- Valor Econômico
Atribuições parecem ferir a autonomia dos Estados
Uma das grandes novidades da Proposta de Emenda Constitucional 188/2019, também conhecida como PEC do Pacto Federativo, é a criação do Conselho Fiscal da República, que será integrado pelos presidentes dos três Poderes, do presidente do Tribunal de Contas da União, de três governadores e três prefeitos. As atribuições dadas ao conselho, no entanto, parecem ferir a autonomia de Estados, municípios e dos Poderes da República.
A PEC diz que o conselho será “o órgão superior de coordenação da política fiscal” e terá por objetivo “a preservação da sustentabilidade financeira da federação”. Em seguida, diz que compete ao conselho, entre outras atribuições, “monitorar regularmente os orçamentos federais, estaduais e distrital, inclusive quanto à respectiva execução”.
Para monitorar a execução orçamentária de 26 Estados, do Distrito Federal e da própria União, será necessário, evidentemente, criar uma formidável estrutura técnica destinada a fornecer informações e análises aos membros do conselho, cada um deles já ocupado com as atribuições próprias de seus respectivos cargos. A primeira disputa ocorreria na definição da composição do quadro técnico.
O cerne da questão, no entanto, está relacionado à autonomia que a Constituição concede aos Estados e ao Distrito Federal. Com a aprovação da PEC, os governadores passarão a ser “monitorados” regularmente por um conselho, que estará acima das respectivas Assembleias Legislativas e dos tribunais de contas, a quem compete atualmente a responsabilidade de acompanhar e fiscalizar a execução orçamentária das administrações estaduais e distrital.
Os três Poderes da República também têm autonomia para elaborar e executar os seus respectivos orçamentos. Com a aprovação da PEC, eles passarão a ser “monitorados” regularmente pelo conselho, inclusive quanto à respectiva execução orçamentária anual.
A PEC atribui também ao conselho o poder de “verificar o cumprimento das exigências constitucionais e legais referentes à disciplina orçamentária e fiscal”. Os membros do conselho teriam que verificar se um governador está cumprindo as exigências constitucionais e legais, ao gerir os recursos do Estado. De novo, esta atribuição parece invadir a esfera de competência das Assembleias Legislativas e dos tribunais de contas estaduais e do próprio Congresso Nacional, no que toca à União.
O dispositivo parece invadir também a competência do próprio Supremo Tribunal Federal, a quem cabe verificar se o ato administrativo de um determinado governador está ou não cumprindo exigências constitucionais. Uma decisão do conselho, que terá a participação do presidente do STF, impedirá um recurso do governador que se sentir prejudicado ao Supremo?
Uma outra atribuição do conselho é “expedir recomendações, fixar diretrizes e difundir boas práticas para o setor público”. Aqui, a competência que parece estar sendo invadida é a do Congresso, a quem cabe aprovar regras para o setor público, como fez, por exemplo, ao aprovar a lei complementar 101/2000, mais conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
É bom que se diga que a LRF prevê a criação de um Conselho de Gestão Fiscal, que teria a atribuição de acompanhar e avaliar a política e a operacionalidade da gestão fiscal. Este conselho teria representantes de todos os Poderes e esferas de governo, do Ministério Público e de entidades técnicas representativas da sociedade.
O conselho previsto na LRF visaria harmonizar as interpretações sobre as regras fiscais e adotar normas de consolidação de contas públicas. Foram justamente as interpretações divergentes adotadas pelos tribunais de contas estaduais que abriram caminho, em grande medida, para a situação de descalabro financeiro em que se encontram vários Estados. Menos ambicioso do que o Conselho Fiscal da República, o conselho previsto na LRF nunca foi criado ou regulamentado.
A PEC e o emprego
Se as regras da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 186/2019, também conhecida como PEC Emergencial, estivessem em vigor, o presidente Jair Bolsonaro não poderia ter editado a Medida Provisória 905/2019, que institui o Programa Verde Amarelo. O programa prevê uma nova modalidade de benefício tributário, que a PEC proíbe pelo prazo de dois anos.
O texto da PEC Emergencial, apresentado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, proíbe a concessão ou a ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária quando a chamada “regra de ouro” das finanças públicas não estiver sendo cumprida. A regra determina que o endividamento da União só pode aumentar para custear despesas de capital (investimentos e amortizações da dívida).
Esta é a situação em que se encontram as finanças da União desde o ano passado, quando o governo foi obrigado a pedir autorização ao Congresso Nacional para realizar operações de créditos destinadas a cobrir gastos correntes, principalmente benefícios previdenciários. Assim, aprovada a PEC 186, o governo poderá acionar, de imediato, as medidas de ajuste fiscal.
A PEC 188/2019, também apresentada por Guedes, vai mais longe. Determina que, a partir de 2026, ficarão proibidas a criação, a ampliação ou a renovação de benefício ou incentivo de natureza tributária pela União se o montante anual correspondente aos benefícios ou incentivos de natureza tributária superar dois pontos percentuais do Produto Interno Bruto (PIB). Atualmente, eles superam 4% do PIB.
A MP 905/2019, editada por Bolsonaro na segunda-feira passada, concede benefícios tributários aos empregadores, que contratem, principalmente, jovens de 18 a 29 anos que buscam o primeiro emprego. Eles não precisarão pagar os 20% sobre a folha de pagamento de contribuição patronal ao INSS nem as alíquotas do Sistema S e do salário-educação, entre outras vantagens. O custo desta nova modalidade de benefício é estimado em R$ 10 bilhões em cinco anos.
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