O Estado de S. Paulo
Ao falar em bloqueio menor, Haddad terá de fazer nova interpretação do arcabouço fiscal
Os especialistas em contas públicas estão com
as antenas ligadas e de olho no compromisso do ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, de fazer um contingenciamento de “no máximo” R$ 22 bilhões a R$ 26
bilhões nas despesas do Orçamento em 2024, como revelou o Estadão. Esses
valores foram sinalizados por Haddad em reunião na quinta-feira, na qual o
governo comunicou oficialmente que vai manter a meta de zerar o déficit das
contas públicas no ano que vem.
O tamanho do contingenciamento virou uma espécie de carta-garantia do ministro para o voto de confiança que o presidente Lula lhe deu ao bater o martelo e desistir de flexibilizar a meta. O compromisso funcionou como um aceno para os integrantes do governo e os parlamentares que defendiam a mudança da meta, agora, para evitar um duro bloqueio no início de 2024.
Mas, para garantir um bloqueio menor, Haddad
e equipe terão de fazer uma nova interpretação da regra do arcabouço fiscal,
que determina um limite de até 25% para o contingenciamento das despesas
discricionárias (não obrigatórias) necessário ao cumprimento da meta.
De forma simples, esse limite – sem nenhuma
nova interpretação da regra – seria de R$ 53 bilhões, de acordo com o valor
previsto no projeto do Orçamento de 2024.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
trabalha num parecer jurídico para interpretar como se definirá esse limite,
combinando com outra regra do arcabouço que diz que o crescimento das despesas
não pode ser inferior a 0,6% acima da inflação de um ano para o outro, nem
superior a 2,5%.
O que o ministro disse na quinta-feira é que
é preciso combinar as duas regras. “A regra de 25% não pode afastar o poder
público desse canal que foi criado entre 0,6% e 2,5%”, disse o ministro. Haddad
falou que o bloqueio pode variar entre R$ 22 bilhões e R$ 23 bilhões.
As regras do arcabouço fiscal só entram em
vigor, para valer, em 2024, e já viraram uma areia movediça de interpretações.
A leitura entre os especialistas mais experientes é a de que forçar a barra na
hora de interpretar a lei para ter o resultado conveniente tem “cheiro de
contabilidade criativa”.
Em outras palavras, tratase de uma gambiarra.
A possibilidade de contingenciamento, incluída pelo Congresso durante a
votação, foi justamente o ponto que reforçou a credibilidade do arcabouço.
É claro que vai parar no TCU. Será que o tribunal vai aceitar? Os problemas e dilemas antigos estão se repetindo numa velocidade impressionante. Enveredar por esse caminho não parece ser uma decisão sábia.
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