Editoriais / Opiniões
Uma eleição com poucas ideias e ameaças à
democracia
Valor Econômico
A alta temperatura da disputa não se
traduziu em um confronto de várias, boas e novas ideias
Mais de 156 milhões de brasileiros vão
depositar seus votos nas urnas no domingo, nas eleições mais caras e mais
polarizadas desde a redemocratização - segundo as pesquisas, escolherão
sobretudo entre duas opções conhecidas: o atual presidente, Jair Bolsonaro, e o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O pêndulo da história se deslocou de
volta para o candidato do Partido dos Trabalhadores, legenda derrotada
amplamente em 2018, com sua rejeição capitaneada por um longevo e medíocre
deputado de extrema-direita e defensor da ditadura militar. As pesquisas
indicam que Lula poderá ser eleito no primeiro turno.
A apuração dos votos, tranquila em outros
pleitos, é agora motivo de grande preocupação. Desde que assumiu o cargo,
Bolsonaro deu muitas mostras de aversão à democracia, disse que as urnas
eletrônicas não são confiáveis e que não aceitaria pacificamente uma derrota.
Em campanha para permanecer no poder, Bolsonaro convocou para sua cruzada
contra as urnas o ministro da Defesa, Paulo Sérgio de Oliveira, que ensaia
promover apuração paralela dos votos feita por militares.
Dirigido por Valdemar Costa Neto, condenado no mensalão, o PL, ao qual Bolsonaro se filiou, contratou a auditoria do Instituto Voto Legal, sem expertise no assunto, para se pronunciar sobre a segurança das urnas. O veredito veio à luz em duas páginas apócrifas, apontando supostas falhas na atuação do TSE, “vulnerabilidades relevantes nas urnas” e brechas para manipulação dos resultados porque “somente um grupo restrito de servidores e colaboradores do TSE controla todo o código fonte dos programas da urna eletrônica e dos sistemas eleitorais”. O presidente cria um ambiente propício ao tumulto no dia das eleições.
O favoritismo de Lula, após os grandes escândalos de corrupção envolvendo o PT - nunca de fato assumidos pelo candidato - e de uma das mais longas e destrutivas recessões iniciada no governo de Dilma Rousseff, mostra que o sistema político não está sendo capaz de produzir novas lideranças. A tentativa de erguer uma terceira via ao final produziu a candidatura da novata Simone Tebet (MDB) e de Ciro Gomes (PDT), já em sua quarta disputa presidencial - ambos não chegam perto de dois dígitos nas pesquisas. A clara ameaça à democracia representada por Bolsonaro leva significativas parcelas do eleitorado não petista a escolher o candidato em melhores condições de derrotá-lo, e Lula reúne esta condição.
A polarização entre Lula e Bolsonaro
destruiu pelo caminho o que já era frágil. Em crise, o PSDB, que dividiu com o
PT o favoritismo eleitoral por 28 anos, sequer conseguiu escolher um candidato,
pela primeira vez desde sua fundação, em 1988. Os principais partidos do
Centrão se aglutinaram em torno da candidatura de Bolsonaro, que foi incompetente
para construir um partido próprio. O partido que Bolsonaro tornou o mais votado
para o Legislativo em 2018, o PSL, fundiu-se com um DEM em retrocesso, para
criar o União Brasil, outra aglomeração sem princípios.
A inapetência para o jogo partidário e a ameaça
de impeachment levaram Bolsonaro a terceirizar seu governo para o Centrão. Com
isso, o Legislativo alcançou poder inédito sobre o orçamento e aprovou um fundo
eleitoral recorde de R$ 4,9 bilhões, além do fundo partidário de R$ 1,1 bilhão.
Vastos recursos foram concentrados nas cúpulas dos partidos, que apostaram mais
no continuísmo de parlamentares em exercício do que em novatos. Dessa forma, a
Câmara terá a menor taxa de renovação em muito tempo.
