segunda-feira, 11 de março de 2024

Alex Ribeiro - BC quer mudar comunicação sobre juro sem causar ruídos

Valor Econômico

Preocupação do Copom parece ser evitar que o fim da indicação futura sobre a taxa de juros seja interpretada como mudança para pior no cenário básico de inflação e para os cortes na Selic

O Banco Central deu vários sinais de que cogita acabar com a indicação firme de baixas de juros de 0,5 ponto percentual nas duas reuniões seguintes, que vem sendo feita e renovada desde agosto. Agora, a questão é quando e, principalmente, como fazê-lo, evitando repercussões negativas.

A preocupação do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, pelo que foi dito por alguns de seus membros nas últimas semanas, parece ser evitar que o fim da indicação futura sobre a taxa de juros - ou seja, o “forward guidance” - seja interpretada como uma mudança para pior no cenário básico de inflação e para os próprios cortes na taxa Selic.

A preocupação é mostrar que, se o Banco Central deixar de comunicar explicitamente cortes de juros nas duas reuniões seguintes, isso não significa que as reduções de juros que hoje são consideradas coerentes com a estratégia de política monetária deixarão de ser feitas. O fim da indicação futura para os juros significa que o Copom ficará com menos amarras para eventualmente agir diferente do sinalizado, numa hipotética situação desfavorável que mude o cenário (algo que ninguém enxerga concretamente agora).

O diretor de política monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, foi o primeiro a dar o recado, em um evento da APCE. “Mudanças no ‘guidance’ não necessariamente têm uma correlação com a taxa de juros terminal”, disse, referindo-se à taxa de juros, que hoje está em 11,25% ao ano, no final do ciclo de distensão.

O curioso é que o Banco Central não indicou, claramente, a taxa Selic ao fim do ciclo. Apenas vem dizendo que o juro terminará em terreno ainda contracionista para assegurar a queda da inflação para a meta e a ancoragem das expectativas nesse objetivo. Aparentemente, Galípolo está dizendo que, no fim das contas, um eventual fim do ‘forward guidance’ não muda o atual cenário econômico do Copom e a sua forma de análise das novas informações para determinar a Selic ao fim do ciclo de baixa.

O diretor de política econômica do BC, Diogo Guillen, foi bem mais detalhado em explicar qual seria o impacto de um eventual fim do ‘forward guidance’, em um evento do banco Goldman Sachs. “Parece que tem uma confusão entre o que é o 'forward guidance' e o que é a determinação de juros”, afirmou. “Você pode ter um mesmo cenário básico e não ter 'forward guidance' porque a incerteza aumentou e você não pode prometer [o que fará com o juro]. ‘Forward guidance’ é uma coisa, é um instrumento adicional de política monetária. Depois, você tem juros. Você pode caminhar o mesmo caminho [no juro] com ou sem ‘forward guidance’.”

A mensagem, na essência, é que o fim do ‘forward guidance’ não muda a direção dos juros. O que leva a uma questão: então por que o Copom adotou o ‘forward guidance’? Essa é uma discussão mais teórica sobre se vale a pena ou não fazer ‘forward guidance’, e em que circunstâncias - mas tem repercussões concretas para a situação atual do Copom.

Na teoria, os BCs não precisam fazer ‘forward guidance’, apenas têm de deixar claro qual é a sua função de reação, ou seja, como pretendem agir de acordo com o cenário central previsto e possíveis modificações desse cenário no caminho. O ‘forward guidance’, nessa visão mais purista, é um instrumento de comunicação para situações em que o BC baixa os juros a zero e não tem muito espaço para reduzir mais para evitar uma deflação. O ‘forward guidance’, nesse caso, faz o serviço que o juro de curto prazo não é capaz de fazer. A ideia é que o BC comunique a intenção de fazer algo com os juros diferente do que faria na sua função de reação.

Aqui no Brasil, quando o Banco Central adotou o ‘forward guidance’, os juros estavam em 13,75% ao ano. Será que o Copom precisava algo mais além de explicitar a sua função de reação? O economista-chefe para a América Latina da Goldman Sachs, Alberto Ramos, perguntou a Guillen justamente se, mesmo sem ‘forward guidance’, o mercado não iria precificar os mesmos cortes de juros que o Copom havia sinalizado. Guillen riu da provocação: “Você tem que perguntar isso para o mercado”.

Como dito, essa não é apenas uma discussão teórica. Conhecer os motivos pelos quais o Banco Central adotou o ‘forward guidance’ ajuda a entender as implicações agora que se cogita retirá-lo. E qual é a equação do BC para adotar o ‘forward guidance’? Do lado positivo, segundo Guillen, ele “dá transparência na política monetária”, “coordena expectativas”, “contribui para aumentar a eficácia da política monetária” e “reduz volatilidade”. O lado negativo, disse, é que o mercado entende o ‘forward guidance’ como uma promessa, por mais que o Copom tenha avisado que ele é condicional à evolução do cenário. Quando o cenário leva o Banco Central a fazer algo diferente, há uma perda de credibilidade e maior dificuldade de coordenar movimentos futuros dos juros.

E qual é a mecânica mais prática de adoção do ‘forward guidance’? O presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse na divulgação do Relatório de Inflação de dezembro que a decisão de prolongar ou não o ‘guidance’ tem a ver com o nível de incerteza do cenário. Quando a incerteza é maior, não vale renová-lo, porque o BC tem mais chances de incorrer no custo de reputação apontado por Guillen. Ou seja, a eventual retirada do ‘guidance’ tem a ver mais com incertezas no cenário básico do que mudanças na visão do BC sobre o próprio cenário.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

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