará aos mercados e animará os investidores
Marcelo Sakate e Adriano Ceolin
Para consolidar sua candidatura à Presidência da República, o senador mineiro Aécio Neves tinha de enfrentar um obstáculo e um desafio antes de 2013 acabar – o obstáculo já não existe mais. Na segunda-feira, o também tucano José Serra anunciou em sua página no Facebook que abria mão de entrar na disputa, uma vez que "a maioria dos dirigentes do partido acha conveniente formalizar quanto antes o nome de Aécio Neves". A frase encerrava dois anos de conflitos no PSDB, durante os quais o "grupo de Serra" tentou emplacar o nome do ex-governador de São Paulo como alternativa ao do mineiro. No dia seguinte ao da postagem de Serra, Aécio apresentou sua agenda de campanha em Brasília: uma carta de intenções com os marcos prioritários de seu eventual governo. A carta foi o primeiro passo para que o agora candidato oficial do PSDB enfrente o desafio que tem pela frente: conquistar a adesão dos mercados e se mostrar a opção mais segura para recuperar a confiança dos investidores na economia.
No texto, o ex-governador de Minas lembrou que o Brasil atravessa uma crise de credibilidade – consequência do ambiente de incertezas criado pelos vaivéns na política econômica e das interferências do governo em setores produtivos. Diz o documento: "Numa combinação perversa, a inflação está alta, o crescimento é baixo e o déficit das contas externas, ascendente". O ano de 2013 será o terceiro seguido de crescimento pífio do PIB, abaixo da média mundial. A inflação fechará, pelo quarto ano consecutivo, acima da meta de 4,5%. O desemprego permanece baixo, mas houve uma queda na criação de vagas e os salários sobem em ritmo menor. Se a agenda de Aécio não aponta medidas específicas para animar a economia, faz um diagnóstico cristalino de suas deficiências: a falta de competitividade. o peso dos impostos e a produtividade estagnada.
A carta de Aécio contou com a chancela do ex-presidente do Banco Central e economista-chefe da campanha, Armínio Fraga, para quem um eventual governo Aécio seria "mais capaz do que qualquer outro de mobilizar capital, num momento em que o país precisa investir mais e melhor". O economista acredita que uma política econômica mais transparente e previsível, por. si só, já seria capaz de reverter o desalento entre os investidores. Para ele, a queda nos prêmios de risco embutidos hoje nos juros, por exemplo, seria uma correção de rota de impacto positivo imediato. Os ajustes deveriam partir de um compromisso sólido com a execução dos fundamentos macroeconômicos: superávit fiscal sem artifícios e cumprimento rigoroso das metas de inflação.
Analistas concordam que a defesa desses princípios por um candidato com forte chance de decolar pode ter o condão de mudar os humores do mercado. "Se alguém com chance concreta de vitória sinalizar que adotará medidas como uma política fiscal equilibrada, com prioridade para o combate à inflação e o fim da intervenção no setor privado, haverá uma melhora imediata no mercado financeiro", diz Tony Volpon, chefe de pesquisa para mercados emergentes das Américas do banco Nomura. Aécio aposta que, por causa da situação da economia, a eleição será marcada pelo desejo de mudança – como, de resto, já deixaram claras as pesquisas.
No último levantamento do Instituto Datafolha, diante da pergunta "você prefere que as ações do próximo presidente sejam iguais ou diferentes das tomadas por Dilma Rousseff?", 66% das pessoas ficaram com a segunda opção. A tendência à ruptura faz com que as eleições de agora se aproximem mais das de 2002, quando Lula derrotou Serra em um quadro de desgaste do PSDB, do que das eleições de 2010, quando a tendência do eleitorado era claramente de continuidade do governo do PT. Dilma, porém, continua liderando as pesquisas, com 47% das intenções de voto, contra 19% de Aécio e 11% de Eduardo Campos (PSB). O que explica o fato de a presidente despontar na dianteira na mesma pesquisa em que eleitores sinalizam querer que o futuro governo adote ações diferentes das do seu? Responde o cientista político Rubens Figueiredo: "Muitos eleitores querem mudar, mas não sabem quem representa essa mudança".
Hoje, só metade dos brasileiros sabe quem é Aécio Neves. Como candidato, ele dará início às viagens pelo Brasil em fevereiro. Mesmo assim, acredita que apenas depois da Copa do Mundo as eleições para presidente vão atrair a atenção da população e será possível dar um salto que lhe garanta um lugar no segundo turno. Cita o exemplo de 2010. A um ano do pleito, Serra liderava com cerca de 40% das intenções de voto, Dilma tinha metade disso e Marina Silva patinava com 5%. Abertas as urnas, Dilma teve 47%, contra 33% de Serra e 19% de Marina. A moral da história, diz o senador, é que não dá para tomar como definitivos os números das pesquisas a um ano das eleições.
Ao adotar o discurso da mudança "de verdade", Aécio pretende não apenas se contrapor a Dilma, mas salientar suas diferenças em relação a Eduardo Campos (PE). O candidato do PSB, aliado do PT desde o início do governo Lula, só rompeu com o partido neste ano, ao lançar sua candidatura. Na semana passada, Campos dividiu um palanque com Dilma pela primeira vez após o rompimento. Quem esperava um confronto se decepcionou. O tom do pessebista foi de conciliação.
Mesmo na oposição, é difícil brigar com um governo com marcas populares como o Bolsa Família e o Mais Médicos. A dificuldade em modular esse discurso foi um dos motivos que levaram Aécio e seu marqueteiro, Renato Pereira, a romper na semana passada. O candidato não aceitou as críticas de que deveria se preocupar mais em se aproximar do eleitorado com propostas "pés no chão" e deixar em segundo plano as críticas ao governo e o discurso para o empresariado. Aécio termina 2013 livre do seu maior obstáculo, apoiado por seu partido e munido de bons princípios. A reação dos mercados a essa decolagem será o primeiro sinal de quão alto ele pode ir.
Fonte: Revista Veja
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