Os debates e a campanha eleitorais foram
superficiais em conteúdo programático e indicação de rumos. Sabe-se quase nada
sobre o que Lula pretende fazer se voltar ao Planalto além do que tem falado -
e ele tem falado pouco. O PT mantém seu viés estatista e intervencionista
intocado, mas Lula é pragmático. Na economia, conseguiu realizar seu primeiro
mandato com austeridade fiscal plena e inesperada, um segundo com início de
gastança que prosseguiu com Dilma até o desastre econômico, e não se sabe o que
pretende em seu terceiro. Bolsonaro traz mais do mesmo: retórica que começou
liberal, medidas populistas perto da eleição e um presidente corporativista
apoiado no que há de mais atrasado no Congresso. Sua base de apoio também
compôs as de Lula e Dilma.
A alta temperatura da disputa não se
traduziu em um confronto de várias, boas e novas ideias para resolver os muitos
e conhecidos problemas de um país que perdeu há tempos a capacidade de crescer.
Na
margem de erro
Folha
de S. Paulo
Com
estabilidade na corrida ao Planalto, suspense quanto a 2º turno se mantém
A
nova pesquisa Datafolha sobre a corrida presidencial reafirma o cenário de
estabilidade que, para a ansiedade das principais forças políticas envolvidas
na disputa, observou-se nos levantamentos anteriores. O instituto ainda
divulgará novos dados no sábado (1º), véspera do primeiro turno de votação.
Levando-se
em conta os votos válidos, critério utilizado na totalização do Tribunal
Superior Eleitoral, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) alcança 50%
das intenções, enquanto seu principal adversário, o presidente Jair
Bolsonaro (PL), tem 36%. Ciro Gomes (PDT), com 6%, e Simone Tebet (MDB), com
5%, empatam em terceiro.
O
resultado permanece inconclusivo quanto à perspectiva de uma vitória do petista
já neste domingo, ainda mais considerando-se a margem de erro de dois pontos
percentuais para cima ou para baixo.
A três dias do pleito, uma expressiva maioria de eleitores afirma que já tomou sua decisão, mas 15% dizem que ainda podem mudar o voto —dados que continuam a apontar para a consolidação da contenda entre Lula e Bolsonaro, mas reforçam a imprevisibilidade quanto ao desfecho da primeira rodada.
Caso
o embate se transfira para o segundo turno, o Datafolha volta a mostrar
vantagem para o ex-presidente, que tem hoje 54% das intenções, ante 39% de seu
rival.
A
pesquisa mais uma vez mostra forte rejeição dos eleitores a Bolsonaro,
obstáculo que o mandatário não consegue superar. Enquanto 39%
dizem que não votariam de jeito nenhum em Lula, seu maior oponente é rechaçado
por 52%.
No
que tange às tendências regionais, o petista segue com larga vantagem no
Nordeste, onde marca 66% dos votos válidos, contra 23% do presidente. Lula
também vence no Sudeste, o maior colégio eleitoral, por 45% a 38%, e surge à
frente, na margem de erro, no Norte (45% a 42%). Bolsonaro tem vantagem
numérica no Sul (46% a 41%) e no Centro-Oeste (45% a 41%).
A
avaliação do governo federal também permanece estacionada em patamar
desconfortável para o incumbente, a despeito do aumento promovido no Auxílio
Brasil e da intervenção nos preços de combustíveis e energia elétrica. São 31%
os que consideram a gestão ótima ou boa, enquanto 44% a tacham de péssima ou
ruim.
Trata-se
de impopularidade elevada para uma disputa à reeleição, mas a fatia dos
satisfeitos é grande o bastante para manter a chance do mandatário de chegar a
um segundo turno e tentar virar o jogo. Num cenário tão incerto, abstenções e
eventuais opções pelo voto útil podem ser decisivas.
Em
qualquer hipótese, Bolsonaro tem diante de si uma tarefa inglória, a julgar
pelo seu insucesso em reduzir a rejeição a seu nome e em explorar os pontos
potencialmente vulneráveis de seu adversário.
