domingo, 2 de março de 2025

Trump contra o Brasil - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Confronto entre empresas dos EUA e Moraes é parte da ingerência política de Trump no Brasil

Oque começou como embate entre duas empresas americanas e o ministro Alexandre de Moraes evoluiu para um ataque do Departamento de Estado à justiça e à democracia do Brasil e uniu os ministros do Supremo e também o Judiciário com o Executivo, em nome da soberania e da autodefesa nacional. Escalou, portanto, para um confronto político entre os dois países.

Quando a nota americana saiu, acusando o Brasil de decisões “incompatíveis com valores democráticos, incluindo a liberdade de expressão”, houve dois movimentos rápidos. O chanceler Mauro Vieira articulou uma nota do Itamaraty em resposta, enquanto o ex-presidente Jair Bolsonaro divulgava nas redes um texto a favor da nota de Washington e contra a posição brasileira.

Vieira, que estava na reunião preparativa da Cúpula dos Brics no Itamaraty, ligou para Moraes, reuniu assessores e já saiu para o Planalto com a primeira minuta da nota de repúdio pronta para a aprovação de Lula. Detalhe: a versão original era ainda mais dura, mas foi amenizada no processo de divulgação.

Mesmo assim, a nota final, distribuída já à noite e combinada com Moraes, foi tons acima da linguagem diplomática protocolar, acusando o Departamento de Estado de “distorcer decisões do Supremo”, destacando a liberdade de expressão como “direito consagrado” e lembrando que o Brasil foi “alvo de uma orquestração antidemocrática baseada na desinformação em massa, divulgada em mídias sociais”.

Já a reação de Bolsonaro, atacando as instituições nacionais por “se virarem contra as liberdades e os desejos do povo”, chamou a atenção por três pontos principais: por ter sido divulgado logo depois, pelo inglês impecável, ironizado por um embaixador como “Shakespeareano”, e pelo tom perigosamente antinacionalista – no sentido oposto do seu marketing.

Tudo somado, a “guerra” atingiu o patamar político, com Donald Trump usando uma de suas empresas para atacar o Supremo, confrontar o governo brasileiro e tomar partido numa questão interna, doméstica, do Brasil – o que agride princípios básicos do direito internacional e da boa diplomacia, no ano do julgamento do golpe e anterior às eleições gerais.

Pairando no ar, há Elon Musk, que já enfrentou Moraes e perdeu, está no coração do governo Trump e tem domínio sobre a nova bomba atômica: as redes sociais. Trump e Musk agem como imperadores da maior potência, movidos pela ambição de dominar o planeta e impor suas crenças, vontades e idiossincrasias pessoais. Há que distinguir os países e instituições que estão nesse jogo daquelas que articulam a resistência. Como no nazismo.

 

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