Por Arícia Martins – Valor Econômico
SÃO PAULO - A recessão atual, que pode caminhar para o terceiro ano, é também o período em que a taxa de desemprego atingiu o maior nível no país, ao menos desde setembro de 1992. Segundo série mais longa da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, construída pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), os picos da desocupação em outras crises foram menores: de 10,9% entre 1998 e 2000, 10,8% de 2002 a 2004, e 9,7% no ano de 2009.
Já no trimestre terminado em outubro, o percentual de desempregados em relação à População Economicamente Ativa (PEA) alcançou 11,8%, mesmo patamar de setembro. Os dados anteriores a março de 2012 - mês em que o IBGE passou a divulgar a Pnad Contínua - foram estimados pelos pesquisadores Bruno Ottoni Eloy Vaz e Tiago Cabral Barreira com o método de retropolação, replicando o comportamento da pesquisa atual de emprego caso ela existisse desde 1992, a partir de dados da Pnad anual e da extinta Pesquisa Mensal de Emprego (PME).
Para alongar a série da Pnad Contínua, Vaz e Barreira compatibilizaram as diferenças metodológicas entre a Pnad anual e trimestral, que vão além do tamanho e distribuição regional das amostras coletadas. Enquanto, no levantamento mais antigo, pessoas a partir de dez anos são consideradas em idade ativa, no mais recente, esse número sobe para 14 anos. Por isso, os indivíduos com menos de 14 anos foram eliminados dos resultados da Pnad anual.
Outras mudanças foram a exclusão na pesquisa antiga de pessoas que trabalham um período igual ou inferior a uma hora por semana do trabalho não remunerado para o próprio uso ou consumo e, também, de trabalhadores afastados. O resultado foi uma série chamada de "Pnad Ajustada", que mostrou comportamento bastante próximo da Pnad Contínua entre setembro de 2012 e deste ano. Usando essa nova série, os pesquisadores construíram um histórico anual mais longo da Pnad Contínua, que coincide a cada setembro com a Pnad ajustada.
Depois da compatibilização anual, Vaz e Barreira usaram, por fim, os dados da extinta PME para estimar as variações mensais da série retropolada da Pnad Contínua. Esse processo foi feito para o período de setembro de 1992, quando a taxa desemprego estava em 7%, nos cálculos dos pesquisadores, até fevereiro de 2012. No mês anterior ao começo da divulgação pelo IBGE, a taxa de desocupação ficou em 7,7%.
No histórico anual anterior a 2012, o ano de maior desemprego, sempre considerando os 12 meses encerrados em setembro, foi o de 2003, quando a taxa de desocupados em relação à força de trabalho (soma de ocupados e desocupados) foi de 10,4%. Em igual mês de 2016, o índice ficou em 11,8%, o mesmo registrado em outubro. Esse, porém, ainda não deve ser o pico a ser atingido pela desocupação, que, no cenário do Ibre, vai subir para 12,2% no primeiro trimestre de 2017.
Vaz destaca a maior participação da queda da população ocupada, desta vez, no desaquecimento do mercado de trabalho. Da alta de 2,9 pontos do desemprego no trimestre encerrado em setembro, em relação a igual intervalo de 2015, 2,2 pontos são explicados pela retração no número de ocupados, calcula, contra 0,7 ponto de contribuição do aumento da força de trabalho.
Segundo o pesquisador, a procura por emprego cresceu a taxas substanciais entre o início de 2015 e o de 2016, mas, mais recentemente, a velocidade voltou a níveis pré-crise. Parte desse movimento está relacionado a jovens que adiaram sua entrada no mercado de trabalho e idosos antecipando sua aposentadoria, avalia Vaz, mas também há um componente de desalento.
Outro fator diferente na crise atual, de acordo com o Ibre, está no comportamento da renda real dos trabalhadores, que, desta vez, não caiu tanto. Durante a recessão do primeiro semestre de 2003 pelo Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace), também da FGV, a renda chegou a encolher 3% na média por trimestre. Antes disso, na crise que durou do primeiro trimestre de 1998 até os três primeiros meses de 1999, o recuo foi de 2%. Agora, desde o segundo trimestre de 2014, a retração foi bem menor, de 0,4%.
"Nas crises de 1998-2000 e 2002-2003, a renda apresentava quedas bruscas de nível, fenômeno que não se repetiu em um cenário de crise de maior magnitude como o atual. Isso corrobora a tese de aumento da rigidez dos salários reais na economia brasileira", afirmam Vaz e Cabreira.
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