Lobby da bala
Folha de S. Paulo
Pleito por armas pode ser legítimo, mas a
literatura desaconselha tal política
O bolsonarismo foi bem-sucedido,
infelizmente, na disseminação de uma ideologia armamentista no país. Ela se
reflete em várias métricas, das quais uma das mais evidentes é o aumento do
número de clubes de tiro —eram 151 no início do governo Jair Bolsonaro (PL) e
passaram a 1.906 agora.
A quantidade de armas legais em circulação
também subiu significativamente, de 350,7 mil em 2018 para 1 milhão, alta de
187%.
Os chamados CACs (caçadores, atiradores e
colecionadores) não se limitam a disparar seus artefatos em estandes de tiro.
Reportagens publicadas pela Folha mostraram que os clubes se
tornaram palanques
para candidatos bolsonaristas e que já se constituiu uma rede de
financiamento de defensores das pautas armamentistas.
Por meio da Lei de Acesso à Informação,
constatou-se que 91 candidaturas receberam mais de R$ 50 milhões. Entre os
doadores estão alguns dos grandes empresários que apoiam Bolsonaro.
Em princípio, não há nada de ilegítimo em
defender teses controversas, levar candidatos a espaços privados e financiá-los
até os limites estabelecidos. Faz parte da democracia, também, postular
mudanças na legislação em vigor.
O que não é admissível é valer-se do poder
de regulamentação para driblar o espírito da lei —e isso Bolsonaro fez, por
meio de decretos, contra a opinião majoritária da população e, provavelmente,
do Congresso Nacional. Tardiamente, as medidas foram limitadas pelo Supremo
Tribunal Federal.
No período, os clubes de tiro se
multiplicaram e os entusiastas da atividade tiveram maior acesso a armas e
munições. É nesse contexto que se dá a decisão, tomada pelo Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) nesta quinta (29), de proibir que
CACs carreguem armas e munições no dia da eleição e nas 24 horas anteriores e
seguintes.
Quanto ao mérito da questão, a literatura
mostra de forma inequívoca que, quanto maior a quantidade de armas em
circulação, maiores os índices de acidentes e de suicídios. Também se eleva o
risco de uma pessoa envolver-se em conflitos que terminam em homicídio.
Armas também são roubadas e passam a integrar os arsenais dos criminosos, contribuindo para o ciclo de violência. São fatores que, no entender deste jornal, justificam um controle rígido do comércio dos produtos e da prática do tiro.
TSE faz trabalho exemplar em defesa da urna
eletrônica
O Globo
Enquanto Corte abre salas e códigos à
inspeção, partido de Bolsonaro insiste nas mentiras sobre sistema eleitoral
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
tem sido incansável no trabalho de esclarecer todos os questionamentos sobre a
robustez das urnas eletrônicas e do sistema eletrônico de votação e apuração.
Na quarta-feira, o ministro Alexandre de Moraes, presidente da Corte, fez questão
de levar autoridades à sala onde servidores da Justiça Eleitoral acompanharão a
totalização do resultado das eleições. Estavam presentes
representantes da Controladoria-Geral da União (CGU), da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB), de partidos políticos, integrantes da comitiva estrangeira que
observará o pleito e o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira. “É uma sala,
como vocês podem ver, aberta, clara. Não é nem sala secreta e nem escura”,
disse Moraes.
A declaração foi uma resposta a acusações infundadas do presidente Jair Bolsonaro a respeito da contagem de votos em segredo, numa sala escura, de modo a eleger Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT. As repetidas investidas mentirosas de bolsonaristas contra as urnas eletrônicas ganharam ímpeto e se tornaram um tema na campanha deste ano. Por isso continuam merecendo a atenção do TSE.
O sistema eleitoral deveria ser motivo de
orgulho nacional. É seguro, confiável, auditável, rápido e tem um histórico
longo sem registro de fraude. Na segunda-feira, em visita à sede do TSE, Rubén
Darío Ramírez Lezcano, chefe da missão da Organização dos Estados Americanos
(OEA), elogiou o profissionalismo da Justiça Eleitoral. Em julho, nota da
embaixada dos Estados Unidos foi categórica ao dizer que “as eleições
brasileiras, conduzidas e testadas ao longo do tempo pelo sistema eleitoral e
instituições democráticas, servem como modelo para as nações do hemisfério e do
mundo”. Também em nota, a embaixada britânica declarou que “em eleições
passadas, o sistema eleitoral e as urnas eletrônicas mostraram segurança e
reconhecimento internacional por sua celeridade e eficiência”.
