quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Vinicius Torres Freire – A eficácia das vacinas chinesas

- Folha de S. Paulo

Irmã da Coronavac, a vacina do Doria, tem 79% de eficácia, mas falta informação

Uma das vacinas da estatal chinesa Sinopharm teria 79,34% de eficácia, segundo afirmou a empresa nesta quarta-feira (30) em uma nota de escassas e frustrantes vinte linhas. O produto é irmão da Coronavac, comprada pelo governo paulista e que já está sendo produzida pelo Instituto Butantan.

As vacinas são muito semelhantes; é possível esperar resultado similar da Coronavac, em uma especulação esperançosa, mas razoável, dizem dois imunologistas brasileiros ouvidos por este jornalista. As duas irmãs chinesas são feitas da mesma maneira, com vírus inativados.

O vírus é multiplicado em uma cultura de células, na mesma linhagem de células originadas do rim do macaco-verde africano e usadas faz quase 60 anos em pesquisa biotecnológica. O vírus depois é inativado (perde o poder de se replicar e causar doença) com a mesma substância, beta-propriolactona, mas mantém sua estrutura e, assim, ainda pode suscitar uma reação do sistema de defesa (imunológico). Os vírus inativados são misturados ao mesmo tipo de adjuvante, algum composto de alumínio, que facilita a ação da vacina. A diferença entre as duas pode ser a dosagem e o tempo entre as duas injeções necessárias.

Estudos sobre as fases 1 e 2 dessas duas chinesas foram publicados em duas revistas científicas de peso (“Jama” e “The Lancet”), mas nada que preste saiu sobre a fase 3.

Os Emirados Árabes Unidos disseram que seu teste fase 3 da Sinopharm deu 86% de eficácia. Aprovaram a vacina e começaram a aplicá-la no povo, assim como o Bahrain. Mas apenas nesta quarta-feira a Sinopharm pediu a aprovação da Anvisa deles, embora a China já tenha aplicado o imunizante em centenas de milhares de pessoas sob alto risco de infecção.

A Turquia abriu resultados preliminares e precários da fase 3 da Coronavac, que teria tido por lá eficácia de 91,75%. No Brasil, como soubemos pelo anúncio do governo paulista, a eficácia teria sido de mais de 50% e menos de 90%, uma distância amazônica. Por “eficácia” entenda-se por ora a capacidade de evitar doença sintomática. Não sabemos ainda se qualquer vacina para Covid-19 impede que um vacinado e doente assintomático transmita a doença.

A vacina americana da Moderna tem 94% de eficácia; a anglo-turco-alemã da Pfizer/BioNTech, 95%. São imunizantes feitos com tecnologia inédita. As chinesas usam técnicas testadas com sucesso faz pelo menos 70 anos, como na vacina da pólio, por exemplo.

Apesar de fabricadas da mesma maneira, faltam informações básicas sobre as duas chinesas. Por que os dados de eficácia da Coronavac e da vacina da Sinopharm são diferentes em cada país? Pode ser por causa do número de pessoas que participaram do teste, do tamanho da epidemia em cada país, do período de observação (duração) do experimento. Não sabemos.

Como os dados sobre a Coronavac e do produto da Sinopharm devem ser publicados em revistas científicas, não é razoável esperar mutreta no estudo técnico ou que os dados divulgados agora tenham sido turbinados. Mas vimos como foram bagunçados os dados da vacina da AstraZeneca/ Oxford. É o produto comprado pelo governo federal e aprovado também nesta quarta-feira pelo governo britânico, o que é bom sinal, embora até agora não saibamos também da eficácia precisa desse imunizante.

Isso quer dizer que as vacinas são ruins? Não. Quer dizer que ainda não temos os resultados finais. Quando tivermos os dados e as injeções, ainda teremos de enfrentar o governo e os generais da morte.

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