- Folha de S. Paulo
Nascemos prontos a ser enganados e nosso mecanismo de defesa é o ceticismo
O Homo sapiens é uma espécie naturalmente crédula. A própria linguagem nos predispõe a assumir como verdadeiro aquilo que nos é contado. E faz sentido que seja assim. Línguas naturais só se desenvolveram porque nossos ancestrais recebiam de seus interlocutores mais informações verdadeiras do que falsas.
Se fosse o contrário, não haveria um substrato estável o bastante para que idiomas se fixassem como uma ferramenta útil e fossem preservados pela evolução.
Esse viés de verdade embutido em nossas mentes dá aos mentirosos uma vantagem. Já nascemos prontos a ser enganados. O restante da história da humanidade pode ser descrito como uma corrida armamentista entre técnicas de ludibriar melhor os outros e modos para tentar identificar os aproveitadores.
Nosso principal mecanismo de defesa contra políticos malandros é o ceticismo, a capacidade que temos de pôr em dúvida e testar o que nos é apresentado como certo. Quando exercido com método, ele é poderoso, como se pode constatar pelo sucesso da ciência, que tem como ponto de partida o questionamento das explicações tradicionais.
O problema com o ceticismo é que ele não é muito natural em nós. Exercê-lo é cognitivamente custoso e pode ser socialmente danoso. O sujeito que duvida de tudo não será a pessoa mais popular da aldeia.
A outra ferramenta, com um pedigree menos vistoso, é a fofoca. Se alguém mente para nós repetidas vezes, começamos não só a desconfiar desse indivíduo como também a espalhar que ele é um embusteiro, o que pode custar-lhe a reputação.
A fofoca funcionava bem razoavelmente em grupos pequenos onde todos se conheciam. Mas, agora que vivemos em comunidades virtuais de milhões de indivíduos que se comunicam instantaneamente em rede, ela adquire um caráter bem mais selvagem, dando origem a muitas das fake news.
Ainda vai levar um tempo até que aprendamos a lidar com isso.
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