Embora charlatanesca e difamatória, a
campanha de Bolsonaro contra o sistema eleitoral tem uma lógica — uma lógica
perversa. Como todo populista, ele se comporta qual um porta-voz do povo.
Temendo ser derrotado pelo voto, optou pela estratégia covarde e cínica de
deslegitimar as mesmas urnas eletrônicas que o elegeram repetidas vezes. Êmulo
do americano Donald Trump, não mostra remorso por corroer a confiança no
sistema eleitoral, um dos pilares da democracia.
Ciente da gravidade, o TSE tem combatido a
desinformação sobre as urnas eletrônicas com um enorme esforço de
esclarecimento da opinião pública. Estendeu o prazo para que as instituições
fiscalizadoras pudessem inspecionar os códigos dos programas usados no pleito,
criou a Comissão de Transparência das Eleições, com a participação de
representantes do governo, da academia e da sociedade. Todos tiveram a
oportunidade de testar o sistema e sugerir melhorias. É por isso que causa
estranheza e tristeza ver o Partido Liberal (PL), de Bolsonaro, envolvido na
contratação e divulgação de um relatório baseado em falsidades e ilações contra
o sistema eleitoral. Fez muito bem o TSE em pedir esclarecimentos ao partido.
Na boca de candidatos, as mentiras são detestáveis. Com o carimbo de um partido
político, a gravidade é muito maior.
Endividamento recorde das famílias impõe
freio inevitável ao crescimento
O Globo
Parcela do orçamento comprometida com
dívidas drena recursos do consumo e prejudica demanda
É preocupante o nível de endividamento das
famílias brasileiras. Em julho, 53,1% delas tinham dívidas, maior patamar na
série histórica iniciada em 2005. Mais grave ainda, a proporção do orçamento
familiar comprometida com pagamento das parcelas dessas dívidas não para de
subir desde 2020 e também alcançou o recorde de 28,6%, segundo dados divulgados
pelo Banco Central. A principal consequência é a redução do poder de consumo,
com impacto na demanda e no crescimento (o consumo das famílias equivale a 70% do PIB). Outra consequência é
a inadimplência, que já atingiu 5,6% no caso das pessoas físicas, nível que
supera o anterior à pandemia.
As razões para o crescimento das dívidas
são evidentes: a crise da pandemia, que prejudicou a renda, e a alta nos juros
para combater a inflação. Depois da queda que começou em 2017 e perdurou até o
atual ciclo inflacionário, as taxas de empréstimos ao consumidor já recuperaram
os níveis de 2017 e, no caso do cheque especial ou do cartão de crédito, estão
entre as maiores do mundo. Apesar de a situação recomendar prudência, a procura
por crédito continua em alta (já subiu 25,4% neste ano), incentivada em parte
por políticas populistas do governo Jair Bolsonaro para oferecer benefícios em
ano eleitoral.
A medida mais absurda foi sem dúvida a
permissão para que beneficiários do Auxílio Brasil — programa cujo objetivo é
garantir a subsistência de famílias em situação precária — contraiam
empréstimos por meio do crédito consignado. Além disso, o governo elevou de 35%
para 40% o percentual da renda que pode ser comprometido nessa modalidade de
empréstimo a empregados com carteira assinada, servidores públicos,
pensionistas e militares.
Um levantamento da Serasa Experian
divulgado em julho constatou que nunca houve tantos brasileiros com dívidas
atrasadas desde 2016: 67 milhões, ou 31% da população. Só em 2022, 4 milhões
ficaram com o nome sujo no mercado em razão de atrasos nos pagamentos. Destacam-se
entre os inadimplentes os idosos, que cresceram de 10,6 milhões para 11,5
milhões, segundo a Serasa.
