- O Estado de S. Paulo
É possível que nunca na história econômica do Brasil o curto prazo tenha tido tanta importância para definir o destino do País como agora.
O Brasil passa, possivelmente, por sua mais grave crise fiscal, que vai se agravar com o envelhecimento da população e suas consequências sobre as despesas previdenciárias. A demografia também reduzirá o potencial de crescimento do País, o que exige reformas para impulsionar os ganhos de produtividade, praticamente estagnados desde a década de 1980. Não há espaço para um governo medíocre em 2019.
Os investidores têm dado o benefício da dúvida ao governo e poderão fazer o mesmo com os candidatos à presidência, pois há o reconhecimento de que a reforma da Previdência está na agenda política do País, devendo ser aprovada pelo próximo presidente. Está cada vez mais claro que se trata de política de Estado e não de governo.
O problema é se a reforma não for ambiciosa o suficiente. O alicerce da atual estabilidade macroeconômica está na confiança de que o País conseguirá estabilizar sua dívida pública como proporção do PIB. Se a confiança se for, as consequências poderão ser sérias a ponto de afetar a capacidade do próximo presidente de governar.
O desafio não para por aí. O bônus demográfico (aumento do diferencial entre pessoas em idade ativa e a soma de crianças e idosos), que contribuiu para o crescimento do País desde meados da década de 70, vai se esgotar nos próximos cinco anos. Sem ganhos de produtividade, o aumento do PIB per capita ficará comprometido. A agenda de promoção da produtividade não é simples e enfrenta resistências, como na reforma tributária.
Por tudo isso, os candidatos a presidente estarão sob escrutínio, o que poderá contaminar o ambiente econômico em 2018. Em uma eleição que promete ser disputada e bastante incerta até as vésperas do primeiro turno, é natural uma postura cautelosa dos agentes econômicos. Algumas decisões de contratação de mão de obra e de investimento poderão ser adiadas, bem como a concessão de crédito pelos bancos, especialmente em meio à elevada incerteza jurídica no País que compromete severamente a capacidade de recuperação de ativos.
Apesar disso, 2018 poderá surpreender positivamente. O País vem ganhando maturidade e o governo implementou importantes ajustes na política econômica. Tanto na chamada agenda microeconômica, com medidas que visam a eliminar distorções do sistema econômico e brechas para irresponsabilidade fiscal, como nas reformas estruturais, como a regra do teto, a reforma trabalhista e a criação da TLP.
Nossa história ensina que todas as vezes que seguimos os manuais, perseguindo políticas responsáveis e racionais, a economia reage bem e de forma surpreendente. Foi assim em 2017, com a expressiva queda da inflação e da taxa de juros pelo Banco Central, com impacto na confiança dos consumidores e dos empresários e, portanto, no mercado de trabalho, que iniciou a recuperação antes do esperado.
2018 será o ano de colher a recuperação da economia já iniciada. Empresários e consumidores estarão mais otimistas. Isso porque o corte da Selic tem impacto na atividade econômica com defasagens, sendo que o auge do efeito se dá depois de um ano. A volta da economia está, portanto, contratada. Estimamos 3% de crescimento do PIB, já contando com algum ruído eleitoral. Surpresas positivas não podem ser descartadas.
Importante lembrar que não será possível recuperar rapidamente o desastre dos últimos anos. A crise afetou as condições financeiras de empresas e indivíduos, e sua superação leva tempo. Além disso, o desequilíbrio das contas públicas limita a recuperação. Não apenas pela impossibilidade de usar a expansão fiscal como instrumento anticíclico, mas também porque o risco fiscal é a espada de Dâmocles que ameaça investimentos de longo prazo. Como investir num país em que não se sabe qual vai ser o ambiente econômico no futuro, bem como a carga tributária?
O ambiente externo é elemento de sorte. A economia e o comércio mundial ganham tração, e há razões para acreditar que se trata de um movimento com fôlego. Riscos inflacionários no mundo não são para já e, portanto, para o próximo ano não haveria aperto monetário nas economias avançadas, mas apenas elevação moderada dos juros internacionais. Esse quadro, aliado à baixa volatilidade da moeda americana, fruto do crescimento mais sincronizado dos países em relação ao passado, ajuda a manter a inflação baixa no Brasil e algum interesse dos estrangeiros.
A gestão mais responsável da política econômica e a escassez de recursos reforçam o quadro de inflação baixa, enquanto a elevada ociosidade da economia ajuda a conter correções salariais e de preços. Os riscos inflacionários em 2018 são baixos, o que torna pouco provável a elevação da taxa de juros pelo Banco Central.
O ruído eleitoral poderá ser mais contido do que se imagina e com impacto limitado na economia, pelos fatores econômicos discutidos acima, e também porque há boas chances de a campanha, apesar de agressiva nos ataques pessoais, ser responsável na discussão da agenda econômica. Não há apelo para discursos populistas, ao menos dos candidatos competitivos. Eles terão de pensar no dia seguinte. Como governar se não tiverem discurso responsável na campanha? A campanha de 2014 deixou lições. E a própria sociedade parece mais consciente das dificuldades fiscais.
2018 será provavelmente um bom ano. Um cenário de elevada incerteza eleitoral poderá reduzir o potencial de recuperação, mas não a ponto de abortá-la, sendo que a falha do governo em entregar a reforma da Previdência, que seria seu principal legado, poderá cobrar seu preço.
Na agenda econômica, não será um ano de paralisia. Reformas importantes poderão ser aprovadas no Congresso, como cadastro positivo, recuperação judicial, regulamentação do distrato, medidas da agenda BC+, reformulação do Fies, medidas tributárias, marco regulatório do setor de energia, entre outras.
O ano da verdade será, na realidade, 2019, e não 2018. Assim como foi 2015, quando a confiança se foi ao se constatar que o governo não tinha agenda de ajuste fiscal. A crise fiscal exigirá uma agenda sólida e ambiciosa de reformas. A lua de mel do próximo presidente será curta.
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*É economista-chefe da XP Investimentos
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