Fernanda Krakovics – O Globo
BRASÍLIA - "Não permitiremos, sob nenhuma hipótese, que essa praga (inflação) volte a corroer nosso tecido econômico e a castigar as famílias mais pobres". Essa frase fez parte do discurso de posse da presidente Dilma Rousseff em 2011, mas poderia ser repetida por ela hoje, ao iniciar seu segundo mandato. Domar a inflação, organizar as contas públicas e retomar o crescimento sem prejudicar as conquistas sociais estão entre os principais desafios da petista para os próximos quatro anos. Há duas semanas, a presidente, de 67 anos, disse que usaria o discurso de posse para detalhar as medidas econômicas.
Não se sabe se Dilma tratará do tema corrupção em seu discurso. Mas o assunto também concentrará as atenções da presidente na largada de seu segundo mandato. Em meio ao escândalo detonado com descoberta de um cartel para fatiar as obras da Petrobras, e a quase certeza de que ele atingirá em breve figuras importantes de sua base no Congresso, a petista terá de se desdobrar para manter a governabilidade. Não por acaso distribuiu ministérios a partidos aliados como nunca, desagradando ao PT.
A posse de Dilma, a partir das 14h30m de hoje, em Brasília, marcará o início do oitavo mandato presidencial desde que foram retomadas as eleições livres no país. Ao seu fim, o PT terá permanecido 16 anos à frente do governo, no qual chegou em 2002, com Luiz Inácio Lula da Silva. Após as eleições mais acirradas da história brasileira, o PT pretende levar 50 mil pessoas para a Esplanada dos Ministérios, como uma demonstração de força.
Escolha de Levy contrariou esquerda do PT
Para a ira das alas mais à esquerda do PT, Dilma escalou para o comando do Ministério da Fazenda Joaquim Levy, economista de perfil mais liberal. Mais afeito ao modelo econômico defendido pelo candidato do PSDB à Presidência, senador Aécio Neves (MG), — de cuja campanha foi colaborador — Levy é a principal sinalização de que haverá um cavalo de pau na política econômica. Talvez a economia seja a área onde se encaixe melhor o slogan da campanha petista: "Governo novo, ideias novas".
— O grande desafio da presidente será deixar a nova equipe econômica trabalhar. Como ela é economista, a vontade dela de participar é muito grande — afirmou o cientista político Ricardo Caldas, da Universidade de Brasília (UnB).
Além de domar o cenário econômico ruim, o governo terá que se esmerar na articulação política para evitar crises no Congresso que paralisem seu governo. O cenário que se avizinha é de uma oposição mais aguerrida; uma base aliada pouco fiel; a perspectiva real de eleição do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de perfil mais independente, para a presidência da Câmara.
Emparedada pela revelação do esquema na Petrobras, Dilma se comprometeu com a aprovação de projetos de combate à corrupção, como tornar crime a prática de caixa dois e punir agentes públicos que apresentem enriquecimento sem justificativa. Também disse querer negociar com o Judiciário a agilização do julgamento de processos relativos a desvio de dinheiro público.
Ao ser reeleita, Dilma disse estar ciente de que o sentimento de mudança pautou a campanha e prometeu fazer as reformas que o Brasil precisa. Citou especificamente a reforma política, que se arrasta há anos no Congresso.
Sem maioria para aprovar reforma política
O modelo de reforma política defendido pelo PT (voto em lista pré-ordenada, financiamento público de campanha, Constituinte exclusiva e a realização de um plebiscito) não tem maioria para ser aprovado. Após o escândalo do mensalão, o PT passou a usar a defesa da reforma política como uma bandeira ética.
Para completar, a relação entre Dilma e o PT promete ser explosiva. O partido queria influir mais a partir de agora, até porque depende do sucesso do governo para se manter no poder a partir de 2018. Mas Dilma escanteou o grupo do ex-presidente Lula e a corrente majoritária do partido na montagem de sua nova equipe.
Apesar de ter prometido não cortar direitos trabalhistas, "nem que a vaca tussa", a redução de gastos do segundo mandato começou com restrições no acesso ao seguro-desemprego, abono salarial (PIS) e auxílio-doença. Se, por um lado, 2015 deve ser de corte de gastos, Dilma traçou metas ambiciosas para programas que foram a vitrine do primeiro mandato, como oferecer mais 12 milhões de vagas no Pronatec, de ensino profissionalizante, e construir 3 milhões de unidades no Minha Casa Minha Vida.
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