Correio Braziliense
Deputados
do Centrão dominam a Câmara e não estão preocupados com a opinião pública,
porque suas bases eleitorais são fidelizadas graças às verbas do Orçamento
O texto base da reforma administrativa,
aprovada pela comissão especial da Câmara, ontem, desagrada tanto aos setores
liberais que defendem a modernização do Estado brasileiro quanto aos seus
opositores de esquerda, porque não tem coerência e mantém privilégios. Para os
especialistas, também desconstrói pilares importantes da meritocracia,
princípio que deve nortear o serviço público. O texto foi resultado de
negociações de bastidor conduzidas pelo relator, deputado Arthur Maia (DEM-BA),
com apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que tratorou os
servidores e a oposição.
Desde setembro do ano passado, a reforma administrativa estava encalhada na Câmara. Seu objetivo é alterar as regras para os futuros servidores dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União, estados e municípios. Ainda há muitos destaques a serem votados na própria comissão. Somente após a conclusão dessas votações, a proposta será encaminhada ao plenário, onde precisará ter pelo menos 308 votos a favor, em dois turnos de votações.
A oposição havia obstruído a votação na
quarta-feira, mas, ontem, pela manhã, o presidente da Câmara trabalhou
pessoalmente para garantir o quórum, cobrando lealdade de seus aliados. Mais
uma vez, a proposta deixa de fora o Judiciário e o Ministério Público. Entre as
medidas aprovadas estão a terceirização de atividades do governo cessão de
dependências públicas e servidores para empresas concessionárias; ampliação do
prazo de contratação de não-concursados para 10 anos; transformação de oficiais
de Justiça em carreira de Estado; a aposentadoria integral e pensão por morte
em serviço para policiais legislativos, distritais, rodoviários federais e
ferroviários federais e agentes penitenciários e socioeducativos; redução de
jornada e salário de servidores em até 25%.
Passam a ser consideradas carreiras
exclusivas de Estado, nas quais é proibida a contratação temporária, aquelas
ligadas à manutenção da ordem tributária e financeira, à regulação, à
fiscalização, à gestão governamental, à elaboração orçamentária, à inteligência
de Estado, ao controle, à advocacia pública, à defensoria pública, bem como à
atuação institucional do Ministério Público e dos Poderes Legislativo e
Judiciário. As mudanças valem apenas para os novos servidores, para os quais
não haverá férias superiores a 30 dias por ano; progressão automática e adicionais
por tempo de serviço; aumentos ou indenizações com efeitos retroativos;
aposentadoria compulsória como forma de punição. Houve forte reação das
associações de servidores, que já pressionam os parlamentares para evitar que o
texto seja aprovado como está em plenário.
Péssima imagem
O modus operandi da Câmara tem desgastado o
Congresso. Pesquisa do Datafolha, divulgada ontem, mostra que a imagem do
Legislativo está mais negativa: para 44% dos brasileiros, o trabalho de
deputados federais e senadores é ruim ou péssimo. Realizada entre 13 a 15 de
setembro, a pesquisa ouviu 3.667 pessoas com mais de 16 anos em 190 cidades. Em
julho, desaprovavam os congressistas 38%. Naquela rodada, somente 14% achavam o
trabalho no Congresso bom ou ótimo, índice que oscilou negativamente para 13%.
Consideram o trabalho regular 40%, ante 43% há dois meses. Não souberam opinar
3%.
Há outras insatisfações com o Congresso. O
Datafolha mostrou que 56% dos brasileiros desejam a abertura de um processo de
impeachment contra Bolsonaro, ato que é privativo do presidente da Câmara. A
reprovação ao trabalho parlamentar é maior entre aqueles mais instruídos (53%
para quem tem curso superior) e mais ricos (57% entre os que ganham mais de 10
salários mínimos). O trabalho é mais bem avaliado, porém, por aqueles que aprovam
o governo Bolsonaro (22% da amostra total, ante 24% de regular e 53%, de ruim
ou péssimo): 23% de ótimo e bom. No seu melhor momento, a atual legislatura
tinha 22% de aprovação, 41% de avaliação regular e 32% de reprovação.
Os deputados do Centrão dominam a Câmara e
não estão muito preocupados com as pesquisas, porque suas bases eleitorais são
fidelizadas graças às verbas do Orçamento da União, por meio de emendas
parlamentares que garantem o apoio de prefeitos das cidades onde têm bases
eleitorais. Essas verbas, porém, hoje, são controladas por Arthur Lira, que
consegue aprovar o que quer quando cobra lealdade de seus aliados, mesmo contra
o posicionamento dos respectivos partidos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário