Valor Econômico
Propostas de compensação para aumento da isenção devem ser alvo de alterações
“É importante colocar a palavra
neutralidade”, disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva dirigindo-se à
imprensa. A palavra foi a mais repetida nos discursos feitos durante a
solenidade, no Palácio do Planalto, em que foi apresentado o projeto
de lei que elevará o limite de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física
(IRPF) para R$ 5 mil e, em contrapartida, taxará os super-ricos.
A insistência nela indica a preocupação do governo com o risco de a proposta sair do Congresso Nacional desequilibrada, com modificações que tragam perda de receita e criem um novo problema para as contas públicas. Existe o risco, por exemplo, de haver emendas propondo elevar o limite para valores maiores do que R$ 5 mil.
Que deputados e senadores alterarão o texto,
não há dúvida. “O senhor terá de nós lealdade na tramitação dessa matéria, mas
sempre buscando trazer a verdade”, disse a Lula o presidente da Câmara dos
Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB). “O Congresso Nacional fará alterações
que com certeza visarão a melhorar a proposta.”
Após lembrar que o Congresso não deixou de
apreciar as propostas da pauta econômica apresentadas nos últimos dois anos,
Motta endossou a posição do governo ao afirmar que “não haverá justiça social
sem responsabilidade fiscal”.
Em seguida, afirmou que os parlamentares
buscarão “a melhor forma de equilibrar a proposta”, numa indicação de que a
ideia de taxar os super-ricos não empolgou. Comentou sobre os gastos
tributários (políticas em que o governo abre mão de arrecadar determinados
impostos para beneficiar setores da economia) e aventou a hipótese de ser feita
uma discussão envolvendo esse tema e o Imposto de Renda.
Após a cerimônia, o deputado Pedro Paulo
(PSD-RJ), um dos mais atuantes em temas econômicos, avaliou ser baixo o risco
de o Congresso aprovar um limite de isenção maior do que
R$ 5 mil. A proposta do governo, observou, já
atende na prática as pessoas que ganham até
R$ 7 mil por mês, pois há isenção até R$ 5
mil e uma tributação gradual para quem tem renda entre R$ 5 mil e R$ 7 mil.
As compensações, porém, deverão ser alvo de
mudanças, na sua visão. Ele é defensor da redução de gastos tributários e
avalia que há chances de as discussões avançarem.
Essa é, porém, o tipo de proposta que
enfrenta grupos organizados de pressão no Congresso Nacional. Não são temas de
negociação simples.
“Foi dito aos congressistas que a redução do
déficit primário que conseguimos até agora tem de ser mantida”, disse o
secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, em entrevista
após a solenidade. “É uma premissa do debate.” Ele afirmou que o Congresso é
soberano para decidir, “respeitada a premissa”.
Questionado sobre como isso seria feito, o
secretário afirmou que há “garantias jurídicas e políticas”. No campo jurídico,
a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que impediu o Congresso de
prorrogar a desoneração da folha salarial e o Perse sem a devida compensação é
um precedente, comentou.
No campo político, ele citou a afirmação de
Motta em defesa da responsabilidade fiscal e informou que o presidente do
Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), ausente à solenidade, enviara mensagem
parabenizando o governo pela neutralidade da proposta.
Nada disso significa que o processo de
negociação será fácil. As simulações de impacto fiscal da proposta mostram que,
em 2026, a nova faixa de isenção trará perda de arrecadação de R$ 25,84
bilhões, ao passo que a taxação dos ricos produzirá receitas novas de R$ 34,14
bilhões. Há, assim, uma “sobra” de R$ 8,3 bilhões. Esse possível excesso, disse
Durigan, pode ser usado para eventualmente acomodar o impacto de negociações
que sejam feitas no Congresso Nacional. Não é intenção do governo ter ganho de
arrecadação com as mudanças, frisou.
A apresentação do projeto de lei deu-se num
cenário de cuidado na relação com o Congresso. Num espaço físico restrito,
havia líderes e parlamentares com atuação marcante no tema econômico. A
primeira a falar no evento foi a ministra das Relações Institucionais, Gleisi
Hoffmann, que começou saudando a importante representação do Congresso no
evento.
Lula, por sua vez, disse aos congressistas
que a aprovação de uma proposta como aquela, que busca justiça social e
beneficia pessoas de menor renda, é capaz de fazer as pessoas voltarem a
acreditar nas pessoas que elegeram. Foi uma tentativa de criar um novo ambiente
para um debate que promete ser difícil politicamente e arriscado do ponto de
vista fiscal.
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