Propostas populistas para resolver o
problema não têm faltado no discurso dos candidatos à Presidência. É o caso
de Ciro Gomes,
que promete perdoar dívidas, como se isso não tivesse como consequência
inevitável aumento ainda maior nos juros que bancos cobrarão para emprestar — e
um terremoto no mercado de crédito, essencial para o funcionamento da economia.
O líder nas pesquisas, Luiz Inácio
Lula da Silva, tem falado em obter uma “licença para gastar” para
aumentar o salário mínimo acima da inflação (e também distribuir reajustes em
massa ao funcionalismo). São receitas certeiras para a quebra da confiança
fiscal e para haver mais dificuldade em elevar o crescimento, o nível de
emprego e, portanto, em reduzir o nível de endividamento.
O mistério de Lula
O Estado de S. Paulo
O País demanda compromissos claros e assumidos com a responsabilidade de um candidato a presidente, mas o que Lula ofereceu, por enquanto, foi o dogma de sua infalibilidade
O petista Lula da Silva acha desnecessário
apresentar propostas de governo para ganhar o voto dos brasileiros e ser eleito
presidente da República. Para o ex-presidente, basta recordar o que ele fez
quando chegou ao poder em 2003, como se a situação do Brasil neste momento, com
sérios desequilíbrios fiscais, pressão inflacionária e grave conjuntura
internacional, fosse idêntica à daquela época, em que o governo de Fernando
Henrique Cardoso lhe entregou um país estável e com as contas saneadas –
cenário que, convém lembrar, Lula chamou de “herança maldita”, injustiça da
qual jamais se retratou.
Como os planos de Lula da Silva para lidar
com a razia econômica e social legada pelo presidente Jair Bolsonaro permanecem
no terreno do mistério, o petista quer que, simplesmente, tenhamos fé – e não
são poucos os que, na reta final, beijaram a cruz lulopetista.
Nos últimos dias, economistas, magistrados,
empresários, artistas e influenciadores, muitos dos quais não petistas,
anunciaram a intenção de votar em Lula da Silva neste domingo, não porque
estejam convencidos de que é mesmo a melhor opção para o País, mas porque querem
impedir que haja um segundo turno, o que daria sobrevida a Bolsonaro – e, por
tabela, ao clima de confronto antidemocrático alimentado pelo presidente.
É uma decisão legítima, claro, mas que tem
um grave efeito colateral: sem um segundo turno, Lula da Silva livra-se
definitivamente de ter que explicar agora o que pretende fazer se assumir o
poder em 2023. O voto no petista, então, será dado totalmente no escuro – e
Lula, caso vença, não poderá ser cobrado por promessas que, afinal, não fez.
Entre as raras propostas que Lula se dignou
a tornar públicas, além de seu conhecido – e vago – compromisso de “colocar o
pobre no Orçamento”, o petista anunciou a quem interessar possa que vai revogar
o teto de gastos – instrumento criado no governo de Michel Temer justamente
para interromper o descalabro fiscal herdado do governo da petista Dilma
Rousseff. Como o Brasil infelizmente já sabe, nem Lula nem os cardeais petistas
gostam de limites para os gastos públicos, mas, para não espantar os centristas
que resolveram aderir na undécima hora à sua candidatura, mandou dizer que
haverá alguma âncora fiscal. Qual? Não se sabe. “Se eu viesse aqui e falasse ‘o
novo arcabouço fiscal vai ser isso’, seria um primeiro passo para falta de
credibilidade, porque estaria anunciando algo que não sei se vou conseguir
cumprir”, disse Guilherme Mello, assessor econômico do PT, ao Estadão.
Se um bom candidato é aquele que submete
suas ideias e propostas ao escrutínio público, Lula é um mau candidato, e por
isso não se pode esperar que seja um bom presidente, a não ser que se acredite
que a mera invocação de seu nome baste para abrir o mar ou fazer chover comida
do céu.
