- Folha de S. Paulo
Estranhei a decisão do ministro Ricardo Lewandowski de devolver ao MP a delação premiada do marqueteiro Renato Pereira, de cujos termos ele discordava.
O primeiro problema diz respeito à segurança jurídica. O plenário do Supremo já enfrentara a matéria em junho e concluíra, por 8 votos contra 3, que o poder do juiz de interferir no mérito do acordo entre MP e acusado é limitado. Só caberia revisão na hipótese de inefetividade da colaboração ou da violação de seus termos.
É verdade que, na ocasião, Lewandowski discordou da maioria. Apresentou seus argumentos, que eram ponderáveis. Mas é da natureza mesma do princípio da colegialidade que aqueles que tenham sido voto vencido numa questão se resignem e passem a aplicar a decisão coletiva nos próximos casos, ou não haveria segurança jurídica. Não dá para cada um dos 11 ministros operar como se fosse uma corte suprema independente.
O segundo problema é mais complexo. Vai no âmago das delações premiadas. Se queremos fazer bom uso desse instituto, é preciso que o Estado tenha palavra. Não dá para o poder público, na figura do procurador, combinar algo com o acusado que será em seguida desfeito pelo mesmo poder público, mas na "persona" do juiz ou de outros órgãos do Estado, como CGU, Receita, BC.
Se o objetivo é institucionalizar a ferramenta da colaboração, teremos não apenas de "unificar" o Estado como também de ampliar a autonomia do MP para as negociações.
Sei que os EUA não são exatamente um exemplo de Judiciário a imitar, mas ali o sistema só é viável porque os promotores acertam quase tudo, inclusive o tamanho da pena, diretamente com os réus, de modo que algo entre 90% e 95% dos casos nem sequer passa por um juiz.
Não sei se essa é a solução ideal, mas o que não dá é para ficar no vai não vai em que o destino de uma delação é dado pelo sorteio do relator e não pela jurisprudência da corte.
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