Valor Econômico
Erros de Bolsonaro o tornam menor do que o
antipetismo
“O
Congresso não perdoa quem está fraco”. Com essa frase, o governador do Espírito
Santo, Renato Casagrande (PSB), reajusta suas previsões para as eleições do
próximo ano. Até o ano passado, Casagrande estava pessimista com as perspectivas
da oposição. Em conversa com este colunista, ele fez um prognóstico sombrio
para quem é contra o presidente Jair Bolsonaro: “Vamos pensar em 2026. Melhor
esquecer que existe 2022”, disse na ocasião.
Mais do que a pandemia, mais do que a
economia anêmica, mais do que os arroubos golpistas do presidente, o que faz o
governador capixaba a analisar o cenário de modo diferente é a captura do
Orçamento pelo Congresso.
Casagrande não diz, mas o mercado também não perdoa governo fraco. Diante de um governo fraco, o teto de gastos se torna um anátema. Fica claro que há uma desconfiança profunda de que a equipe de Paulo Guedes consiga entregar o que vende: reformas do Estado que sejam de fato efetivas, contenção da despesa pública de modo estrutural, privatizações. Sobra a defesa do teto de gastos como a âncora.
Como pode um governo fraco e sem
credibilidade flexibilizar o teto de gastos sem que a economia derreta? Não
pode. É impossível, impensável. Por isso o mercado aceita melhor uma pedalada
nos precatórios, como a que está sendo armada neste instante, do que uma
solução mais simples, que seria a retirada dos precatórios do teto de gastos,
como propõe o deputado Marcelo Ramos (PL-AM), já que se trata de uma despesa
obrigatória. Mas essa é uma solução inviável. Bolsonaro é um refém do mercado.
Se tivesse força, o governo também poderia
enquadrar o Congresso, acabar com a farra das emendas de relator, aprovar a
toque de caixa reformas de Estado drásticas e pagar os precatórios como
corresponde, sem mexer no teto. Isso também é impossível. Bolsonaro é um refém
dos hierarcas do Congresso.
Um governo fraco é conveniente por algum
tempo, mas é um veio que se esgota, como ouro de aluvião. Faiscagem tem baixo
rendimento. Os aliados de circunstância do presidente sabem o que podem
conseguir estando do lado do governo e são capazes de sentir para onde o vento
sopra.
Certa vez, em entrevista ao Valor, o
ministro Ciro Nogueira disse que o presidente do PSD, Gilberto Kassab, era “a
pessoa mais solidária ao inevitável”, referindo-se à eleição de 2022. Ciro
Nogueira está certo. A frase vale para ele também e para o Progressistas. O
inevitável também é muito sedutor aos agentes da economia.
O ministro da Casa Civil, semanas antes de
entrar no governo, acreditava - como Casagrande há algum tempo - que a eleição
do próximo ano seria um passeio no bosque para Bolsonaro. Sentia-se confortável
porque entendia que estava pegando um vento de cola.
“O Brasil vai crescer perto de 5% neste
ano. Quem elege e reelege presidente é a economia. Vamos fazer um grande
programa para ajudar as pessoas substituindo o Bolsa Família”, afirmou a Renan
Truffi, Fernando Exman e Vandson Lima em 30 de maio, dois meses antes de ir
para o Planalto. Bolsonaro, contudo, não tem instrumentos na mão para repetir a
mágica de 2020, com um auxílio de R$ 600 na veia dos menos favorecidos. Onde
está a margem? É fraco para romper o teto, é também fraco para criar espaço
cortando outras despesas. Está difícil garantir até os R$ 300 anunciados. O que
surge no horizonte é um pouco diferente de “um grande programa para ajudar as
pessoas”.
Nada indica que a economia vá ajudar
Bolsonaro como se pensava pouco tempo atrás. A Selic sobe, afetando as
expectativas, e não se espera que o Banco Central de Roberto Campos Neto, por
mais que tenha se mostrado muito próximo do universo da política, vá produzir
uma virada de mão.
Por esse conjunto da obra a discussão por
uma terceira via não se encerra nunca, por mais que as pesquisas desde março
apontem a polarização consolidada entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva e o presidente Jair Bolsonaro. A terceira via, em síntese, é uma
articulação que, se bem sucedida, remove Bolsonaro da condição de candidato
anti-Lula.
É por essa razão que Ciro Gomes sobe em
boleia de caminhão, faz discurso com a Bíblia em punho, grava entrevistas com blogueiros
de direita e bate sem parar no PT. Está de olho no eleitor antipetista., muito
mais numeroso que o bolsonarista.
Por isso o governador de São Paulo, João
Doria, começou a desviar o foco da sua artilharia de Bolsonaro para Lula. Tanto
um como o outro percebem que o eleitor que repudia Lula pode procurar um
candidato menos tóxico do que o atual presidente. O governador do Rio Grande do
Sul Eduardo Leite vai pelo mesmo caminho, mas de maneira mais contida, dada as
suas diferenças de estilo com Ciro e Doria.
“E é por se sentir ameaçado que Bolsonaro
bate tanto nos governadores”, diz Casagrande. A pandemia de covid-19, que
forçou a decretação de medidas restritivas, deixou os governadores contra as
cordas. À medida em que ela arrefece - o colapso sugerido pela variante delta
está demorando a chegar - os governadores sentem que jogam com o tempo a seu
favor.
“O que era considerado um problema no
passado, como o fechamento do comércio, a restrição de serviços, pode se tornar
qualidade. Os governadores passam a ser vistos como os que enfrentaram de fato
a pandemia”, comentou Casagrande, moderadamente otimista. Ele não acredita em
repique da doença no que resta do ano, mas não se atreve a dizer que o pesadelo
não se repetirá em 2022.
Se a roda da pandemia girar de novo,
torna-se muito improvável a consolidação dos governadores como alternativa e
ainda mais improvável a recuperação de Bolsonaro.
Um incumbente que não consegue chegar nem a
25% de intenções de voto, como demonstram os levantamentos do Ipec e do Datafolha,
não sustenta a polarização.
A eleição tende a ficar com um único polo.
O que vai se construindo é um cenário de vitória de Lula no primeiro turno. E
sem que Lula tenha ido além de seus patamares históricos. Ele vai a um máximo
de 48% no Ipec e 44% no Datafolha, e ambas as pesquisas mostram que ele parou
de crescer.
A manutenção desse cenário dependerá da
evolução da rejeição ao ex-presidente, hoje de 38%, estável, de acordo com a
pesquisa do Datafolha. Se essa rejeição crescer, o eleitor antipetista terá que
procurar um caminho. Pode ser que Bolsonaro não consiga sair do cercadinho de
seus adoradores, como conseguiu em 2018.
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