Está em crise o País que Lula, sem dizer
como, quer governar. A fome voltou a assombrar milhões de brasileiros. Nossa
imagem internacional é um desastre. O arcabouço fiscal foi devastado. Programas
de assistência social foram substituídos por arremedos eleitoreiros. A inflação
só recuou à base de marretadas para conter o preço dos combustíveis. Políticas
públicas na área de saúde, educação, meio ambiente, cultura e ciência foram
destroçadas para acomodar bilionárias emendas eleitoreiras de parlamentares. O
Congresso assumiu o controle do Orçamento, peça que chegou a tal nível de
desmoralização que sua única utilidade é servir como propaganda contra
Bolsonaro.
O enfrentamento desses problemas será
extremamente desafiador e exigirá mais do que palavras ao vento. Inflação fora
da meta e projeções que variam entre estagnação e recessão demandarão medidas
urgentes e bem mais duras do que um programa de governo composto apenas por
diretrizes genéricas, como o apresentado até agora pelo PT. O País demanda
compromissos claros e assumidos com a responsabilidade que se espera de um
candidato a presidente da República, mas o que Lula ofereceu aos brasileiros,
por enquanto, foi o dogma de sua infalibilidade.
É preciso devolver o Estado aos brasileiros
O Estado de S. Paulo
O aparelhamento político-ideológico da máquina pública é um completo desastre: prejudica a prestação de serviços públicos à população, estimula a divisão do País e promove conflitos
Uma das prioridades do País para o próximo
governo é o desaparelhamento político-ideológico da máquina estatal, medida
essa que pode não apenas promover uma administração pública mais eficiente,
como contribuir de forma significativa para a pacificação social e a
recuperação do tecido social. O governo de Jair Bolsonaro inundou a estrutura
estatal de quadros não técnicos, alçando, por motivos ideológicos, pessoas
absolutamente desqualificadas a cargos fundamentais do Estado. Além de privar a
população dos serviços públicos necessários, o aparelhamento
político-ideológico perverte o funcionamento da máquina estatal: em vez de
promover desenvolvimento social e econômico e de reduzir desigualdades, ele
causa atritos, persegue quem pensa diferente, gera privilégios, reproduz
ineficiências e facilita a ocorrência de casos de corrupção. É um completo
desastre: inconstitucional, antirrepublicano e, como se viu nas áreas da
educação, da saúde e da cultura, rigorosamente irracional e desumano.
O Ministério da Educação de Bolsonaro
talvez seja o exemplo mais infame dessa loucura de achar que os serviços
públicos não estão a serviço do público, mas dos devaneios de quem está no
poder. A sucessão de ministros da Educação que nada entendiam de políticas
públicas educacionais – lá estavam porque integravam o núcleo ideológico do
bolsonarismo – produziu uma irresponsável desorganização da área, que será
sentida por gerações. Além disso, a pasta mais ideológica foi berço de muita
picaretagem e de graves escândalos de corrupção.
É preciso devolver o Estado aos brasileiros.
A administração pública não existe para servir a causas ideológicas, seja qual
for a sua orientação. O dinheiro do contribuinte não pode ser usado para a
defesa de determinadas “bandeiras”, sejam elas progressistas, conservadoras ou
reacionárias, pois isso foge aos fins do Estado. Os recursos estatais não estão
à disposição das causas culturais, filosóficas ou religiosas de quem assumiu o
poder. Num Estado Democrático de Direito, eles devem estar a serviço de
políticas públicas baseadas em evidências, que atendam de forma eficiente toda
a população, em especial as pessoas mais vulneráveis.
É notório que Jair Bolsonaro, contrariando
a Constituição que jurou defender e os mais comezinhos princípios do
liberalismo político, usou o cargo para promover bandeiras ideológicas de seus
apoiadores (como se o poder público tivesse a função de moldar a sociedade à
imagem e semelhança do governante de plantão) e para favorecer entidades
religiosas que nem sequer cumprem suas obrigações perante a lei – por exemplo,
não honram seus débitos previdenciários. O caráter laico do Estado exige
isenção.
