• Não há golpe num processo transparente, com direito de defesa e supervisão do Supremo
Entre as várias diferenças do processo de impeachment que afastou Fernando Collor do Planalto em 1992 e o que visa a fazer o mesmo com a presidente Dilma está a motivação do pedido de afastamento. No caso de Collor, corrupção — embora condenado no julgamento pelo Senado, ele terminou absolvido no Supremo, o que não lhe trouxe o cargo de volta, nem poderia trazê-lo —; no caso de Dilma, crime de responsabilidade por descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal e regras orçamentárias.
Trata-se de um assunto bem mais difícil de entender do que as traficâncias feitas em Brasília pelo tesoureiro de Collor na campanha, PC Farias, e as transferências de dinheiro de contas fantasmas administradas por PC para bancar despesas pessoais do então presidente. Inclusive a compra do famoso Fiat Elba.
Mas nem por isso o atropelamento da LRF e da Lei Orçamentária, com a edição de decretos de mais gastos sem a aprovação do Congresso, é menos escandaloso. Na verdade, é pior no caso específico dos crimes de responsabilidade cometidos por Dilma, definidos assim pela lei 1.079, de 1950, que regula os processos de impedimento, porque o resultado dos delitos foi agravar a crise fiscal em que o país já se encontrava, com mais recessão e um desemprego trágico. Tudo mais danoso que PC, seus fantasmas e Collor.
É provável que as elevadas votações que o pedido de impedimento de Dilma tem recebido até agora — nas comissões especiais da Câmara e do Senado e nos plenários das duas Casas — também reflitam o conjunto da obra: não apenas o descontrole fiscal, mas os casos de grossa corrupção ocorridos na Petrobras e no setor elétrico, ainda sendo mapeados pela Lava-Jato, em Curitiba.
Mesmo sem sofrer denúncia direta, Dilma sempre esteve muito próxima dos dois setores: foi ministra de Minas e Energia no primeiro governo Lula, até ir para a Casa Civil, e também presidiu o Conselho Administrativo da Petrobras até ser lançada candidata por Lula à sucessão dele. E do Planalto acompanhava a Petrobras de perto. Por ser um escândalo tóxico, o petrolão em alguma medida contaminou Dilma Rousseff.
É inútil seu advogado alertar os senadores, como fez também em vão com os deputados, que eles devem votar com base exclusivamente nas acusações de dolos fiscais praticados apenas em 2015. O conteúdo político desses processos faz o juiz, o parlamentar, julgar com base numa avaliação ampla do acusado. Para condenar ou absolver. Não é tarefa fácil defender Dilma.
As “pedaladas” disfarçaram no caixa de bancos públicos um rombo de mais de R$ 50 bilhões, ou 1% do PIB. Ao contrário dos flutuantes saldos devedores do Tesouro com essas instituições na administração FH e no primeiro governo Lula, dessa vez foram enormes somas, configurando uma estratégia de burlar a contabilidade pública.
Outra enorme dificuldade é explicar para não militantes e a estrangeiros isentos por que um processo em que há amplo direito de defesa, em curso no Legislativo e sob a vigilância do Supremo, é “golpe”.
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