Folha de S. Paulo
Reforma do IR de Lula é justa; há incerteza
sobre tamanho da receita com nova tributação
É justo. Se fosse preciso usar uma palavra
para definir o projeto
de mudança no Imposto de Renda, ao menos nos termos da lei que foi enviada
ao Congresso pelo governo Lula, essa palavra
seria "justo".
Pode não ser o "mais justo". Em
tese, transfere-se dinheiro dos que têm renda maior, R$ 27 bilhões, para
trabalhadores de renda bem menor, mas não para os mais pobres ou necessitados
de assistências e serviços públicos. Os beneficiados são, em termos
estatísticos, de classe média e média alta. É apenas um exemplo.
Isto posto, "a luta continua".
Pessoas com rendimentos superiores a R$ 50 mil mensais ou de até de milhões por
ano ainda pagarão, na média, tanto quanto aquelas outras com rendimentos entre
R$ 7.000 e R$ 50 mil (ou ainda menos). A nova mordida, na verdade, apenas seja
mais notável para aqueles com renda superior a R$ 100 mil mensais. Talvez.
Por que talvez?
Primeiro, mais óbvio, há o Congresso. Mesmo
sendo politicamente cortês, o presidente da Câmara, Hugo Mota
(Republicanos-PB), disse a Lula e a Fernando
Haddad, em público, que o projeto deve ser alterado no Congresso de modo a
evitar que os mais ricos paguem toda a compensação da isenção e dos descontos
do IR.
O pessoal no Congresso tem dito tal coisa ao
governo desde o ano passado, mesmo antes de o governo anunciar o projeto, em
novembro. Desde meados do ano de 2024, pelo menos, há revolta politicamente
organizada (nos altos do poder) contra impostos extras.
Em tese, segundo parlamentares, a compensação
pela renúncia fiscal de R$ 27 bilhões viria não toda de "ricos", mas
de: 1) reduções de benefícios tributários (tributação especial para empresas,
cidadãos, setores), esses benefícios que o Congresso concede aos montes, por
vezes de modo podre; 2) "redução de gastos" (rir, rir, rir).
Logo, há risco de o Congresso inventar alguma
compensação malandra de receita, dessas que costumam enfiar no Orçamento, para
inglês ver, apenas para diminuir o peso não muito pesado da nova tributação
sobre ricos. Uma ideia é evitar a tributação de dividendos. Mas tem gente
assuntando mais coisa.
Segundo, de menos óbvio, mesmo que se aprove
a lei nos termos apresentados pelo governo (ou em termos tecnicamente
melhores), não há garantia de receita. Contribuintes ou "pagadores de
impostos" são alvos móveis.
Se a Receita aponta seu rifle para um bicho
gordo tributável, ele tenta fugir. Isso não quer dizer necessariamente
sonegação, mas mudança na organização de negócios e finanças das empresas e das
pessoas, com fins de redução de carga de impostos.
No projeto do governo, o
plano é cobrar pelo menos 10%, efetivos, na prática, de quem ganha mais de R$
1,2 milhão por ano. Como não é lá grande paulada tributária, francamente,
pode ser que os bichos gordos tributáveis corram menos, que a cobrança não
suscite fugas maiores de dinheiros. Ainda assim, essas pessoas vão se mexer.
A reforma do IR, enfim, acaba sendo apenas um
teste do que poderia ser mudança maior na tributação iníqua da renda.
Feito o teste, a cobrança sobre mais ricos
pode vir ainda a ser paulatinamente maior. Além do mais, essa mudança tem muito
tempero eleitoral. Deixa-se de lado a tributação de empresas, que pode ser por
lucro real, presumido ou pelo Simples, métodos diversos que criam também
desigualdades e ineficiências econômicas, por exemplo.
Mas é um começo. Modesto.
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