Folha de S. Paulo
E pensavam que a Bíblia do MEC era 'guerra
cultural'
Enquanto alguns se excitam no grito
"abaixo Paulo Freire", "por uma Escola
sem Partido" ou "contra a ideologia de gênero"; enquanto
alguns se masturbam nos gritos pela liberdade, segurança e soberania, pela
"inocência das crianças" e pelo "povo armado não será
escravizado", sem receber nada em troca, outros enriquecem ilicitamente
com dinheiro público.
O país distraído vai se deixando deseducar.
Mal notou que a "guerra
cultural" é coreografia que mascara corrupção. Ninguém sai mais
livre, seguro e soberano. Muitos morrem por ação ou omissão estatal. Muitas
crianças são abusadas no núcleo familiar sem escola ou serviço social que as
socorra. Tem até juíza
que tenta forçar criança grávida por estupro a parir.
Ricos e felizes, mesmo, ficam centrão,
pastores da "rachadinha" e milicianos das periferias e das florestas.
Sob a regência de Bolsonaro. A inversão ilegal de políticas públicas, assim
como a produção institucional da ignorância, é prática consistente do atual
governo.
O governo faz assim: nomeia ministro e equipe cuja missão é desentranhar a política pública; corta recursos, assedia e ameaça burocratas e fiscais independentes (veja livro "Assédio Institucional no Brasil", organizado por José Celso Cardoso Jr.); e incita inimigos da política respectiva a delinquir sob a promessa de que sairão ilesos.
Um cupim agressivo passa a chefiar a pasta
contra a pasta. Sem mudar a lei, às vezes adaptando regras executivas, às vezes
na pura informalidade e intimidação, congela-se a política.
Bolsonaro caprichou em personagens tão
vassalos e caricatos que facilitam a explicação. Weintraub
e Ribeiro na Educação; Pazuello e Queiroga na Saúde; Salles no Meio
Ambiente; um delegado de polícia na Funai; Frias na Cultura; Camargo na
Fundação Palmares. Todos quase analfabetos ou militantes histriônicos contra a
política do órgão, definida em lei.
Mas não só paralisam a pasta. Uma nuvem de
gafanhotos invade os gabinetes para vender produtos mirabolantes aos cupins
liberados para gastar dinheiro público. "Gabinetes paralelos"
(leia-se reunião secreta de operadores privados não sujeitos a controle, em
missão ilegal, como na Educação e na Saúde) se formam e redistribuem recursos
disponíveis. Para amigos do governo.
Há muitos exemplos. Recursos são alocados
na hiperprodução de cloroquina e impressão de Bíblias na gráfica de pastor.
Verbas do MEC são oferecidas em troca de barras de ouro. Kits
robótica são comprados para escolas sem papel higiênico.
Também se mobilizam recursos da burocracia
para liberar tráfico internacional de madeira e ouro ilegal; para criar
serviços ilegais de disque-denúncia contra monstros imaginários. Recursos do
extinto Bolsa Família caem na conta bancária de militares.
A interrupção ilegal da política pública
não é apenas, em si mesma, uma forma de corrupção. Tampouco é apenas uma forma
de rasgar dinheiro público, de desperdício. Também não é só desobediência a
dever constitucional sob o disfarce de combate a "viés ideológico".
Antes de tudo, multiplica dutos para
corrupção. Joga muito dinheiro no ralo e muito dinheiro no bolso. No varejo e
no atacado. O orçamento secreto só veio a turbinar o mecanismo. Trataremos
disso em outro capítulo.
Se a corrupção te importa, se te indigna o
quanto a corrupção enriquece alguns num país com 25% da população na pobreza e
7% na extrema pobreza (fome), saiba que a inversão de políticas públicas
essenciais custa múltiplos petrolões. Uma obra com assinatura bolsonarista e
incomparável a qualquer governo anterior. E nada disso reduz a gravidade do
petrolão, uma obra multipartidária que remonta pelo menos, veja só, aos anos
70.
Você pode até se recusar a acreditar nas
evidências que pulam e gritam na tua frente. Integrar o time das marionetes da
delinquência política brasileira é uma opção existencial. O ódio cego e surdo
ajuda a dar direção a uma vida miserável. A "vida livre" que o transe
bolsonarista te entrega.
As batalhas do espírito prestam serviço
indispensável na espoliação de riqueza. O consórcio entre antiliberalismo
religioso e liberalismo econômico bruto, ou o casamento libidinoso entre
Damares Alves e Paulo Guedes, que busca suprimir liberdades elementares e
qualquer ideia de bem comum, montou uma magnífica fábrica de corrupção. Às
vezes, corrupção legalizada. No governo Bolsonaro, frequentemente nem isso.
Enquanto órfãos de Olavo fazem a dança do
acasalamento hétero, exibem suas pistolas hétero e, num abraço hétero, riem da
morte e multiplicam dispositivos causadores da morte (nas UTIs sem oxigênio,
nas periferias urbanas, na Amazônia cedida à soberania do crime), parasitas
ganham dinheiro. Jesus tá vendo.
*Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC
3 comentários:
Lema do DESgoverno Bolsonaro: sempre é possível piorar uma política pública! E cada um de nós se esforçará para isto até o último dia do mandato do genocida.
Onde se lê genocida, leia-se NOSSO MITO!
Mito de mitômano,aquele que mente compulsivamente.Mito de mictório também tá valendo.
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