O desaparelhamento político-ideológico é
uma tarefa urgente e trabalhosa, até porque essa manipulação antirrepublicana
da máquina pública não nasceu com Jair Bolsonaro. Em seus 13 anos no Executivo
federal, o PT inundou a administração pública com nomeações ideológicas,
indicando, muitas vezes, “companheiros” sem qualquer aptidão ou experiência
para o cargo. A legenda de Lula nunca compreendeu muito bem a diferença entre o
partido (entidade privada que serve aos interesses de seus associados e
simpatizantes) e o aparato estatal (entidade pública que deve servir a todos,
mesmo que não sejam petistas). Não à toa, nos governos do PT foram gestados e
implementados os escândalos do mensalão e do petrolão.
Mas o aparelhamento político-ideológico da
máquina pública por parte do PT gerou não apenas denúncias de mau uso dos
recursos públicos. A população notou, em diversas áreas, a tentativa petista de
impor uma específica compreensão de mundo, como se o Estado tivesse alguma
competência para moldar o pensamento das pessoas. A manobra produziu um inédito
esgarçamento do tecido social – e um profundo antipetismo em muitas famílias.
O País precisa de paz. É urgente resgatar
um Estado que, livre de concepções autoritárias, respeite a diversidade de
opiniões e que se proponha a servir a todos, sem discriminações e sem
imposições. A República pede igualdade.
Alertas do BC ao futuro governo
O Estado de S. Paulo
Compromisso de manter o aperto do crédito até a inflação se aproximar da meta é reafirmado em relatório do BC
O próximo governo vai começar com juros
altos, crédito curto, quadro internacional desfavorável e crescimento econômico
de apenas 1%, segundo as novas projeções do Banco Central (BC), apresentadas em
seu relatório trimestral de inflação. O aumento dos preços ao consumidor,
estimado em 4,8%, ainda ficará bem acima da meta oficial, fixada em 3,25%, mas
pelo menos baterá no limite de tolerância. Em 2022 a inflação oficial, agora
estimada em 5,8%, deverá superar esse marco pelo segundo ano consecutivo. Mais
que a habitual exploração da economia nacional e do cenário externo, o
relatório divulgado na quinta-feira contém a reafirmação de um compromisso: o
aperto monetário vai continuar até a inflação convergir claramente para o
centro do alvo. Pelos novos cálculos isso ocorrerá em 2024, quando a alta de
preços deverá ficar em 2,8%, muito perto do objetivo central (3%).
O BC tem condições políticas de reafirmar
esse compromisso, neste momento, porque sua autonomia operacional está
garantida pela Lei Complementar n.º 179/2021. Além disso, o mandato de seu
presidente, Roberto Campos Neto, só deverá terminar em 31 de dezembro de 2024.
Essa independência, encontrada nos países democráticos mais avançados, favorece
a condução técnica da política monetária, a busca da estabilidade de preços, a
previsibilidade e a condução dos negócios. Seja quem for o presidente eleito,
passará um sinal tranquilizador se deixar clara, desde logo, a disposição de
evitar interferências no trabalho do Copom, o Comitê de Política Monetária do
BC.
O novo governo poderá facilitar o controle
da inflação se implantar bons padrões de administração das finanças públicas.
Se tomar claramente esse caminho, evitará o efeito inflacionário da
irresponsabilidade fiscal, transmitirá segurança e contribuirá para a
estabilidade cambial. No Brasil, o dólar supervalorizado tem inflado os preços
internos, interferindo na cadeia de produção e prejudicando os consumidores.
Em termos muito simples, mas corretos, a
mensagem ao futuro governo pode ser assim resumida: procure ser competente e
responsável em sua missão e deixe o BC realizar seu trabalho.
O relatório chama a atenção, também, para
problemas estruturais. O pífio crescimento estimado para 2023 dependerá
basicamente da agropecuária, com expansão prevista de 7,5%. Os serviços deverão
avançar 0,8% e a produção industrial, 0,4%. Em retrocesso há pelo menos dez
anos, o setor industrial depende de um projeto de recuperação para retomar o
papel exercido nas economias em desenvolvimento ou emergentes.
