É a sexta economia mundial, mas ocupa o 85º lugar em desenvolvimento humano. Apesar disso, pode se mostrar solidário diante de um desastre natural
Uma jornalista francesa fez esta semana uma entrevista conjunta com Roberto D’Avila e comigo, entre outros, para tentar entender o Brasil às vésperas da Copa do Mundo e das eleições. Não é tarefa fácil. A França de René Descartes é, além de cartesiana, claro, previsível. Bem antes das últimas disputas municipais, já sabia que os socialistas iam perder, que a oposição ia ganhar e que a extrema-direita ia crescer ameaçadoramente. Já nós, não sabemos nem quais serão os candidatos, nem se Dilma vai se reeleger ou se Lula vai voltar. Se não há certeza sobre o presente, como prever o por vir? Nossa desculpa para ela foi que, como disse o ex-ministro Pedro Malan, “no Brasil até o passado é imprevisível”. E tanto é verdade que todos nós, jornalistas, economistas, sociólogos, erramos de tal maneira em nossas antevisões que somos chamados de “profetas do passado” — só conseguimos acertar o que passou, assim mesmo, nem sempre.
Além de nossa colega, muitos tentaram nos decifrar. “É o país do futuro” (Stephan Zweig), “É o país dos contrastes” (Roger Bastide), “Não é um país sério” (Charles de Gaulle), “Não é um país para principiantes” (Tom Jobim). O Brasil parece se divertir em ser rebelde e irredutível às classificações.
Ambíguo, ele não é uma coisa ou outra, mas as duas. Não é isso ou aquilo, mas isso e aquilo. Complexo e surpreendente, ao mesmo tempo cordial e violento, generoso e mesquinho, honesto e corrupto, egoísta e solidário, trabalhador e preguiçoso, o país gosta de desmentir o que se diz dele, a favor ou contra. É capaz de infames perversidades, teve um dos sistemas de escravidão mais cruéis do mundo, cometeu atrocidades como as que estão vindo a público agora, nos 50 anos do golpe militar, é insensível aos seus milhões de miseráveis. É a sexta economia mundial, mas ocupa o 85º lugar em desenvolvimento humano. Apesar disso, pode se mostrar solidário e fraterno diante de um desastre natural, socorrendo vítimas e fornecendo-lhes alimentos e roupas, por meio de um voluntariado organizado ou não. Campanhas como as de transplantes e doação de órgãos, por exemplo, são, pelo recorde de adesões, referências mundiais.
Para ver como funciona outra importante característica nossa, a ciclotimia, que faz nosso astral e nossa autoestima oscilarem da euforia à depressão, sugerimos à jornalista voltar depois da Copa, quando o país será outro — melhor ou pior, já que aqui o evento não é apenas esportivo, mas também cívico, e “a seleção é a pátria de chuteiras” (Nelson Rodrigues). Se vencer, uma onda de otimismo se estenderá até a política. Se perder — Felipão já foi avisado — será o inferno, como foi em 1950, cujo trauma da derrota está enquistado até hoje em nossa memória coletiva.
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