Esse retorno deverá envolver muito mais que a mera redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) ou a redução de encargos trabalhistas, medidas propostas pelo atual ministro da Economia. Dependerá de muitos outros fatores, como a educação fundamental, a formação de mão de obra, a pesquisa tecnológica, os investimentos em modernização e a integração no mercado global. Negligenciadas a partir de 2019, todas essas tarefas poderão ser retomadas em 2023.
7 comentários:
"A alta temperatura da disputa não se traduziu em um confronto de várias, boas e novas ideias"
A ótima e nova ideia é TIRAR O BOZO DA PRESIDÊNCIA, Valor Econômico.
"Enquanto Corte abre salas e códigos à inspeção, partido de Bolsonaro insiste nas mentiras sobre sistema eleitoral"
Tudo do bozo é mentira. TUDO!
"O líder nas pesquisas, Luiz Inácio Lula da Silva, tem falado em obter uma “licença para gastar” para aumentar o salário mínimo acima da inflação (e também distribuir reajustes em massa ao funcionalismo). São receitas certeiras para a quebra da confiança fiscal e para haver mais dificuldade em elevar o crescimento, o nível de emprego e, portanto, em reduzir o nível de endividamento"
Bobagens. Lula fez isso em seus 8 anos de governo - e nada dos seus vaticínios acorreu. O Brasil ganhou muito com isso. Vejam PS índices e comparem.
"Estado de S. Paulo"
Falo agora sobre os editoriais deste jornaleco da "escolha difícil", de forma geral. Neles não confio, por razões óbvias.
Seus editorialistas, no pressuposto meu de que tenham mais acesso a informações,
a pessoas, enxergam menos do q eu, uma pessoa física sem contatos.
Numa eleição entre Haddad e o coiso, entre Lula e Collor e outros momentos importantes de nosso país, SEMPRE FICARAM DO LADO DO MAU.
Cuidado, muito cuidado com este jornaleco.
Seus interesses normalmente não são os do país.
"Compromisso de manter o aperto do crédito até a inflação se aproximar da meta é reafirmado em relatório do BC"
Um mote enganador do estadinho.
1) a meta nunca foi alcançada pelo bacen do bozo
2) aproximar-se da meta, numa linguagem de comparsa do estadinho, implica q a meta foi rompida e q o bacen faz "esforços" pra trazer a inflação pra meta, no q tem falhado
3) compromisso então nunca alcançado pelo bacen no gov bozo
Percebam, pois, q o estadinho, com sua linguagem complexa, engana os seus leitores. Deveria dizer a verdade, q a meta estourou e q bacen não está sendo eficiente.
Por que a meta de inflação não foi alcancada?
Simples: bozo gasta demais pra ser reeleito.
O bacen independente deveria FAZÊ-LA baixar e explicitar q não consegue cumprir sua missão por causa do bozo e o estadinho deveria publicar isso.
Não o fazem, por que o bacen deste bozo não é independente (trabalha pra reeleger o bozo) e o estadinho tem outros interesses q não o jornalístico (barrar Lula).
Triste.
"Enquanto Corte abre salas e códigos à inspeção, partido de Bolsonaro insiste nas mentiras sobre sistema eleitoral"
Puts, qdo um editorial DIZ, literalmente, sem subterfúgios, q um presidente mente INSISTENTEMENTE...
MAS NADA ACONTECE.
E os broxonarentos copiam seu chefete com ignorância orgulhosa e...nada acontece a não ser a vergonha q TODOS passam.
Mas fica aqui meu REGISTRO pro gado: EDITORIAL DE O GLOBO DE 30/09/22 CHAMA BOLSONARO DE MENTIROSO.
E É VERDADE.
CHORE, GADO! ESPERNEIE, GADO!
Não é a 1a vez q são assim chamados.
Uma eleição com poucas ideias? Mas os candidatos palhaço Kelmon (pK) e Felipe Dávila desfilaram um rosário de ideias no debate de ontem, verdadeiras pérolas da direita fascista ou fascistoide. E o candidato palhaço Kelmon ainda disse que o Felipe era de ESQUERDA, mesmo falando as mesmas baboseiras que ele (pK) havia defendido.
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